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Artigo

Eletricidade realmente sustentável, artigo de Efraim Rodrigues

[EcoDebate] Um aspecto desagradável do ambientalismo é a facilidade com que temos nossa atenção desviada, como a criança que fica feliz de ir ao dentista porque vai ganhar sorvete depois.

A pressão do executivo para construir a usina de Belo Monte é antiga, já foi o pivot da saída de Marina Silva, esteve relacionada também com a demissão de Roberto Messias e agora causou a demissão de Abelardo Bayma, que já havia assinado a licença da Hidrelétrica de Teles Pires (posteriormente suspensa por liminar da juíza Hind Ghassan Kayath, da 9a. Vara da Justiça Federal). Tendo feito mais esta vítima, não resta agora muito mais quadros do PT dispostos a arcar com a responsabilidade.

Como dizia, ambientalistas se perdem facilmente nos detalhes. Ainda mais sério que os inúmeros problemas de Belo Monte ou Teles Pires, é nos perguntarmos para quê precisamos de energia elétrica.

Antes da construção da usina, a resposta é “Precisamos de energia para hospitais, escolas e empregos”. Depois de construídas, subsidiamos energia para produção de alumínio, em especial na região Norte, onde cada gigawatt aplicado no beneficiamento da bauxita cria 2,4 empregos para exportar lingotes de alumínio. O lucro fica com os acionistas, o prejuízo é rateado entre os brasileiros (pagadores e não pagadores de impostos).

A construção de hidrelétricas para valorizar ações de empresas internacionais não é um problema ambiental ou social. Se o país não recebe pelo custo verdadeiro da energia elétrica, estamos simplesmente sendo roubados.

Além deste interesse, há também os 19 bilhões de reais em obras para Belo Monte, acrescidos da rede de transmissão e muito certamente dos adendos de projeto que multiplicam o preço.

Se economizarmos, há energia equivalente a muitas usinas para ser ganha. E a culpa do gasto de energia não é do Pedrinho que larga acesa a luz do quarto como se fosse sócio da companhia de luz. É do governo que não transforma o aquecimento solar de água em mania nacional. Ontem tomei um banho quente na chuva só porque a água passava por uma laje aquecida ao sol. As poucas pessoas que possuem coletores solares no teto de suas casas estão mortas de saber disto, mas é novidade para a maioria que usa a preciosa energia elétrica para aquecer água.

Não pense que sua eletricidade é limpa porque vem, em grande parte, da queda de uma cachoeira. Além da área ocupada pelo lago e de seu assoreamento (entupimento) com terra, há também a emissão de metano. A não ser por um trabalho publicado por Phillip Fearnside em 1995, não fazemos o trabalho óbvio de medir quanto metano sai do lago e somar com aquele que é liberado ao passar pelo “liquidificador” da turbina. No caso de Balbina, libera-se mais metano que uma usina termoelétrica equivalente.

Assim como no caso da semana passada [O produto realmente sustentável], a única energia realmente limpa é aquela que deixamos de consumir.

Efraim Rodrigues, Ph.D. (efraim{at}efraim.com.br), colunista do EcoDebate, é Doutor pela Universidade de Harvard, Professor Associado de Recursos Naturais da Universidade Estadual de Londrina, consultor do programa FODEPAL da FAO-ONU, autor dos livros Biologia da Conservação e Histórias Impublicáveis sobre trabalhos acadêmicos e seus autores. Também ajuda escolas do Vale do Paraíba-SP, Brasília-DF, Curitiba e Londrina-PR a transformar lixo de cozinha em adubo orgânico e a coletar água da chuva

EcoDebate, 01/02/2011


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8 thoughts on “Eletricidade realmente sustentável, artigo de Efraim Rodrigues

  • Alcelio Monteiro

    Mais uma vez quero parabenizar o autor, Efraim Rodrigues, pelo brilhante artigo.
    Alcelio Monteiro
    Prof. de Física da rede federal.

  • Osvaldo Ferreira Valente

    Belo artigo. Tenho escrito muito sobre o comportamento do ambientalismo brasileiro que transforma algumas coisas em bandeiras quase únicas. Precisamos, mais do que lutar contra Belo Monte, de campanhas para diminuir o desperdício de energia e o consumismo que aumenta a tal de pegada ecológica. Já falei de quem reclama da pecuária na Amazônia, mas vai a uma churrascaria onde os pratos voltam cheios de carne destinada ao lixo; já falei de quem reclama do trânsito, mas acabou de comprar mais um carro para uso da família; já falei de quem luta contra Belo Monte, mas sai de casa sozinho em um Suv de dois mil quilos; já estou cansado de reclamar da mania dos urbanos em achar que só os ruralistas devem respeitar as APPs; já desisti de pregar um Código Ambiental que contemple as especificidades dos biomas e ecossistemas brasileiros; já mostrei que encostas podem deslizar, mesmo estando cobertas de florestas; já falei que topo de morro pode ser menos perigoso do que muitas encostas que estão abaixo de 100% de declividade; já reclamei da burrice de estabelecer matas ciliares por critérios geométricos e não por características ambientais; já critiquei a Resolução 303 do Ibama que parece uma piada; e já reclamei, também e por muitas vezes, da velha mania brasileira de jogar nas costas dos outros as responsabilidades que não queremos cumprir. Mas o jeito é continuar tocando o trombone, na esperança de ser ouvido.

  • Precisaria lembrar o que foi publicado no Dossier “As Hidrelétricas do Xingu e os Povos Indìgenas” de 1987 ( ediçao Comissao Pro-Indio de Sao Paulo) e a Carta de Paulinho Payakan aos Congressistas do Tribunal Permanente dos Direitos dos Povos em 1988. A barragem de Belo Monte para produzir o bloco de energia planejado vai precisar logo em seguida da outra barragem, a de Babaquara, acima de Altamira, paragarantir o volume de àgua necessària.

  • E nao irà acabar com isso pois no Plano previsto de aproveitamento da bacia do rio Xingu jà estava planejada uma sèrie de outras barragens: Ipixuna ( no rio Xingu) Iriri ( no Rio Iriri) e outras chegando atè no Mato Grosso atingindo parte do Parque do Xingu e alcançando a barragem no rio Culuene jà em fase conclusiva realizada quase “em segredo” nestes ùltimos anos.

  • Todas estas barragens irao atingir àreas onde foi utilizado um herbicida( o Nufarm 2,4-D) adulterado com produto desfoliante ( talvez o 2,5-T) cujos efeitos contaminantes nao somente atingem a cobertura vegetal mas permanecem no solo e nas àguas por muitos anos contaminando tudo com DIOXINAS. Como Delegado do ICEF estou tentando por isso às claras e nisso IBAMA e ANVISA relutam em assumir suas responsabilidades.

  • O MPF jà està investigando e jà foi renovado o Alerta de Emergència poor Contaminaçao junto aos Ministérios competentes e à NUFARM do BRASIL para que tomem as devidas providéncias de “descontaminaçao” da regiao da Terra do Meio ( situada entre os rios Xingu e Iriri nos Municìpios de Altamira e de Sao Félix do Xingu).
    Padre Angelo Pansa-Delegado ICEF (Internacional Court of Environment Foundation).

  • Parabéns Sr. Efraim pelo valioso artigo.
    Não sou colunista de nenhum portal mas, inspirado pelo seu texto, comecei a escrever e não parei mais. Como cidadão leigo não consigo acreditar na inépcia de críticos, opositores, e do poder estabelecido. O PT age como se fosse o PSDB ao enfiar goela abaixo do povo esse PAC das hidrelétricas na Amazônia legal.
    Dezenas de milhares de povos indígenas e comunidades que vivem no Alto Xingu serão desalojados, áreas de preservação permanente, reservas indígenas e sítios arqueológicos de importância mundial serão inundados, rompendo arbitrariamente tratados internacionais assinados pelo Brasil e por dezenas de países.
    Além do mais, que medidas o governo federal tomará para conter a corrida desenfreada de dezenas de milhares de imigrantes em busca de trabalho assalariado, vindos principalmente da região nordeste para a cidade de Altamira, se ela não consegue dar condições básicas de saúde, educação, saneamento e segurança pública nem para sua própria população.
    Em um mundo onde a informação circula cada vez mais rápido, está mais do que estampado que todo o dinheiro do contribuinte, via BNDES, será gasto para beneficiar mega construtoras e principalmente indústrias de commodities como ferro e bauxita instaladas na Amazônia legal. Se nenhum grupo privado apresentou garantias financeiras para participar da licitação de construção desse complexo hidrelétrico por achar de grande risco, com que direito o governo federal se apropria do dinheiro do povo para fazer valer a sua vontade?
    O poder tem pressa porque precisa dessas exportações para a manutenção do superávit na balança comercial, e as indústrias necessitam dessa energia para cumprir contratos bilionários assinados e já pagos principalmente por países como a China. Até isso é um grande absurdo pois se esses minérios fossem beneficiados aqui mesmo para depois serem exportados, teriam seu valor de mercado multiplicado várias vezes e, aí sim, ampliariam o superávit comercial do Brasil consideravelmente.
    Marcio Aguiar
    Jornalista desempregado por opção.

  • Finalizo meu comentário com uma frase:
    O poder federal constituído pelo povo está tomando medidas arbitrárias para fazer valer as vendas para o exterior, à preço de banana, das riquezas encontradas no subsolo brasileiro, mesmo que para isso seja necessário furtar, inundar, destruir, desalojar e desrespeitar o próprio povo e o território que, cabe a ele, representar, assegurar e defender.

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