EcoDebate

Plataforma de informação, artigos e notícias sobre temas socioambientais

Notícia

Mata Atlântica: Somos muito mais responsáveis pela derrubada da mata do que a economia mundial e seus padrões. Entrevista especial com Alexandre Colombo

Do Piauí ao Rio Grande do Sul se estende um dos mais importantes e devastados biomas brasileiros: a Mata Atlântica. Desde o ano 1500, 93% da sua área já foi extinta, mas ainda contempla um grande fluxo de genes da fauna e flora do país. Nas regiões onde está presente, vive 62% da população brasileira, um contingente populacional enorme, que depende da conservação dos remanescentes de Mata Atlântica para a garantia do abastecimento de água, a regulação do clima e a fertilidade do solo. Além disso, as mudanças climáticas também impactaram sobre a Mata Atlântica e é sobre isso que a IHU On-Line falou com o professor Alexandre Colombo, na entrevista que segue, realizada por e-mail. “Somos muito mais responsáveis pela derrubada da mata do que a economia mundial e seus padrões”, afirma Colombo.

O pesquisador Alexandre Colombo fez uma minuciosa pesquisa sobre o bioma da Mata Atlântica e que resultou em sua tese de mestrado em Ecologia, defendida mo Instituto de Biologia da Universidade de Campinas – Unicamp.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Quais são os principais impactos provocados pelas das mudanças climáticas sobre a biodiversidade do bioma na Mata Atlântica?

Alexandre Colombo – Trabalhamos com dois cenários: o otimista prevê um aumento de temperatura em torno de 2Cº e o pessimista prevê um aumento de temperatura em torno de 4Cº. Sabemos que a mata possui 38 espécies de árvores. Então, no cenário otimista, supomos que 37 dessas espécies terão suas áreas potenciais de ocorrência deslocadas para o Sul do país e uma redução de 25% da área total da mata. Por sua vez, no cenário pessimista, as 38 espécies, ou seja, todas, terão suas áreas potenciais de ocorrência deslocadas para o Sul do país e 50% de sua área será reduzida. Isso poderá acarretar em extinções e problemas generalizados de extinção também de animais.

IHU On-Line – O senhor pode apontar o que será necessário fazer para que essas mudanças sejam menores, ou seja, para que não modifiquemos ainda mais essa área que já está 93% menor?

Alexandre Colombo – Creio que devem ser feitas mudanças em três esferas: política, acadêmica e sociedade em geral. Na área política, devem ser criadas novas áreas de proteção ambiental, leis e projetos que incentivem a redução dos gases do efeito estufa e o aumento da fiscalização em todos os níveis. Já a área acadêmica deve continuar seus estudos referentes ao tema, assim como auxiliar ações de reflorestamento de áreas degradas, auxiliar a criação de corredores de vegetação, conectar os fragmentos e reflorestar as matas ciliares. Por sua vez, a sociedade deve tentar mudar seus hábitos de consumo, reduzindo a emissão de CO2, diminuindo o consumo de alimentos, preservando o meio ambiente e incentivando a divulgação dessas novas maneiras de pensar.

IHU On-Line – O quanto a economia brasileira e mundial é responsável pela devastação da Mata Atlântica?

Alexandre Colombo – Levando em conta que as grandes cidades brasileiras se estabeleceram na costa do país, temos dado que apontam que desde 1500 a Mata Atlântica vem sendo retirada. As economias brasileiras e mundiais afetam de forma negativa a floresta, devido aos novos padrões de consumo estabelecidos. Creio que ainda hoje o principal problema da Mata Atlântica seja o crescimento das cidades sobre a vegetação. Logo, somos muito mais responsáveis pela derrubada da mata do que a economia mundial e seus padrões, mesmo que esses sejam impostos em nosso país.

IHU On-Line – Uma das mais destacadas contribuições que a Lei da Mata Atlântica traz é a clara definição do que é considerado Mata Atlântica. No entanto, ainda não há uma formalização legal sobre o que seria o bioma. Para o senhor qual é a definição de bioma que a Mata Atlântica precisa? O que falta para constituirmos essa definição?

Alexandre Colombo – Creio que a Mata Atlântica, em sua delimitação, já é bem definida. Existem hoje mapas que delimitam as formações vegetais, assim como impõem seus limites claros. Com a Lei da Mata Atlântica, isso se tornou ainda melhor, ao passo que as vegetações secundárias dentro dessas áreas foram consideradas como sendo matas nativas também. Isso será interessante no controle do desmatamento e no avanço das cidades sobre a Mata Atlântica. Creio que o aumento da fiscalização e a efetiva proteção das áreas hoje estabelecidas como reservas facilitariam um maior estado de preservação desse bioma quase que inexistente. Não podemos mais ficar especulando se o que restou é ou não mata nativa para podermos explorá-lo. Restam apenas 7% de possível área nativa. Logo, precisamos preservar a totalidade, independente do conceito do que é Mata Atlântica.

IHU On-Line – Como o senhor analisa a fiscalização que o Governo Federal e os governos estaduais têm realizado a fim de manter a Mata Atlântica o mais conservada possível?

Alexandre Colombo – Ineficiente. Existem poucos fiscais e despreparados para tal função. Existe, dentro das unidades de conservação, exploração ilegal de espécies nativas em processo de extinção, vide o Palmito Jussara, além da caça ilegal de animais, de loteamento de áreas, de derrubada efetiva da mata etc. Creio que para o que resta hoje da Mata Atlântica a presença do homem não é mais possível dentro desses fragmentos de vegetação. A preservação deve ser efetiva. Devemos estabelecer regras claras para as comunidades locais com uma assistência em troca da manutenção da vegetação em “pé”. Creio que nesse campo haja MUITO ainda a se fazer.

IHU On-Line – Em sua opinião, quais são os erros e acertos de posicionamento do Brasil na discussão sobre mudanças climáticas?

Alexandre Colombo – O Brasil faz parte do problema global e ainda reluta em aceitá-lo. Devemos crescer e nos desenvolver tendo consciência que nossas matas podem ter o mesmo fim das matas dos países desenvolvidos. O Brasil emite milhares de toneladas de CO2 apenas com a queima ilegal de madeira. Devemos, sim, tomar partido, estabelecer metas de redução e focar nos casos mais críticos. No caso da Amazônia, além de retirar a mata, perder biodiversidade, enriquecer pouco e destruir o meio, estamos contribuindo para aumentar o problema mundial.

IHU On-Line – E quais são as vantagens que levamos?

Alexandre Colombo – Na minha visão, o Brasil deve, sim, estabelecer metas para a redução das emissões de gases de efeito estufa, assim como os países desenvolvidos, lógico que tomada as devidas proporções. O Brasil possui uma ótima legislação ambiental, possui tecnologia limpa de energia e vem contribuindo com as pesquisas e com as decisões sobre o aquecimento mundial, mas é pouco. Precisamos fazer a nossa parte e reduzir parte da destruição do nosso país e, conseqüentemente, do globo.

(www.ecodebate.com.br) entrevista publicada pelo IHU On-line, 13/02/2008 [IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]