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Artigo

Polícia Federal no sul de Santa Catarina, artigo de Ana Echevenguá

[EcoDebate] Na região sul de Santa Catarina, crescem, dia a dia, como um bola de neve, os danos ao meio ambiente e, em especial, à saúde dos habitantes do entorno das instalações da empresas mineradoras.

Todos convivem, há tempos, com as ilegalidades praticadas pela atividade minerária. Como se fosse um procedimento normal. Um morador da região me falou que, “no imaginário das pessoas, o carvão é associado ao progresso. Portanto, há um respaldo cultural para o setor, pois a maioria da população não tem noção da realidade socioambiental”.

Se é assim, acho que chegou a hora de acabar com essa impunidade desvairada. É preciso repassar às pessoas informações sobre os crimes praticados pelos mineradores e pelos servidores públicos que cruzam os braços diante destes crimes. E, principalmente, sobre os perigos do carvão à saúde das pessoas. A atividade minerária é lícita; no entanto, os crimes que ela pratica devem ser tratados como crimes.

Para a Constituição Federal, os recursos minerais do subsolo pertencem à União (art. 20, IX). Mas ela permite a exploração destes recursos através de concessões.

O Código de Minas estabelece que os empresários mineradores devem pedir autorização de lavra ao Ministro das Minas e Energia (art. 38). E obriga, no art. 47, inciso XI, aquele que ganhar a concessão da lavra a evitar qualquer poluição (do ar e da água) que a mineração possa causar. Caso contrário, será punido.

Bom, isso é a Lei! Sabem o que acontece lá no sul? É simples: os futuros concessionários das jazidas de carvão pedem a concessão ao DNPM, obtêm as licenças (muitos já nem precisam de licenças, pois mineram por força de TACs), extraem o carvão sem qualquer cuidado (com os rejeitos, com os empregados, com os moradores da região); enriquecem e abandonam as áreas exploradas. Vão cavar outros buracos e deixam todos os problemas a céu aberto.

Ah! Esqueci de explicar: um TAC é um Termo de Ajuste de Conduta; se a conduta é ilegal, ela pode ser ajustada a algumas regras previstas pelos Ministérios Públicos nesse documento. Algumas mineradoras, por exemplo, não têm licença ambiental para minerar, mas estão trabalhando graças a um TAC. Particularmente, eu vejo o TAC como um grande incentivo ao delinqüente para continuar delinqüindo.

Voltando ao nosso assunto, o Código de Mineração obriga o empresário titular da concessão a promover a segurança e a salubridade das habitações existentes no local. E a indenizar os danos e prejuízos a terceiros, que resultarem, direta ou indiretamente, da mineração. Mas isso não acontece espontaneamente não! Se o proprietário tiver algum prejuízo de ordem material (rachaduras nas residências, poços que secaram, etc), ajuíza uma ação indenizatória e senta pra esperar…

Que proprietário? Estou falando do proprietário da terra, ora. O empresário minerador ganhou um papel que lhe deu o direito de explorar o carvão. Ele é dono só do carvão (art. 176, CF). Ele não compra a terra. Pra que ele vai gastar com isso se a terra depois de explorada não serve pra mais nada?

Pasmem diante de outra situação impressionante! Eu soube que os proprietários das terras nunca foram (ou são) consultados acerca da exploração do carvão no subsolo de suas propriedades. Embora a Lei mande. Também não consegui encontrar quem tenha feito algum tipo de acordo pecuniário pelo uso da sua terra… não naquela na região.

A maioria nem sonha que tem direito à participação na CFEM – Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais, cujo percentual é pequeno, mas, considerando o faturamento total, gera uma renda bem significativa, Esta compensação é prevista na Constituição Federal (art. 20, § 1º). O empresário minerador deve recolhê-la aos cofres públicos como contraprestação pelo uso econômico dos recursos minerais. E a mesma Constituição garante parte desta CFEM ao proprietário do solo (art. 176, § 2º).

Mas eu acho que a bandidagem está com os dias contados. Hoje, vi uma notícia espetacular no jornal A Tribuna: “PF já atua em Criciúma”. O delegado federal Davi Antônio Furlan disse ao periódico que “A delegacia de Criciúma vai priorizar a investigação de corrupção de servidores em cargos públicos e o tráfico de drogas, mas os trabalhos serão concentrados também em crimes ambientais e contrabando”. Estes receberão “atenção especial da polícia em função da grande incidência desses crimes na região”: “Aqui é Região Carbonífera e tem muitas áreas de preservação. Sem falar que é próximo às fronteiras, o que pode facilitar a prática de contrabando”.

Como o Dr. Furlam disse textualmente: “Vamos fazer o melhor atendimento possível à população”, o que nos resta fazer? Fornecer colaboração efetiva a eles. Vamos nos familiarizar com os nossos direitos, com a Divisão de Repressão de Crimes contra o Meio Ambiente da Polícia Federal. E denunciar os crimes ambientais dos quais temos ciência, especialmente os que ocorrem na região de Criciúma.

A comunidade em geral deve familiarizar-se também com a Lei dos Crimes Ambientais que, embora não preveja sanções penais e administrativas para todas as condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, é boa. Esta Lei precisa sair do papel: precisa ser difundida e aplicada!

Ana Echevenguá, advogada ambientalista, coordenadora do programa Eco&Ação, e-mail: ana@ecoeacao.com.br