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Amazônia, clima e Itajaí, artigo de José Goldemberg


Luiz Alves (SC) – Casa destruída por deslizamento de terra causado pelos temporais que atingiram o município no Vale do Itajaí, em Santa Catarina Foto: Wilson Dias/ABr

[Correio Braziliense] Não há evidencia direta de que o dilúvio que se abateu sobre Santa Catarina seja devido ao desmatamento da Amazônia, mas o que se sabe é que uma das primeiras evidências do aquecimento global é o aumento dos eventos climáticos extremos, como inundações, tufões e secas. A razão para tal é que o aquecimento da atmosfera provoca movimentos de grandes massas de ar necessárias para dissipar a energia adicional da atmosfera, como os que se podem ver numa panela com água que é aquecida num fogão.

As previsões do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) indicam, porém, em linhas gerais, que o desmatamento da Amazônia vai aumentar a precipitação de chuva no Sul/Sudeste e reduzi-las no Norte/Nordeste. Essa não é a única razão para reduzir o desmatamento, mas indica que é de interesse vital do país reduzi-lo, independentemente do que se possa dizer das outras conseqüências danosas do desflorestamento.

A atividade na Amazônia tem sido altamente predatória, como se vê no Pará, onde um terço do território antes coberto por florestas já foi totalmente desmatado. O que há de mais perverso no modelo de ocupação de boa parte da Amazônia é que ele não é sustentável, isto é, após derrubada a floresta, pouco resta e a solução é prossegui-la em florestas virgens. O benefício para a população local é mais do que discutível.

Além disso, a devastação e queima da floresta resulta na emissão de gases de efeito estufa, principalmente dióxido de carbono, que são os responsáveis pelo aquecimento da atmosfera. O desmatamento médio nos últimos 10 anos foi de 20 mil quilômetros quadrados por ano, ou seja, 2 milhões de hectares. O Brasil contribui aproximadamente com 4% das emissões mundiais, logo depois de Estados Unidos, China, Rússia e Japão.

Nada mais evidente, portanto, do que o interesse de tomar medidas concretas e efetivas para reduzir o desmatamento, adotando metas claras e um calendário para cumpri-las, algo que qualquer administrador sensato faria. Não é, contudo, o que aconteceu até agora, devido à resistência de setores interessados na devastação e a inércia do governo federal, preso a dogmas em torno da soberania sobre a Amazônia. O problema nunca foi o de defender a Amazônia da cobiça internacional, mas da cobiça dos próprios brasileiros, insensíveis às conseqüências danosas da derrubada predatória.

Por essa razão é salutar a medida anunciada pelo governo no Plano Nacional de Mudanças Climáticas preparado para apresentação na Conferência dos Países Signatários da Convenção do Clima, que se reúne em Poznan na Polônia: reduzir o desmatamento em 40% (de 2006 a 2010) abaixo da medida dos desmatamentos nos últimos 10 anos. Após 2010, o desmatamento deverá cair 30% a cada quatro anos.

Com isso se destrói a tese defendida por setores do Itamaraty de que a adoção de metas (e um calendário para cumpri-las) poderia interferir na soberania nacional. Na realidade, a adoção de metas é a única forma de realizar as tarefas necessárias a qualquer outro plano de governo, como o PAC.

As metas adotadas para a redução do desmatamento foram acompanhadas de várias condicionantes, como a da efetivação de recursos externos, o que é, no fundo, uma condicionante pueril. Os maiores interessados na redução do desmatamento deveriam ser os próprios brasileiros e, portanto, não há razão para adiar as ações necessárias, como a regularização efetiva das propriedades das terras. Além disso, muitas medidas não dependem de recursos, mas de políticas próprias e de mobilização dos órgãos de fiscalização do governo que já existem. Essa é a postura adulta de enfrentar o problema.

Cabe agora aprofundar, na mesma direção, outras medidas apenas esboçadas no Plano Nacional de Mudanças Climáticas, que vão exigir ações adicionais, tais como a efetiva introdução de medidas de eficiência energética na indústria e no transporte, que podem ser feitas sem prejudicar o crescimento econômico do país.

José Goldemberg, Professor da Universidade de São Paulo (USP)

* Artigo originalmente publicado no Correio Braziliense, 06/12/2008.

[EcoDebate, 08/12/2008]

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