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Agricultores lusos inovam para contornar mudanças do clima


Irrigação por gotejamento. Foto: USDA ERS

Irrigação “gota-a-gota”, antecipação do cultivo para aproveitar as chuvas do final da primavera e o isolamento térmico dos telhados para proteger o gado são algumas estratégias que os agricultores portugueses estão adotando para contornar as mudanças climáticas. Da Agência Lusa.

“O clima está mais instável, mais extremo e temos de nos ir adaptando com o recurso às novas tecnologias, como a internet, para saber a previsão do tempo”, disse à Agência Lusa o vice-presidente da Associação de Jovens Agricultores de Portugal, Carlos Neves.

O presidente do Instituto de Meteorologia, Adérito Serrão, verificou que, ao contrário do previsto antes do verão europeu, os meses de julho e agosto foram menos quentes, embora secos.

O vice-presidente da entidade diz que os agricultores “já não olham para o lado para ver o vento, nem se baseiam nos ditados populares” para saber a melhor época para cultivar.

Para poupar água, um jovem agricultor, produtor de milho e também dono de um curral em Vila do Conde, semeia suas terras mais cedo para aproveitar a chuva que cai no final da primavera, enquanto outros colegas utilizam o sistema de irrigação gota-a-gota.

O gado também não é esquecido nesta batalha contra as mudanças de clima, como contou o agricultor. “As vacas sofrem muito com o calor, sentem-se mal, comem menos e produzem menos. Então colocamos ventiladores nos estábulos e isolamos o telhado para que a temperatura seja mais amena”, adiantou.

Mudanças profundas

O diretor-executivo do Instituto para o Desenvolvimento Agrário da Região Centro, Manuel Costa, adiantou que as condições meteorológicas têm sofrido alterações “acentuadas” nos últimos anos, o que obrigou os agricultores a encontrarem formas para contornar essa situação.

“Essa alteração [climática] é para ficar, não é meramente acidental”, frisou. “Os agricultores aperceberam-se de que o clima mudou e de que as culturas tradicionais terão de ter alternativas”.

Manuel Costa deu como exemplo este mês de agosto que, na região central de Portugal, tem apresentado manhãs com nevoeiros acentuados que se prolongam até o meio da tarde, altura em que descobre o sol, e que pode trazer “algumas complicações” para as frutas e as videiras, que não suportam situações de umidade e calor.

“Até o momento não há indicadores de que tenha havido problemas resultantes dessas alterações (climáticas) porque os agricultores já estavam precavidos e tomaram medidas”, justificou.

Para o vice-presidente da Confederação dos Agricultores Portugueses (CAP), Luís Mira, o maior problema dos agricultores não é a questão climática, mas sim as variações de mercado que têm causado expectativas: semeia-se a um determinado preço, mas na época da colheita esse preço caiu 40%.

“As pessoas já estão habituadas ao clima. Há anos melhores, outros piores, com chuva ou menos chuva, mas as variações constantes da política e do mercado são fatores muito mais nocivos e difíceis de controlar do que as alterações climáticas”, frisou.

Apesar dos esforços dos agricultores, o presidente da ONG Quercus, Hélder Spínola, considera que muitos não estão se adaptando porque desenvolvem um tipo de agricultura cada vez mais dependente de alguns recursos que serão escassos no futuro, como a água e nutrientes do solo que, com as alterações climáticas, tendem a ficar menos férteis

“Estamos a falar de um fator que é fundamental para essa atividade, que é a disponibilidade de água”, disse o ambientalista, lembrando que as projeções indicam que, até o final deste século, a redução deste bem pode atingir 40%.

“Até a agricultura sem rega depende da chuva no momento certo e com alguma regularidade ao longo do ano”, sustentou Hélder Spínola.

O ambientalista lembrou também outros problemas que as mudanças do clima podem trazer, como as pragas agrícolas, que têm tendência a aumentar sua área de distribuição e que podem afetar sobretudo a Portugal.

(Matéria da Agência Lusa, 22-08-2008 15:57:19)

[EcoDebate, 23/08/2008]