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Notícia

A política ambiental e energética do governo Lula

Tanto na política ambiental como na energética, o Governo Lula tem dado sinais contraditórios, mas inequívocas na prática. Uma das características da política econômica conduzida pelo Governo Lula é o pós-neoliberalismo pragmático, que conjuga continuidade do modelo de desenvolvimento e políticas sociais, cuja importância é inegável, mas que não consegue incorporar a questão ambiental.

Quando foram divulgados os dados do INPE sobre o desmatamento no começo do ano, a reação do agronegócio foi pronta e cerrada. O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes tomou as dores do setor, que inclui o governador do PSDB do Mato Grosso, Blairo Maggi, um dos “heróis” de Lula. Ambos tentaram desqualificar os dados do INPE, sustentados pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

A repercussão internacional das notícias sobre o desmatamento e a chiadeira do agronegócio colocaram o governo Lula na berlinda. Lula inclinou-se logo à defesa do agronegócio. Primeiro, mandou checar os dados do desmate numa clara demonstração de desconfiança dos dados do Inpe; posteriormente afirmou que “o problema na Amazônia é um ‘tumorzinho’ que foi tratado como câncer antes do diagnóstico”. Lula considerou exagerado o “alarde” feito em torno dos números sobre o aumento do desmatamento na Amazônia. Além disso, criticou duramente a postura das ONGS.

O Governo Lula, a partir do ministério da Agricultura, teve um tratamento frouxo em relação à agressividade do agronegócio. O Governo dava um passo à frente e outro para trás. Fez valer a política do chicote e do afago: bate com uma mão e afaga com outra. Na maioria das vezes, contrapondo-se os ministérios da Agricultura, capitaneada por Stephanes, e o do Meio Ambiente, sob a patuta da Marina Silva.

A realidade é que o governo teve dificuldades para estancar o desmatamento no país. Foi frouxo e entrou dividido em diversas questões. Por outro lado, não se pode esquecer que o agronegócio usou de fúria para defender os seus interesses e impedir que fossem cotrariados.

Ainda no começo do ano, o Governo cedeu à pressão dos ruralistas, concedendo-lhes a renegociação das dívidas. Ainda em fevereiro, o Banco Central havia tomado uma resolução, a resolução 3.545, que passaria a valer a partir de 1º de julho de 2008. No entanto, ela sofreu sucessivos reveses que a desfiguraram enormemente, cedendo às pressões dos ruralistas. A resolução determina que só poderá receber crédito oficial dentro do bioma Amazônia quem apresentar o Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR) vigente, declaração de que inexistem embargos de uso econômico de áreas desmatadas ilegalmente no imóvel, licença, certificado e certidão ou documento similar comprobatório de regularidade ambiental.

A resolução sofreu dois recuos por parte do governo, por orientação direta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O primeiro recuo do governo ocorreu na semana passada, quando uma portaria do ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, revogou portaria anterior da ex-ministra Marina Silva, que havia incluído 106 municípios de cerrado no bioma Amazônia – portanto, abrangidos pela resolução do CMN.

Diante da pressão exercida pelo ministério da Agricultura e também pelo governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, grande produtor de soja daquele Estado e representante dos interesses do setor, o governo federal afrouxou flexibilizando a medida excluindo da sanção todas as propriedades que ocupam áreas de cerrado.

Na realidade, o vai e vem do governo revela o quanto o governo é indeciso e se move ao ‘sabor dos ventos’, ou seja, ora pressionado pelo agronegócio sinaliza que irá ceder, ora pressionado pelos ambientalistas, recua em relação ao que havia anunciado. É um governo confuso, indeciso e vacilante. Demonstra ausência de um projeto claro.

Além disso, vale destacar que o Governo sempre fez vistas grossas diante da compra de terras por estrangeiros, como veremos mais adiante. Também a pouca atenção dada à Reforma Agrária, política que ficou à míngua, ao qual também voltaremos mais adiante.

Mas, o revés maior que o povo brasileiro sofreu foi a saída da ministra Marina Silva. Não que a Marina Silva fosse o que de mais avançado havia. Mas porque conseguiu polemizar em torno de algumas questões e defender pontos de vista diversos aos dominantes no Governo.

A ministra vinha resistindo bravamente, porém acumulava sucessivas derrotas. Nos seis anos de governo Lula, a temática ambiental foi relegada a um segundo plano. Heróica, travava lutas diárias, mas inexoravelmente era derrotada. Várias vezes acenou que iria pular fora do ministério, mas sustentava-se com o apoio de várias organizações ambientalistas que argumentam que sem ela o massacre contra a agenda ambiental seria ainda maior. Ao governo Lula, por outro lado, sempre interessou a permanência de Marina, pois lhe dava um verniz internacional na área ambiental, em função do prestígio e credibilidade da ministra no mundo.

Marina vinha desidratando-se no ministério fazia tempo. Perdeu no tema dos transgênicos, perdeu na queda de braço que envolveu o Ibama e o governo – a polêmica das licenças ambientais para o complexo do Madeira. Perdeu na batalha ideológica da transposição do S.Francisco. Perdeu no tema dos pneus importados, embora algumas vitórias tenham sido ganhas pelo seu ministério. Sucumbiu ao projeto de privatização da Amazônia, perdeu no debate sobre a retomada do programa nuclear. Não foi ouvida sobre o Etanol – travava uma luta titânica para proteger a biodiversidade da Amazônia e do Pantanal do plantio da cana-de-açúcar.

Faz pouco tempo, com a escalada do desmatamento na Amazônia, encarou a agressividade do agronegócio e não teve a devida solidariedade do presidente Lula. Marina chegou a chamar madeireiros, pecuaristas e produtores de soja de “rapinas”. A resposta do agronegócio foi virulenta.

A saída da Marina Silva significou a derrota do conceito de “transversalidade” no governo. O conceito de ‘transversalidade’ proposto pela ministra quando assumiu a pasta, sugeria que a temática ambiental estivesse no cerne de todas as decisões do país e permeasse todas as deliberações políticas.

Por trás da concepção de ‘transversalidade’ está a idéia de que a questão ambiental não pode ser tratada apenas como mais uma política pública, mas que em função da crise ecológica se tornou a questão premente e mais importante sob a qual todas as demais deveriam estar circunscritas. Como definia a própria ministra Marina Silva, a defesa do meio ambiente devia ser vista no mesmo plano do desenvolvimento econômico, num processo de “governança ambiental”. “Uma não pode estar subordinada à outra”, dizia ela.

Para o jornalista e ambientalista Washington Novaes, em entrevista à revista IHU On-Line n. 241, “a ministra, Marina da Silva, do meio ambiente falou muito em transversalidade, ao se referir ao fato de a questão ambiental permear todas as áreas do governo. Mas isso não aconteceu. As outras áreas não tomaram conhecimento disso. A ministra foi derrotada na questão dos transgênicos, (…) foi derrotada na questão de importar pneus usados do Uruguai, foi derrotada na questão de exportar álcool para outros países para reduzir a poluição deles e reduzir a proporção de álcool na gasolina aqui, aumentando a poluição aqui. E agora na questão desse plano de aceleração do crescimento que vai ambientalmente na direção oposta que ele deveria ir”.

A queda da já combalida ministra mesmo assim não deixou de ser comemorada pelos ruralistas e foi vista como uma vitória do agronegócio. A saída da Marina significou, na realidade, uma vitória de uma visão conservadora e antiga de se pensar o desenvolvimento do Brasil.

O agronegócio da monocultura

Essa visão conservadora e antiga de desenvolvimento, mas sumamente poderosa, foi se impondo pelos quatro cantos do Brasil. Na Amazônia Legal, pelo desmatamento e conseqüentes lavouras de soja e cana-de-açúcar, além da criação de bois. O bioma do cerrado, no centro-oeste, vai dando lugar à monocultura. Em outras regiões, sudeste e sul, são as plantações de eucalipto e pinus que vão monotonizando a paisagem. A lógica é sempre a mesma.

A demanda mundial por commodities exasperou o comércio da terra. Os investimentos diretos estrangeiros em atividades imobiliárias, segundo o Banco Central, aumentaram 347% entre 2003 e 2007. São cerca de 5,5 milhões de hectares registrados em nome de estrangeiros em todo o País. Mato Grosso é o Estado que tem a maior área de terras em nome de empresas e pessoas de outros países – são 1.377 propriedades espalhadas numa área de 754,7 mil hectares.

A corrida atrás da compra de terras brasileiras acabou encarecendo significativamente as terras. Como na Amazônia as terras são bem mais baratas que em outras regiões, esse acaba sendo outro fator responsável pelo crescente desmatamento da floresta amazônica para a produção agropecuária, provocando uma “corrida para o Oeste”. As diferenças de preços chegam a ser exorbitantes. Em Cascavel, no Paraná, um hectare é avaliado em R$ 21 mil, ao passo que em Nova Ubiratã, no Mato Grosso, o mesmo hectare custa R$ 1,5 mil.

De acordo com estudo realizado pelo Centro de Estudos Agrícolas da FGV as terras agricultáveis se valorizaram em média 10,16% ao ano entre 2000 e 2006, sendo 15,66% em Mato Grosso. Último balanço do Instituto FNP, relativo ao segundo bimestre de 2008, aponta um aumento de 16,3% no preço médio das terras destinadas à agropecuária, em comparação com o mesmo período de 2007. A expansão do agronegócio e do mercado de biocombustíveis são responsáveis pela atração de compradores estrangeiros, que, por sua vez, redundou em aumento expressivo do preço das terras.

O Incra está buscando criar uma solução jurídica para dificultar a compra de terras por estrangeiros. Entretanto, a questão divide os especialistas. Há os que vêem nisso traços de xenofobia, ao passo que para outros é questão de soberania nacional. Também aqui Lula mostrou-se titubeante, ou melhor, achou melhor não agir no sentido de limitar ou impedir a compra de terras por estrangeiros.

A monocultura da celulose. Notícias do Dia tem feito especial esforço para acompanhar os investimentos do setor de celulose no Brasil, especialmente no Rio Grande do Sul. Entre as empresas do setor encontram-se principalmente a Aracruz, a Stora Enso e a Votorantim Celulose e Papel (VCP).

O setor teve a previsão de investimentos da ordem de bilhões de reais na compra de terras, no plantio de eucaliptos e pinus [Stora Enso] e na implantação de fábricas para o beneficiamento da produção, majoritariamente projetada para abastecer o mercado mundial. Enfim, na expansão de suas atividades.

A metade sul do Rio Grande do Sul ameaça transformar-se num “deserto verde”, com incontáveis impactos ambientais e sociais. Dentre os impactos podem se notar os seguintes: secamento de rios, fontes de água, devastação do solo, que chega a plena destruição do meio ambiente. Os poucos empregos gerados são para mão-de-obra especializada nas fábricas. Sem falar dos agrotóxicos que utilizam e dos recursos em energia que sugam. Por essas razões, estão entre as empresas que contribuem para o aquecimento global.

Em abril passado, o Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) votou alterações no Zoneamento Ambiental da Silvicultura (ZAS) no Rio Grande do Sul. Com as alterações realizadas, que incluíram meios repressivos, o plantio de eucalipto no Estado poderá ser ilimitado. Dessa maneira, os empecilhos para a aprovação de licenças ficaram muito menores ou mesmo foram derrocados. Ambientalistas se queixam de que a aprovação do zoneamento, o governo do Estado abriu mão da sua função maior de preservar a vida, a biodiversidade e o patrimônio genético gaúcho. O setor do papel encontrou na governadora Yeda Crusius uma forte apoiadora dos seus interesses.

No front federal, as grandes corporações multinacionais realizaram todo um movimento na Câmara Federal para diminuir a chamada faixa de fronteira do país de 150 para 50 quilômetros, medida que conta com o apoio do presidente Lula.

No entanto, com a crise econômica internacional desembarcando no Brasil, os ventos parece que viraram de rumo. Em agosto, a Aracruz e a Votorantim Celulose e Papel (VCP) anunciaram a fusão, cuja realização criaria uma estrutura com capacidade inicial superior a 4,6 milhões de toneladas de celulose por ano e se transformaria num verdadeiro gigante na área de papel e celulose. O fechamento do negócio aconteceria no dia 06 de outubro.

Mas com a crise e a conseqüente retração da demanda mundial por celulose, o projeto foi adiado e depois suspenso. Tanto a Aracruz, como a Votorantim amargaram enormes perdas com a especulação financeira. Para quem desejar, pode fazer ainda a leitura da Revista IHU On-Line, edição 247, de 10-12-2007, sobre a temática do monocultivo do eucalipto no pampa gaúcho.

Transgênicos

Os transgênicos simbolizam um modelo de desenvolvimento agrícola voltado aos grandes interesses do capital transnacional. A transgenia é, hoje, uma tecnologia na mão de poucas empresas no mundo, que podem se adonar da vida e tomar os agricultores como reféns.

O agronegócio procurou transformar o território brasileiro em área livre para o plantio dos transgênicos. Aliado às empresas de biotecnologia, o setor já conseguiu a liberação para o plantio da soja e algodão transgênico. Depois disso, investiram pesado na liberação do milho transgênico.

E conseguiram. Agora em dezembro, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) aprovou a liberação comercial do milho transgênico produzido pela Du Pont e Dow Agro Sciences, resistente a insetos e ao herbicida glufosinato de amônia. Esta é a sexta variedade de milho transgênico liberada pela CTNBio. Ao todo, a comissão já aprovou a liberação comercial de dez produtos: milho, algodão e uma variedade de soja. Cinco das liberações ocorreram neste ano. Antes disso, o próprio governo havia reconhecido a existência de plantações ilegais de milho transgênico.

Com a questão dos transgênicos, a velha oligarquia rural dos tempos do Brasil ‘café com leite’ dá lugar a uma nova oligarquia moderna – associada ao capital transnacional, porém tão violenta ou até mais do que a velha oligarquia. Os atuais produtores de cana-de-açúcar, de soja, os pecuaristas distinguem-se da velha oligarquia pelo fato de que as suas relações econômicas cada vez mais estão associadas ao capital transnacional, porém os métodos pouco mudaram. As notícias de trabalho escravo e degradante, de grilagem, desmatamento, de perseguição a lideranças sociais são recorrentes.

Reforma Agrária

A reforma agrária é uma dívida social brasileira histórica. Desde a sua colonização, estas terras conheceram majoritariamente as capitanias, sesmarias e latifúndios. Os minifúndios e as terras comuns resistiram ao longo dos séculos. Mais do que isso, apontam para uma outra lógica de uso da terra.

A reforma agrária poderia ser um antídoto à crise alimentar, a diversos problemas ambientais agravados pelo agronegócio e a monocultura. Entretanto, mesmo no Governo Lula, a reforma agrária não tem sido prioridade. Nem mesmo a agroecologia. O Governo tentou compaginar a reforma agrária e o latifúndio, mas não se deu conta de que isso era simplesmente impossível. E os poderosos interesses do agronegócio, como vimos mais acima, prevaleceram.

O governo evita o conflito que representaria fazer uma verdadeira reforma agrária em terras brasileiras. Tenha-se em conta que a democracia territorial sempre foi um tema espinhoso no Brasil. Pelo contrário, um dos ranços do conservadorismo brasileiro se faz presente na concentração de terras. Portanto, ao excluir a reforma agrária como uma das possibilidades de democratização agrária, o Governo Lula optou pela via mais cômoda, menos conflituosa e, por isso mesmo, conciliadora e conservadora.

Aquecimento global

O relatório do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas), publicado no começo de 2007, é inequívoco: o aquecimento global é produzido por interferência da mão humana. O estudo, realizado por 2,5 mil cientistas de 130 países e que condensa as pesquisas realizadas por ambientalistas nos últimos 30 anos, foi aguardado com expectativa. Ainda que se admita uma mudança natural, defendida por especialistas, é cada vez mais inegável o fato de que as mudanças estão sendo aceleradas pela intervenção humana no planeta.

As intervenções e mudanças provocadas pelo modo de produzir e consumir estão em todas as partes e Notícias do Dia tem feito um esforço para acompanhá-las. São extinções de espécies animais e vegetais, são mudanças observadas em suas atitudes, degelo galopante das calotas polares, surgimento de desertos nos oceanos, aumento médio das temperaturas, catástrofes naturais cada vez mais freqüentes e rigorosas (secas, enchentes)… provocados pelo desmatamento, monocultura, enfim, pelo esbanjamento dos recursos naturais.

Todas essas inferências sobre o planeta Terra, concebido por James Lovelock como um organismo vivo, acabam produzindo distúrbios que a fazem entrar em estado “febril”, com perigo de entrar em colapso. Na opinião do estudioso inglês, isso pode provocar a “vingança de Gaia”.

Mudança nos hábitos de consumo

Este quadro, aponta para dois gigantescos desafios que as nossas gerações necessitam enfrentar: o modelo de desenvolvimento e a mudança dos hábitos de consumo.

Uma coisa está certa: o atual modelo de desenvolvimento econômico requer sempre mais recursos naturais. Num mundo em que esses recursos são limitados, não há saída para um modelo que trabalha sobre a idéia de progresso infinito e ilimitado. O fato é que a humanidade está esgotando os recursos naturais a uma velocidade muito grande. Em 2008, por exemplo, os recursos disponíveis para o ano todo já acabaram em 23 de setembro. Ou seja, a pegada ecológica está acelerada.

A persistir com este modelo econômico que tem uma visão restrita e tacanha de riqueza, progresso e desenvolvimento, o aquecimento global pode trazer prejuízos econômicos que podem apagar qualquer progresso econômico.

Mas também os hábitos de consumo precisam urgentemente mudar. O hiperconsumismo desenfreado e sem limites acelera a escassez dos recursos naturais disponíveis e a mudança climática. Faz-se necessário romper o círculo vicioso da atual visão econômica, inclusive propalada pelo Governo Lula para sair da crise: mais produção, mais consumo, mais energia, mais recursos… Como não cansamos de lembrar, isso esbarra num limite intransponível que é dado pelo Planeta Terra. Numa visão tradicional, a resposta à crise é aumentar a produção e o consumo.

Mas, a história do comprar, comprar, comprar, para fugir da crise econômica não tem futuro a longo prazo. Na sociedade do hiperconsumismo, o “isto me basta” cedeu lugar ao “nada mais me basta”. Ao mesmo tempo é preciso ter uma visão mais abrangente das conseqüências negativas e positivas do nosso consumo.

Assim, pois, numa outra lógica, menos consumo pode significar menos hidrelétricas e, portanto, menos consumo de energia, menos desmatamento, menos pecuária, menos agrotóxicos, menos carros… Hoje, as facilidades da reciclagem dão um certo alívio de consciência, mas a verdade é que o melhor lixo ainda continua sendo aquele não produzido.

Convém estabelecer as íntimas conexões que existem entre a crise financeira, climática, energética e alimentar. Para um aprofundamento dessa temática, sugerimos a muito boa revista IHU On-Line, edição n. 285, de 09-12-2008, cujo tema de capa é: Alternativas energéticas em tempos de crise financeira e ambiental. Edgar Morin dirá que é preciso atentar para a “ecologia da ação”.

Urgência de agir

O momento epocal nos impõe a urgência de agir. Já não se pode mais esperar. A ação deve ser local e global ao mesmo tempo, como chama a atenção uma série de estudiosos. O sociólogo Zygmunt Bauman entende que “os poderes que decidem sobre a qualidade da vida humana e sobre o futuro do planeta são hoje globais”, e “esperar que os indivíduos encontrem e coloquem em prática soluções individuais para problemas produzidos pela sociedade no seu complexo” é um erro. Segundo ele, os problemas que enfrentamos nos territórios locais, como a crise financeira e climática, entre outros, são de origem global e, portanto, as resoluções dos mesmos passam pela criação de uma agenda política planetária e instituições políticas globais eficazes e dotadas de recursos que lhes permitam enfrentá-los.

Também o sociólogo alemão Ulrich Beck adverte que nos encontramos hoje numa situação de cosmopolismo que é nova: “De ora em diante, nada do que acontece é somente um evento local. Todos os perigos essenciais se tornaram perigos mundiais, a situação de cada nação, de cada etnia, de cada religião, de cada classe, de cada indivíduo em particular é também o resultado e a origem da situação da humanidade. O ponto decisivo é que, de agora em diante, a principal tarefa é a preocupação pelo todo. Não se trata de uma opção, mas da própria condição. Ninguém jamais o previu, desejou ou escolheu, mas brotou das decisões, da soma de suas conseqüências, e se tornou conditio humana”.

Edgar Morin, sociólogo francês, por sua vez afirma que “devemos tomar consciência de que vivemos uma comunidade de destino planetário” e sugere uma “política de civilização” iante do mal-estar que vive o mundo hoje.

Ainda que venha de outra vertente, o britânico Nicholas Stern, ex-economista-chefe do Banco Mundial e liberal, em seu relatório conhecido como Relatório Stern em que prognostica os possíveis prejuízos econômicos que o não enfrentamento do aquecimento global poderá causar, também adverte para a necessidade de uma ação global. E que não há mais tempo a perder. Cada tempo perdido poderá contribuir para que atinjamos o temido “ponto de não retorno”.

Stern está convencido de que na “civilização planetária”, as ações precisam ser coordenadas e globais: “Nenhum país pode resolver esse problema sozinho”, razão pela qual “só haverá uma mudança de rumo se todos os países agirem em conjunto”. Neste contexto, ressalta o papel exercido pelas Conferências do clima, que, infelizmente, acabam sendo sempre muito frustrantes.

Como se vê, a questão ambiental é premente e se postou no centro da agenda mundial no início deste milênio. Do tratamento que a humanidade der ao assunto dependerá o futuro da vida, em especial da vida humana, sobre a Terra.

(Ecodebate, 29/12/2008) publicado pelo IHU On-line, 28/12/2008 [IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

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