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Relator da ONU culpa biocombustíveis e especulação pela crise dos alimentos

A transformação de alimentos em biocombustíveis e a especulação financeira são as principais causas da alta dos preços dos produtos alimentícios, denunciou hoje o relator da ONU (Organização das Nações Unidas) para o Direito à Alimentação, Jean Ziegler, que qualificou a crise de “verdadeira tragédia”. Da EFE, em Genebra, na Folha Online, 28/04/2008 – 10h53.

O relator, que deu uma entrevista em Genebra para fazer um balanço de seu mandato, que termina nesta semana, disse que os biocombustíveis são “um crime contra grande parte da humanidade, algo intolerável”, pois a transformação em massa de alimentos em combustível provocou a escalada dos preços de produtos básicos.

Ziegler qualificou de “histórica e essencial” a reunião que as agências e organismos da ONU –com a presença do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon realizam hoje em Berna (Suíça) para enfrentar a crise alimentícia.

O relator apelou aos doadores do Programa Mundial de Alimentos da ONU para que aumentem suas doações, porque a agência “perdeu 40% de seu poder aquisitivo em três meses” devido à alta dos preços. Ziegler lembrou que 75 milhões de pessoas no mundo “dependem para sua sobrevivência de receber as provisões do programa”.

Segundo dados da FAO (Fundo das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) citados por Ziegler, no último ano, o preço dos cereais –especialmente o trigo– aumentou 130%; o do arroz, 74%; o da soja, 87%; e o do milho, 53%. Além disso, há os custos do transporte dos alimentos, lembrou o suíço.

Por isso, o relator defendeu uma moratória imediata durante pelo menos cinco anos na produção de biocombustíveis.

Ziegler ressaltou que o “massacre cotidiano da fome” é uma crise “antiga”, mas que no último mês e meio, com a forte alta dos preços no mercado mundial, “novas classes sociais caíram, por milhões, no abismo da fome”.

Uma família européia destina de 10% a 12% de seu orçamento à alimentação. No mundo em desenvolvimento, onde 2,2 bilhões de pessoas vivem na extrema pobreza, segundo o Banco Mundial, a proporção é de 85% a 90% da renda gastos com os alimentos.

Sobre os biocombustíveis, disse entender que é preciso combater a mudança climática, “mas sem matar as pessoas de fome”, e defendeu potencializar o transporte público e outras fontes de energia, como a elétrica. “O direito à vida e à alimentação é o principal”, disse.

O relator criticou os Estados Unidos, que destinou no ano passado um terço de sua colheita de milho à produção de álcool, e a União Européia, por sua diretiva segundo a qual 10% de seu consumo energético deve vir dos biocombustíveis em 2020.

“Todo o mundo está de acordo em que a UE não pode proporcionar isso, portanto é a África, que já está atingida pela fome, que deverá fazê-lo”, acrescentou.

Sobre a especulação, disse que “é responsável por 30% da explosão dos preços”, especialmente a Bolsa de Valores de Chicago, onde os fundos de produtos básicos dominam 40% dos contratos.

Disse que as duas causas, os biocombustíveis e a especulação, “não são fatalidades”, mas têm remédio, como a moratória e controles mais severos, respectivamente.

Por fim, culpou a política “aberrante” do FMI (Fundo Monetário Internacional) por desenvolver culturas de exportação para reduzir a dívida externa, em detrimento de agriculturas de subsistência, e defendeu o fim dos “cultivos coloniais”.

O relator também lembrou que o novo diretor do Fundo, Dominique Strauss Kahn, “se referiu à moratória dos biocombustíveis como uma possibilidade a levar em conta”.