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Suinocultura com baixo impacto: Sistema natural possibilita reaproveitamento e custos reduzidos no tratamento de resíduos

O hábito de consumir carne de suínos faz parte da cultura brasileira desde os primórdios da colonização. Trazidos pelos portugueses por volta do ano de 1532, esses animais se adequaram bem ao país e sua criação passou por evoluções ao longo do tempo. Entretanto, principalmente no caso de atividade para fins comerciais, em grande escala, a suinocultura tem seus impactos para o meio ambiente. Estima-se que uma matriz (fêmea em gestação) polua o equivalente a quatro ou cinco pessoas – ou seja, uma granja com 500 matrizes produz uma quantidade de resíduos similar a uma pequena cidade de 2,5 mil habitantes. Com vistas a minimizar essa questão, está em andamento, na Zona da Mata mineira, o projeto de um sistema ecológico integrado de tratamento de águas residuárias da suinocultura.

O Sistema Ecológico Integrado para Tratamento de Água Residuária de Suinocultura na Zona da Mata Mineira, baseado em recursos totalmente naturais, terá como resultado dois produtos para reuso nas granjas: líquido para limpeza das baias e uma solução de água e nutrientes, própria para a fertirrigação, com o mínimo impacto ambiental. A proposta, desenvolvida pela Intec Ambiental, empresa vinculada à Incubadora do Centro Tecnológico de Desenvolvimento Regional da Universidade Federal de Viçosa (Centev/UFV), conta com a parceria da própria UFV e com financiamento da FAPEMIG. “Tudo o que vamos envolver no tratamento é natural, o filtro é feito utilizando-se subprodutos agrícolas e minhocas”, conta o diretor técnico da Intec, Rafael de Oliveira Batista. Ao longo do processo, duas granjas da região serão escolhidas para validar o sistema.

Rafael Batista, diretor técnico da Intec

Estudos anteriores realizados pela equipe na mesma área – porém para tratamento de esgoto residencial – foram o ponto de partida para a proposta. “Há cerca de um ano e meio temos trabalhado com resíduos domésticos nessa linha, que extrapola para todo efluente passível de impacto ambiental”, conta Batista. Como a Zona da Mata é o segundo polo de suinocultura do Estado, atrás apenas de Uberaba, surgiu a ideia de desenvolver um sistema pequeno, de baixo custo e de fácil utilização, que pudesse atender os produtores da região, utilizando, preferencialmente, recursos naturais já disponíveis nas propriedades. \r\n

Ecologicamente correto
Um biofiltro constituído de minhocas e subprodutos agrícolas é a base do sistema proposto. “Esse princípio já é usado para outros resíduos. Adaptamos para aproveitar as características da minhoca, que transforma os poluentes químicos e orgânicos do efluente”, explica o diretor técnico. As minhocas são conhecidas por sua capacidade de converter lixo orgânico e terra em húmus, composto rico em nutrientes de fácil absorção pelas plantas.

O sistema coleta o efluente – fezes, urina e água da limpeza das baias –, que passa por uma filtragem preliminar, através de grade e peneira, para que sejam retirados pelos e outros materiais grosseiros capazes de causar entupimentos nas tubulações e sistemas de bombeamento. Em seguida, o material é armazenado em um tanque anaeróbio e, posteriormente, é lançado sobre a superfície do biofiltro. Ali, as minhocas contribuem para a remoção da matéria orgânica – juntamente com o subproduto, elas têm a capacidade de reter grande parte da Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO), fósforo, nitrogênio e outros elementos, conseguindo mineralizá-los. A seguir, o líquido passa ainda por um reator à base de energia solar para eliminação de bactérias patogênicas e a partir daí está apto a ser utilizado na fertirrigação e limpeza das baias. “Para fertirrigação, não haveria necessidade de passar pelo reator solar, mas estamos sendo muito criteriosos”, acrescenta Batista. O parâmetro de verificação utilizado pelos pesquisadores, após o processo, é a ausência de coliformes fecais (bactéria Escherichia coli).

Além de proporcionar um tratamento de 100% do efluente, sem geração de resíduos, o biofiltro reduz os odores comuns nos tratamentos convencionais, provenientes da decomposição de matéria orgânica. Outra vantagem apontada pelos pesquisadores é a durabilidade de dois a três anos dos filtros orgânicos, sem a necessidade de limpeza frequente. “É um sistema de baixo custo, fácil operação, que não utiliza produtos químicos e é inovador em nível nacional”, destaca Batista.

Para construção do biofiltro, é necessário um tanque, de fibra de vidro ou concreto, no qual são preparadas três camadas, sendo uma de brita, uma de material orgânico (serragem, bagaço de cana, pergaminho do fruto do cafeeiro ou outro subproduto agrícola) e a última de material orgânico umedecido, onde ficam as minhocas. “Não ficará muito caro. O investimento do produtor seria basicamente na construção do tanque, pois a proposta é usar tudo o que ele já tiver na propriedade”, reafirma.

Unidade piloto utilizada para os testes no campus da UFV

Implantação local
O foco principal para introdução do projeto são as granjas de pequeno e médio portes da Zona da Mata, que têm menos condições de implantar um sistema convencional. Hoje, é usado na região o método de biodigestores, que tem custo mais elevado e ainda gera algum efluente. Estima-se que esteja presente principalmente nas grandes granjas. “Quanto às menores, muitas jogam os resíduos sem tratamento em cursos de água ou fazem fertirrigação não planejada, colocando o material em um tipo de trator conhecido como “chorumeira” e jogando na plantação, o que não é ideal e produz um enorme mau cheiro”, constata Batista.

O produtor Vitor Chaves, que trabalha há 20 anos na área, afirma que teria interesse em implantar o sistema. Atualmente, ele deixou a criação de suínos para investir apenas na parte de frigorífico, mas faz planos de reativar a granja ainda em 2009. Segundo Chaves, quanto mais natural for o tratamento e menos recursos externos à propriedade exigir, melhor. “A suinocultura é muito volátil e quando o preço da carne cai, a primeira coisa que o produtor faz é parar de investir, o que pode prejudicar o tratamento de resíduos convencional”, conta. “Um sistema como este proposto tem grandes chances de ser implantado e permanecer, pois o custo de manutenção é quase zero, então, mesmo que haja alguma crise, o suinocultor não precisa parar”, conclui.

Duas granjas serão escolhidas como unidades piloto para implantação do sistema. Atualmente, os pesquisadores estão agendando visitas aos suinocultores da região de Ponte Nova e Viçosa levantando particularidades, como o percentual que tem tratamento dos efluenetes, e coletando amostras para constatar o nível de poluição. Cerca de 20 propriedades serão visitadas e a partir de critérios como condições econômicas do produtor, impactos ambientais e proximidade com o laboratório é que será feita a escolha das unidades de teste.

As etapas seguintes serão o desenvolvimento do protótipo, na UFV, e posterior implantação nas granjas suinícolas selecionadas. A previsão de conclusão é para dezembro de 2010. Segundo Batista, os estudos podem, futuramente, ser aperfeiçoados para aplicação em outros lugares do Brasil. “Trabalhamos com as peculiaridades de cada região. Este sistema pode ser válido para locais que tenham o clima parecido com o da Zona da Mata, mas para levar para o Nordeste, por exemplo, seria necessário aperfeiçoar estudos”, avalia.

O diretor de negócios da Intec, Sidiney Cabral de Sousa, vê como grande benefício o desenvolvimento de um sistema pautado na realidade local e ressalta que o projeto significa a consolidação tecnológica para tratamento e reuso de efluentes da pecuária. “Considerando o potencial poluidor da suinocultura as inovações advindas dele poderão ser extrapoladas a outros setores da economia”, adianta.

Projeto: “Sistema ecológico integrado para tratamento de água residuária de suinolcultura na Zona da Mata mineira”
Modalidade: Edital Programa de Apoio a Pesquisa em Empresas (Pappe)
Coordenador: Antônio Alves Soares
Valor: R$ 499.419,00

* Matéria de Virgínia Fonseca, da Revista Minas Faz Ciência Nº 36, publicada pelo EcoDebate, 20/06/2009.

** Indicada por Edinlson Takara, leitor e colaborador do EcoDebate

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