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Projeto de lixo urbano obrigará fabricantes de agrotóxicos, pilhas e baterias, lâmpadas fluorescentes, pneus e eletrônicos a coletar produtos e embalagens após uso


Imagem: Stockxpert

A nova legislação que define um marco regulatório para o tratamento do lixo urbano começa a ganhar contornos finais nesta semana. O deputado Arnaldo Jardim (PPS-SP), relator da matéria, apresentará a versão final do substitutivo à proposta original do governo.

Diferentes projetos de lei debatidos nos últimos 17 anos ficaram nos escaninhos do Congresso, mas agora há sinais de avanços na instituição de um Programa Nacional de Resíduos Sólidos. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) ainda têm severas restrições ao texto preliminar de Jardim, submetido ao grupo de trabalho que discute o tema. Matéria de Daniel Rittner, do Valor Econômico, 02/12/2008.

O principal atrito envolve a inclusão pelo relator de cinco segmentos no sistema de logística reversa. A proposta inicial do governo já trazia esse conceito, que obriga os fabricantes a “trazer de volta” os produtos comercializados para destinação final, reutilização ou reciclagem. Mas não especificava nenhum segmento, o que só deveria ocorrer na regulamentação da lei, diz a indústria.

Fabricantes de agrotóxicos, pilhas e baterias, lâmpadas fluorescentes, pneus e eletrônicos ficarão obrigados a “estruturar e implementar sistema de logística reversa, mediante retorno dos produtos e embalagens após o uso pelo consumidor, de forma independente do serviço público de limpeza urbana”, segundo o relatório preliminar de Jardim.

A CNI combate a idéia. “Uma lei geral não deve citar segmentos nem normatizar situações específicas”, afirma o diretor de relações institucionais da entidade, Marco Antônio Guarita. Ele reconhece que a preocupação com a periculosidade dos produtos e embalagens motivou a inclusão desses segmentos, mas lembra que inovações tecnológicas podem substituir matérias-primas hoje consideradas perigosas e dispensar os produtos mencionados de tratamento especial. O problema, diz Guarita, é que a lei continuará amarrando os fabricantes à logística reversa.

Jardim pondera que esses segmentos já têm legislação própria ou resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) que impõem normas semelhantes. A exceção são eletroeletrônicos e seus componentes. Se a proposta vingar, indústrias, distribuidores e varejistas deverão montar estruturas complexas de recolhimento de produtos como computadores e televisores , responsabilizando-se por equipamentos dispensados pelos consumidores. Aumentos de custos – e, conseqüentemente, de preços – se tornarão prováveis para implementar o sistema.

A intenção da política nacional de resíduos sólidos, entretanto, é mais ambiciosa. O país produz 154 mil toneladas por dia de resíduos, dos quais 78% são lixo doméstico. Hoje, apenas 13% dos municípios brasileiros têm aterros sanitários.

Além de instituir o conceito do poluidor-pagador – aquele que contamina o meio ambiente com rejeitos deverá ser penalizado com multas -, trabalha em outras vertentes. Aos municípios, cria a obrigação de elaborar planos de gestão integrada de resíduos sólidos, com identificação de pontos para novos aterros e metas para coleta seletiva, a fim de ter acesso a recursos da União. E prevê a concessão de incentivos tributários para reciclagem de materiais pela indústria.

O governo vê com bons olhos as mudanças feitas pelo deputado. “Muitas questões foram aprimoradas e há conceitos positivos que estão sendo introduzidos”, diz Vicente Andreu Guillo, titular da Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente, responsável pelo assunto no Executivo.

O relator optou por privilegiar o conceito de responsabilidade compartilhada pelo destino dos rejeitos, em consonância com a abordagem americana para o setor. Esse modelo prevê a divisão de responsabilidades entre produtores, comercializadores e consumidores. CNI e Fiesp aplaudiram a escolha e dizem que essa alternativa permite ampliar os esquemas de recolhimento.

No outro modelo, adotado por muitos países europeus e de responsabilidade exclusiva do produtor, a responsabilidade fica inteiramente nas mãos dos fabricantes, muito mais sujeitos à aplicação de penalidades – se o consumidor se desfaz de um produto que não quer mais, ainda assim é a indústria quem paga pela destinação inadequada.

Na responsabilidade compartilhada tendem a multiplicar-se programas, por exemplo, em que o consumidor paga a mais pelo produto e pode ganhar descontos ou reembolso de parte do dinheiro quando levar de volta o resíduo ao ponto de compra. É mais ou menos parecido com o que ocorria com os vasilhames de refrigerante: a primeira compra é sempre mais cara, mas o preço diminui com a devolução da garrafa.

Jardim foi designado coordenador de um grupo de trabalho informal de parlamentares que tem se reunido periodicamente com representantes da indústria e associações interessadas na nova legislação. A missão do deputado é facilitar um acordo que permita destravar a tramitação do projeto. Seu substitutivo deverá ser apreciado nesta semana e depois seguirá ao plenário da Câmara – onde ele tem o compromisso de atuar como relator.

O vice-líder do PPS acredita que um dos maiores avanços está nos instrumentos econômicos criados pelo projeto de lei. Máquinas e equipamentos destinados à reciclagem de resíduos sólidos terão desconto de 50% no IPI e depreciação acelerada incentivada. Há previsão também de linhas de financiamento com juros menores para financiar projetos ambientalmente mais amigáveis. “O projeto fortalece uma indústria de resíduos, dá peso a instrumentos tributários, estimula o planejamento dos municípios na destinação adequada do lixo e inova na caracterização da responsabilidade”, diz Jardim.

“O substitutivo traz uma abordagem mais moderna e adequada do o projeto do governo”, elogia Guarita, da CNI, insistindo na tentativa de restringir o processo de logística reversa a resíduos de produtos “perigosos” e de eliminar a especificação de segmentos. A Fiesp tem avaliação semelhante. “Tem havido uma proliferação de normas estaduais, às vezes até mesmo colidentes, e por isso uma política nacional de resíduos sólidos é bem-vinda”, comenta Nelson Pereira dos Reis, diretor titular do departamento de meio ambiente da federação.

A preocupação de Reis é que a iniciativa repita o equívoco, segundo ele, da política paulista de resíduos – aprovada em março de 2006 e relatada na Assembléia Legislativa pelo mesmo Arnaldo Jardim. De tão cheia de minúcias, afirma o diretor da Fiesp, a lei não foi regulamentada até hoje e sua aplicação tornou-se difícil.

[EcoDebate, 03/12/2008]

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