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Agrotóxicos nocivos não são avaliados há mais de 20 anos

De acordo com a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), 15% dos alimentos consumidos pelos brasileiros apresentam taxa de resíduos de veneno em um nível prejudicial à saúde. Segundo dados da ONU (Organização das Nações Unidas), o Brasil é o principal destino de agrotóxicos proibidos no exterior. Dez variedades vendidas livremente aos agricultores não circulam na União Europeia e Estados Unidos.

Diante deste quadro, por meio de uma consulta pública, a Agência está propondo uma atualização da Portaria 03/1992 do Ministério da Saúde. Com a nova regra, a “apresentação de estudos sobre avaliação de riscos nos trabalhadores rurais será requisito obrigatório para registro de agrotóxicos no Brasil.”

Em entrevista à Radioagência NP, a gerente de normatização da Anvisa, Letícia Silva, explica que os testes são feitos a partir da exposição do produto nos  animais. Ela também ressalta que a proposta foi aprovada na Agenda Regulatória de 2009, instrumento que expõe os temas considerados pela Anvisa  como prioritários para regulação. Além disso, ela avalia o atual quadro do mercado de agrotóxico no Brasil. Entre os pontos ela destaca a dificuldade na fiscalização, os critérios de avaliação dos produtos e a falta de ética das empresas do setor.

Radioagência NP: Letícia, por que atualizar a Portaria 03/1992?

Letícia Silva: A norma já existe há muito tempo.  O conhecimento técnico científico foi avançando neste período, isso foi deixando a norma defasada. Por isso sentimos a necessidade de fazer essa adequação e atualização.  Hoje é possível exigir determinados estudos que antes não era possível.  Ou seja, hoje existem protocolos que tornam a avaliação mais segura.

RNP: Quais as vantagens que essa norma pode trazer para o trabalhador rural e para a população?

LS: Para os trabalhadores a avaliação toxicológica mais apurada e mais sensível vai possibilitar a redução dos danos e da intoxicação que são associadas à exposição dos agrotóxicos nos trabalhadores. Isso também permite ter menos resíduos e produtos menos tóxicos no mercado para o consumidor.

RNP: E como avaliar a legitimidade dos estudos?

LS: A empresa vai fazer isso em laboratórios que tenham credenciamento e certificação de Boas Práticas Laboratoriais (BPL), credenciadas pelo Inmetro. Se for fora do país, o laboratório terá que ter credenciamento de organismos daquele país onde será feito os testes. E outra, se o laboratório esconder os resultados, ele pode ser punido. Com essa nova medida o laboratório passa a ser corresponsável pelos estudos que está realizando.

RNP: Por se tratar de veneno, quais são os critérios de avaliação para saber se o produto é ou não nocivo para a saúde?

LS: A Lei 7.802 de 1989 já determina que produtos agrotóxicos com determinadas características não são permitidos no país. Mas existem protocolos internacionais. Muitos deles foram feitos por países membros da Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico. Muitos foram feitos e discutidos pela própria Organização Mundial da Saúde, pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação. Ou seja, muitos critérios já estão dados na Lei, e o que a gente está tentando fazer é descer os níveis para colocar na minúcia técnica.

RNP: Por que muitos agrotóxicos proibidos em outros países ainda circulam no mercado brasileiro?

LS: Esses produtos são velhos. O problema é que eles foram registrados no Brasil com critérios de avaliação menos sensíveis.  Ou seja, não tínhamos conhecimentos científicos que se tem hoje a respeito dessas substâncias. Hoje, novos estudos foram feitos, foram descobertas mais informações sobre eles. Então, os estudos que existiam há 20 anos não tinham a sensibilidade de hoje.

RNP: O que está faltando para essas substâncias serem banidas do mercado brasileiro?

LS: Os órgãos de regulação devem ter um controle estrito dessas substâncias para que elas sejam usadas de forma a reduzir, e não causarem danos para os trabalhadores rurais e para a população em geral.

RNP: E qual o papel da Anvisa diante do quadro?

LS: Estamos tentando fazer isso da melhor maneira possível. É claro que não temos a quantidade de pessoas suficiente para fazer o controle e fiscalização da forma como deveria ser. Ou seja, temos um grande trabalho pela frente. Um desses trabalhos é a questão regulatória. Estamos tornando esses critérios de avaliação mais sensíveis. Esperamos que os produtos novos, que vão entrar no mercado sejam mais seguros. Já os que estão no mercado, vão passar por esse crivo da nova análise e metodologia. Com isso, talvez possamos tirar esses produtos velhos do mercado, ou ao menos, tornar seu uso mais seguro.

RNP: Qual sua avaliação sobre as empresas de agrotóxicos que atuam no Brasil?

LS: Muitas dessas empresas que estão vendendo agrotóxicos no Brasil não têm ética. O negócio delas e vender, não importando se vai matar ou fazer mau. O negócio delas é o lucro. E outra, muitas delas não têm capacidade financeira para arcar com danos. Se acontecer algum dano ambiental e para a saúde, muitas delas não têm nem dinheiro para arcar com uma ação de indenização.

De São Paulo, da Radioagência NP, Danilo Augusto.

EcoDebate, 07/02/2011

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