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CNEN diz que escolha de local para rejeitos nucleares não pode ser feita enquanto governo não decidir com quantas usinas pretende trabalhar


A indefinição sobre o tamanho do programa nuclear brasileiro trava a escolha de um local para o depósito definitivo de rejeitos de alta radioatividade, segundo o presidente da CNEN (Comissão Nacional de Energia Nuclear), Odair Gonçalves.

Uma das condições impostas pelo Ibama na licença prévia de Angra 3 foi “apresentar proposta e iniciar a execução do projeto aprovado pelo órgão ambiental para disposição final dos rejeitos radioativos de alta atividade antes do início da operação da unidade 3”. Por Janaina Lage, na Folha de S.Paulo, 18/08/2008.

Gonçalves afirma que a CNEN tem conversado com o Ibama porque o órgão não deveria fazer a exigência à Eletronuclear, e sim à comissão. Uma usina nuclear produz três tipos de rejeito: de baixa, média e alta intensidade. Os de alta intensidade são os elementos combustíveis, que hoje são acondicionados em piscinas de resfriamento nas próprias usinas.

O assistente da presidência da Eletronuclear, Leonam dos Santos Guimarães, afirma que, a rigor, nesse caso não caberia nem mesmo a classificação de rejeito porque o combustível pode ser reprocessado para gerar mais energia. A capacidade atual das piscinas vai até 2020.

Os rejeitos de baixa e média intensidade são roupas usadas, filtros de ar e objetos que retenham alguma partícula radioativa. Atualmente são guardados em depósitos iniciais no terreno da usina.

Depósito intermediário

Segundo Guimarães, a Eletronuclear pretende construir outras piscinas, que poderiam guardar o material durante toda a vida útil das usinas, enquanto não fica pronto o depósito final, que o executivo chama de “depósito intermediário de 500 anos”.

A idéia é criar um depósito que permita, caso o país necessite no futuro, o reaproveitamento do combustível. “Hoje, no Brasil, não faz nenhum sentido pensar em reprocessamento. É totalmente antieconômico, nosso parque nuclear é pequeno e temos a sexta maior reserva de urânio no mundo, mas no futuro isso pode ser diferente”, disse.

Para Gonçalves, a escolha do local não pode ser feita enquanto o governo não decidir com quantas usinas pretende trabalhar. “Trata-se de um projeto caro, não posso construir um a cada cinco anos”, disse. Ele afirma, no entanto, que a região Nordeste seria uma “forte candidata” a receber uma das próximas centrais nucleares e o depósito de rejeitos.

Inicialmente, quando o projeto nuclear se concentrava em Angra, pensava-se em construir o depósito em local próximo, mas, com a perspectiva de construir nos próximos anos de quatro a oito novas usinas em diferentes pontos do país, encontrar o local adequado para o depósito de rejeitos se tornou uma tarefa mais complexa. Não há, por enquanto, estimativas de qual seria o investimento necessário. A previsão é de entrada em operação do depósito em 2050.

Em Angra 1, existem hoje 614 elementos combustíveis. Em Angra 2, são 272. A execução do projeto do depósito ainda poderia ficar a cargo de uma nova estatal, que seria criada para isso. O conceito com que a Eletronuclear trabalha atualmente inclui um ambiente rochoso, como uma caverna.

Os elementos combustíveis seriam encapsulados e transportados até lá. “Embaixo do concreto tem chapa metálica para garantir a impermeabilização”, disse o executivo da Eletronuclear. Antes de ser levado para esse depósito, o combustível precisa ficar cerca de dez anos nas piscinas para o resfriamento.

Outros países também estão tentando equacionar a questão dos rejeitos definitivos. Finlândia e Suécia têm projetos de depósito final subterrâneo, onde o combustível ficará armazenado a grandes profundidades. Os Estados Unidos têm o projeto de Yuka Mountain, em terreno de montanhas em Nevada.

Minc diz que argumento de comissão sobre programa é “desculpa esfarrapada”

O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, afirmou à Folha que o argumento da CNEN (Comissão Nacional de Energia Nuclear) sobre a necessidade de definir o tamanho do programa nuclear brasileiro antes de determinar as condições do depósito final de rejeitos é “uma desculpa esfarrapada”.

Segundo Minc, caso o depósito não esteja em início de construção dentro de quatro anos, Angra 3 não receberá a licença de operação.

Para Minc, a comissão já poderia escolher o local onde será instalado o depósito e elaborar a forma como o elemento combustível será transportado.

O ministro afirma que, apesar de ser contra a expansão do programa nuclear brasileiro, participará de uma reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e diversos outros ministros, em que será discutida a necessidade de criação de novas usinas nucleares no país. Até então, representantes do setor afirmam que se discute a hipótese de construção de 4 a 8 usinas no país.

“É a CNEN que vai dizer onde serão armazenados os resíduos, em que condições serão transportados. Nosso papel é dar a licença ambiental, não vou interferir no que é competência deles. Não darei licença de operação para Angra 3 sem que esteja escolhido, definido e em início de construção o depósito de rejeitos”, disse o ministro do Meio Ambiente.

Caminhão de lixo

Na avaliação do ministro, não há necessidade de armazenar tudo em um único depósito. “Digamos que o governo decida construir três usinas no Nordeste, mesmo que com o meu voto contrário. Não necessariamente deve levar o rejeito de Angra 1, 2 e 3 para lá. Não vai atravessar o país com um caminhão de lixo atômico”, disse.

Afirma ainda que nada impede a CNEN de construir o depósito em módulos, de forma que, se houver expansão do programa nuclear, o local possa ser ampliado.

[EcoDebate, 19/08/2008]