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Vazios urbanos: Proteger territórios ainda não ocupados é um dos desafios para a gestão do território com visão de futuro, artigo de Aldo Paviani

Imagem de satélite da Floresta da Tijuca, RJ
Imagem de satélite da Floresta da Tijuca, RJ.

[Correio Braziliense] Ao estudar o ambiente rural, especialistas analisam o uso da terra e as reservas de proteção ambiental – as matas ciliares, os rios e a fauna necessários à sustentabilidade. Importa considerar as vulnerabilidades do ambiente em que se cultiva a terra e partir para a sustentabilidade. Há preocupação com o bioma amazônico e os cerrados. Ambos são vistos como territórios de reserva para futuras gerações. Preservá-los da cobiça (nacional e internacional) é dever do Estado, das empresas e de todo brasileiro.

Por isso, é necessário entender as vulnerabilidades do ambiente em que se cultiva a terra; identificar as ações que podem transformar terras férteis em ambientes inóspitos, arenosos, destituídos de animais, águas e plantas. Quando se avalia o ambiente urbano, é interessante conhecer como os territórios são demarcados e ocupados. A demarcação para reservas estratégicas ou para povoamento é efetivada pelos habitantes, pelos agentes estatais e pelos agentes econômicos. Os territórios demarcados para usos futuros são vistos na atualidade como “vazios” (terras vagas) e são vulneráveis por conta dos especuladores que visam a lucros imediatos. Proteger territórios ainda não ocupados é um dos desafios para a gestão do território com visão de futuro.

As ações para modificar territórios e aglomerados urbanos ocorrem com uma conjunção de forças. Poderíamos utilizar em escala menor a teorização de Milton Santos para o caso brasileiro, em termos da dinâmica territorial, quando trata da “dissolução” da metrópole brasileira: “Pode-se dizer, no caso do Brasil, que as tendências concentradoras atingiam número maior de variáveis. Recentemente, as tendências à dispersão começam a se impor”.

O setor econômico usa intensivamente o aparato de propaganda para empreendimentos imobiliários nos terrenos vagos de propriedade privada. Os estoques de terras públicas visam às necessidades de expansão em vista da demanda da sociedade. Raras são as grandes cidades brasileiras em que o ente municipal ou estadual, ao longo do tempo, fez previsões para suas necessidades futuras de terras para equipamento ou novos órgãos públicos. Nesse caso, há duas saídas: uma, a desapropriação de propriedades privadas, como acontece na abertura de novas avenidas ou construção de escolas e hospitais; a segunda ação liga-se à improvisação e mesmo acordo com entidades privadas ou órgãos federais que incluem permutas ou convênios de mútuo interesse. Em todos os casos, as iniciativas com terras no interior das metrópoles envolvem alargamento de sua periferia com a necessidade suplementar de obras viárias (túneis, viadutos, duplicação de vias), extensão de redes de saneamento básico, de energia elétrica e demais serviços.

A favela, por sua vez, é a outra face do alargamento do espaço metropolitano. Disseminadas às dezenas no espaço da metrópole, as favelas ocupam largas porções da periferia. A característica essencial do favelamento é o predomínio de habitações precárias, o desalinho do arruamento, a falta de esgoto, de encanamento hidráulico, de escolas, hospitais, isto é, falta dos serviços do Estado. As favelas tornam-se o lugar dos periferizados, dos desassistidos, pobres, discriminados e excluídos, vulneráveis à ilegalidade.

Por isso, cada vez mais os governantes se preocupam com a sustentabilidade ambiental urbana. No caso de Brasília, e a propósito do debate entre a sustentabilidade social e a sustentabilidade ambiental, em que é dada ênfase ao conteúdo do Plano Diretor de Ordenamento Territorial do Distrito Federal (PDOT), convém lembrar que há anseio generalizado para pôr ordem no espaço do DF. Pensa-se em democratizar as decisões para que todos os segmentos sociais se manifestem. Em teoria, isso se materializa no conteúdo do artigo 2º do PDOT, que explicita: “O PDOT tem por finalidade propiciar o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana e rural e o uso socialmente justo e ecologicamente equilibrado de seu território, de forma a assegurar o bem-estar de seus habitantes”.

Mas, em retrospectiva, muito esforço foi perdido e o recomeçar é desperdício de esforços e vontades. Pode-se imaginar que há domínio de segmentos organizados sobre outros menos coesos, geralmente os empobrecidos, com menos voz nas audiências públicas. Esperemos a volta ao bom senso e que Brasília não caia na vala comum das metrópoles brasileiras, do caos urbano.

Aldo Paviani, Professor emérito e pesquisador associado da UnB.

Artigo originalmente publicado no Correio Braziliense, 03/11/2008.

[EcoDebate, 04/11/2008]

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