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Mudanças climáticas agravam questões de saúde pública

No dia mundial da saúde, 07 de abril, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) alertaram para os efeitos das mudanças climáticas na saúde da população. Mara Lúcia Oliveira, técnica da Unidade de Saúde Ambiental da OPAS, explicou que algumas alterações climáticas já estão trazendo sérios problemas para a saúde pública, como por exemplo, o aumento da temperatura e da umidade, que facilitou, segundo ela, o criadouro de mosquitos transmissores de doenças como a dengue e a malária. Para cientistas brasileiros, no entanto, o clima não pode ser responsabilizado por algumas questões em saúde pública, e alterações climáticas só deixam mais evidente a vulnerabilidade do nosso sistema social. Por Daniela Lot, da ComCiência, Revista Eletrônica de Jornalismo Científico, SBPC/LABJOR.

De acordo com Carlos Corvalan, consultor da OMS, mesmo os países desenvolvidos não estão preparados para os efeitos extremos do clima. Para ele são provas disso: o furacão Katrina nos Estados Unidos (2005), que matou cerca de 1000 pessoas e obrigou a evacuação de mais 1 milhão da região de New Orleans, e a onda de calor (2003) que matou 70 mil pessoas na Europa. Oliveira, por sua vez, focaliza países com maior vulnerabilidade social e acrescenta que doenças que em alguns locais já haviam sido eliminadas podem voltar a acontecer. Ela afirma que, no Brasil, períodos de seca prolongados já afetaram a saúde de populações no Nordeste e na Amazônia.

De forma geral, as informações divulgadas pela OMS sinalizam que as atividades humanas que causam o aquecimento global já acarretaram sérias implicações para a saúde pública, e que esses fenômenos já afetaram a água e a comida e influenciaram novos padrões de doenças infecciosas ou doenças emergentes.

Para o médico Ulisses Confalonieri, da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no entanto, as doenças emergentes estão associadas a múltiplos fatores. “Dificilmente essas doenças têm relação com o clima. A que mais chama atenção hoje é a influenza aviária. A dengue também pode ser considerada emergente no Brasil. Mas nenhuma delas é influenciada direta ou unicamente pela variação do clima”.

O médico explica ainda que cada impacto tem que ser compreendido em seu contexto local, sem que sejam feitas generalizações. “Alguns dizem que o aumento da temperatura favorece a reprodução do mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue, mas para que haja aumento na proliferação do mosquito é preciso ter chuva e temperatura num nível favorável à sua reprodução”, argumenta ele.

De acordo com Confalonieri, embora temperatura e quantidade de chuvas façam com que o mosquito se prolifere, é preciso olhar para vários outros fatores, como a falta de imunidade das pessoas e de assistência médica. Além disso, na opinião dele a epidemia ocorre pela falta de planejamento urbano e de políticas públicas. “Da mesma forma, as inundações ou deslizamentos são um problema porque as pessoas moram em lugares de risco, onde a drenagem é ruim, não há coleta de lixo e nem um adequado sistema sanitário. Nosso equipamento urbano é deficiente”, conclui o médico.

Ausência de políticas públicas

Wagner Costa Ribeiro, geógrafo da Universidade de São Paulo (USP), lembra que, no caso brasileiro, o que mais preocupa é a possibilidade das mazelas sociais ficarem ainda mais evidentes com as mudanças climáticas. Ou seja, para ele, elas devem ser analisadas no quadro da desigualdade social brasileira. “A temperatura mais elevada é um dos fatores que podem levar ao desenvolvimento de vetores que causam problemas de saúde, como o mosquito da dengue, mas não é o caso de dizer que a atual epidemia de dengue já seja decorrente de mudanças climáticas. Mas, devemos ficar em alerta”.

Ribeiro aponta que o aquecimento global levanta questões as quais devem estimular um novo olhar sobre problemas sociais e medidas para evitar a população de baixa renda seja prejudicada. “A população que mais sofre com os alagamentos é a de menor poder aquisitivo, que vive em condições precárias. Não é um problema só de saúde, é um problema social. No caso brasileiro, é um problema histórico que precisa ser combatido”.

Para Confalonieri, o que confere a vulnerabilidade é o grau de exposição que as pessoas têm aos fenômenos, perigos, riscos, e a capacidade que têm de reagir. Para ele, isso depende de como os espaços sociais, instituições, serviços e informações são organizados. “No Brasil, a capacidade de resposta no Rio de Janeiro no caso da dengue, por exemplo, tem se mostrado muito ruim”.

Ribeiro e Confalonieri concordam que há no país uma vulnerabilidade decorrente da ausência de políticas públicas, de planejamento urbano e de um sistema de saúde adequado. Por isso, caso ocorram as mudanças climáticas previstas, o cenário poderá ser agravado pela incapacidade de resposta adequada. Para Confalonieri, a expectativa é que o novo contexto decorrente das mudanças climáticas globais aumente os problemas de saúde pública já existentes, exacerbando essa situação de vulnerabilidade. “Não serão criados doenças ou problemas novos, mas agravados os que já existem”, diz ele.

Mara Lucia de Oliveira, da OPAS, concorda que existe a falta de saneamento e de coleta e tratamento de esgoto em áreas periféricas, e aponta que os fenômenos climáticos recentes mostram que os gestores precisam levar em conta as mudanças climáticas numa região na hora de planejar suas ações. Para ela, governo, pesquisadores e organismos internacionais devem trabalhar juntos para fazer prognósticos e tentar encontrar uma forma de planejamento ao longo prazo.

Nos dias 09, 10 e 11 de abril a OPAS realizou em Brasília uma oficina regional sobre mudanças climáticas e seus efeitos sobre a saúde nas Américas, com o objetivo de preparar um Plano de Ação. A partir da oficina, começou a ser preparado um plano regional com o intuito de auxiliar os países a conhecer e identificar suas vulnerabilidades. De acordo com Corvalan, o intuito é que esse plano gere discussões entre a OPAS e os países para que sejam definidos programas e critérios de ação.