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Pantanal vale US$ 112 bilhões. Valor anual da mata em pé é 270 vezes maior do que o lucro da pecuária que a derruba

O Pantanal vale US$ 112 bilhões por ano, no mínimo. O cálculo foi feito por pesquisador da Embrapa Pantanal, em Corumbá, e põe pela primeira vez em perspectiva o valor dos serviços ambientais prestados pela maior planície de inundação da América do Sul. O estudo ainda aponta que o valor anual da mata em pé é 270 vezes maior do que o lucro da pecuária que a derruba. Segundo o oceanógrafo e economista gaúcho André Steffens Moraes, que vive no Pantanal desde 1989, um hectare preservado do bioma que detém a maior concentração de fauna das Américas vale entre US$ 8.100 e US$ 17.500 por ano. A conta é detalhada em sua tese de doutorado (veja em www.cpap.embrapa.br/teses).

Migração da criação de gado extensiva para técnicas mais lucrativas estimula desmatamento nas áreas não-alagáveis do bioma

Quanto vale um bioma? A pergunta pode parecer maluca, mas, se o bioma em questão for o Pantanal, ela já pode ser respondida: US$ 112 bilhões por ano, no mínimo. Várias ordens de grandeza mais que o máximo de US$ 414 milhões anuais que a devastação do local gera. Por Claudio Angelo, Editor de Ciência, Folha de S.Paulo, 29/09/2008.

O cálculo foi feito por um pesquisador da Embrapa Pantanal, em Corumbá, e põe pela primeira vez em perspectiva o valor dos serviços ambientais prestados pela maior planície alagável fluvial do mundo, comparados com aquilo que é gerado pela pecuária, a mais rentável atividade econômica praticada na região.

Segundo o oceanógrafo e economista gaúcho André Steffens Moraes, “perdido no Pantanal desde 1989”, um hectare preservado do bioma que detém a maior concentração de fauna das Américas vale entre US$ 8.100 e US$ 17.500 por ano. A conta é detalhada em sua tese de doutorado, recém-defendida na Universidade Federal de Pernambuco e disponível para download (www.cpap.embrapa.br/teses).

Nela, Moraes inclui valores potenciais de coisas como madeira, produtos florestais não-madeireiros e ecoturismo. Mas também de coisas que não estão nem podem ser colocadas facilmente no mercado, como o valor da polinização feita por aves e insetos, o controle de erosão e, principalmente, a oferta e regulação de água -produtos e serviços que são perdidos quando a vegetação tomba. “Eu analisei quanto a sociedade perde quando se desmata”, disse o pesquisador.

Estilo Zé Leôncio

Com terras que ficam alagadas até 8 meses por ano, impróprias para a agricultura e abundantes em gramíneas, o Pantanal parece combinar com a pecuária, única atividade -além do turismo- rentável ali. Hoje há 5,3 milhões de cabeças no bioma, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

A pecuária também parece combinar com o Pantanal: como o capim faz parte do ecossistema, não é preciso recorrer ao desmatamento para criar gado. Há no bioma uma coexistência pacífica única no Brasil entre gado e fauna, que acaba tornando os fazendeiros da região conservacionistas, no melhor estilo Zé Leôncio (o fazendeiro consciencioso da novela “Pantanal”, interpretado pelo ator Cláudio Marzo). No jargão dos economistas, esse pecuaristas são considerados “satisficers” (saciadores) e não “maximizers” (maximizadores).

Segundo Moraes, o gado é de certa forma bom para a fauna: com carne de sobra, a pressão de caça diminui.

Desmate na cordilheira

O problema é que viver como Zé Leôncio não é para quem está interessado em grandes lucros: “A pecuária é extensiva, então a rentabilidade é baixa”, afirmou Moraes à Folha. Para ser exato, cada hectare de boi em pasto nativo rende US$ 12,5 ao ano para os produtores.

E é claro que pouca gente quer ser Zé Leôncio hoje em dia. A partir dos anos 1970, um aumento na demanda por carne associado a uma inundação no rio Taquari que diminuiu a área de pasto natural fez os fazendeiros começarem a derrubar as matas nas chamadas cordilheiras, as áreas de floresta que ficam secas o ano todo.

Sem a dor-de-cabeça de precisar tirar o gado todo ano quando o pasto alaga -que reduz o peso dos animais-, quem cria gado nas cordilheiras ganha mais dinheiro: US$ 28 por hectare ao ano.

Isso obviamente teve impacto direto sobre o bioma. Até 1991, apenas 545 mil hectares de mata nativa pantaneira haviam tombado. Em 2000 já era 1,2 milhão de hectares, ou 30% da área do Pantanal.

“O pecuarista não tem alternativa produtiva. O mercado o pressiona para desmatar e pôr pasto”, diz Moraes. “Quando ele faz isso, as ONGs e a sociedade criticam, mas eu como pecuarista faria a mesma coisa.”

Cientista sugere incentivo para gado “ecológico”
DO EDITOR DE CIÊNCIA

Além de tentar estabelecer um valor para a mata, o economista André Steffens Moraes também estimar o quanto o ganho adicional de R$ 15,50 por hectare -a diferença entre a pecuária de “seco”, que desmata, e a de “molhado”- se traduz em prejuízos decorrentes da perda do habitat pantaneiro.

Para isso, ele recorreu a uma série de análises de custo-benefício e a estudos anteriores sobre quanto as pessoas estariam dispostas a pagar pela simples existência do Pantanal. De longe o serviço que mais vale é a oferta de água, a verdadeira commodity do Pantanal. O fornecimento garantido pela vegetação e a regulação de cheias e secas vale mais de US$ 3.000 por hectare ao ano.

Benefícios globais, como armazenagem de carbono e regulação do clima, foram também calculados, mas de maneira menos precisa, já que há poucos estudos sobre o ciclo do carbono naquele bioma. Somados, os benefícios locais e globais chegam a US$ 8.100.

“São US$ 8.100 contra US$ 30. Uma loucura, né?”

No entanto, quando se agrega a variável um tanto exótica do “valor de existência”, a loucura fica ainda maior: um hectare de Pantanal preservado chega a quase US$ 17.500, e o valor total do bioma, a incríveis US$ 242 bilhões por ano.

Moraes, porém, não sugere que os fazendeiros deixem de desmatar em nome desse suposto valor de existência -um dinheiro que, afinal, existe só em teoria. “Todo mundo se beneficia, mas quem paga o custo da conservação é o pecuarista.”

A proposta do pesquisador é que a sociedade subsidie os Zés Leôncios, pagando para que eles não desmatem. Uma forma de fazer isso seria dar crédito mais barato a pecuaristas que mantêm suas áreas sem derrubada. Outra seria cobrar dos hotéis pantaneiros uma taxa para financiar pecuaristas. (CA)

[EcoDebate, 30/09/2008]

5 thoughts on “Pantanal vale US$ 112 bilhões. Valor anual da mata em pé é 270 vezes maior do que o lucro da pecuária que a derruba

  • elson ramos junior

    Sou engenheiro florestal e há mais de 30 anos defendo que a solução é pagar um valor mensal ou anual ao proprietário de terras que preserva a sua floresta. Defendo que o governo pague através de contrato feito com o proprietário. O valor a ser pago poderia ser não muito grande mas deveria ser progressivo a cada ano, isto é, o valor vai aumentando `a medida que o tempo passe. E a cada período a propriedade deveria ser vistoriada para se conferir se está mesmo sendo preservada. Aliás deveria ser paga após a verificação. Acho que essa é a solução para se preservar o nosso meio ambiente, nossas florestas : PAGAR PARA QUEM PRESERVA !
    ELSON

  • Harley Pellegrim

    Valer dinheiro todos sabemos que vale!! agora quero ver receber! quem vai pagar?? como?? isso que eu quero ver!!!!!!!!
    No papel tudo é bonito!!!! que ver acontecer!! seria a soluçÃo para a amazonia!

  • Emerson Marques

    Os recursos naturais não são pagos aos brasileiros. Somos explorados pelos ingleses, japoneses, americanos, que entram na amazônia livremente e levam nossas plantas, árvores, sementes, e patenteiam remédios no país deles, como se fosse de lá que extraíssem. Tem que primeiramente haver dados compilados, controle, para depois haver investimento, haver cuidado, e quem sabe até pagamento ! Criticar é fácil, …quero saber qual sua solução para amazônia sr. harley ?? A tese é ótima, e todo desenvolvimento, demanda informação antes de ação ! Estudar, discutir, propor soluções, isso é a saída para a amazônia, envolvimento………..

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