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Desapropriação de terras desaba e número de famílias assentadas cai pela metade em 2007

Ritmo mais lento – Ministro diz que prioridade agora é a qualidade, não a quantidade, com mais créditos e gastos com infra-estrutura. Por Ullisses Campbell, da equipe do Correio, Correio Braziliense, 11/01/2008

Um balanço feito pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário mostra que o governo assentou no ano passado 50% a menos de famílias no campo, em comparação com o ano anterior. No mesmo período, também houve uma queda de 60% no volume de terras desapropriadas para assentamentos. Por outro lado, o levantamento revela que o volume de recursos aplicados na qualificação da reforma agrária, como infra-estrutura, crédito de apoio e fomento, aumentou 13,6% de 2006 (quando foram investidos R$ 1,081 bilhão) para 2007, quando o gasto chegou a R$ 1,229 bilhão. Para 2008, a previsão é de que o governo invista R$ 1,7 bilhão em crédito e infra-estrutura nos assentamentos.

Segundo o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, a decisão de investir na qualificação dos assentamentos é do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “Não estamos interessados em quantidade e, sim, em qualidade. Por isso assentamos bem menos em 2007”, justificou. Em 2007, segundo dados do ministério, foram assentadas no campo 70 mil famílias, contra 136,3 mil no ano anterior. Como contraposição à queda no número de assentados, Cassel diz que o Ministério do Desenvolvimento Agrário investiu no ano passado o maior volume financeiro em todos os tempos: R$ 4,1 bilhões. Para este ano, estão previstos R$ 4,3 bilhões.

Para os movimentos sociais, o ideal seria que o governo conciliasse a quantidade de famílias assentadas com a tão falada “qualificação dos assentamentos”. Um dos coordenadores nacionais do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), José Batista de Oliveira, criticou o balanço da reforma agrária. “A queda do número de assentamentos e do volume de desapropriação de terras revela que a reforma agrária não é uma prioridade do presidente Lula. No Rio Grande do Sul, por exemplo, não foi criado qualquer assentamento novo no ano passado”, critica Batista.

O diretor de política agrária da Confederação dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Paulo Carallo, diz que o governo tem obrigação de qualificar os assentamentos, oferecendo infra-estrutura, estradas e créditos para o trabalhador iniciar a sua produção. No entanto, ele diz que o ideal seria conciliar o aumento no número de famílias assentadas com a qualificação dos assentamentos já existentes. “Há famílias que estão na beira da estrada há mais de 10 anos esperando por um lote. Ao priorizar a qualificação dos assentamentos, o governo acaba virando as costas para essas pessoas que não têm nada”, observa Carallo.

Chutes

Nem o governo, nem os movimentos sociais sabem exatamente quantas famílias estão acampadas em barracas à espera de inclusão no programa de reforma agrária. O Ministério do Desenvolvimento Agrário afirma que são cerca de 100 mil. O MST sustenta que são 150 mil. Já a Contag chuta 230 mil. Apesar de não divulgar a previsão de assentamentos para 2008, o ministro Guilherme Cassel avisa que a política de priorizar a qualidade dos assentamentos vai continuar neste ano. “A reforma agrária que vinha sendo feita no Brasil era criminosa. Há casos de assentamentos em que todas as famílias abandonaram os lotes porque não havia infra-estrutura mínima para se viver”, diz o ministro.

Apesar de ter reduzido pela metade o número de assentamentos, o governo teve que gastar mais dinheiro em 2007 com a aquisição de terras para fins de reforma agrária – não desapropriações, mas compras diretas, negociadas com proprietários que decidam vender suas fazendas. Em todo o ano passado, o Ministério do Desenvolvimento Agrário desembolsou R$ 1,4 bilhão na compra de terras escolhidas, R$ 1 bilhão a mais do que em 2006. Só em pagamentos de benfeitorias, o governo gastou R$ 168 milhões. “Hoje, a reforma agrária só é viável no país se o governo comprar terras. E o preço do lote varia de região para região. Na Amazônia, um hectare chega a custar R$ 200. Nos estados do Sul, onde a terra é bem mais cara, o hectare chega a ser adquirido por R$ 15 mil”, diz Cassel.

O diretor de política agrária da Contag, Paulo Carallo, discorda do método que o governo usa para adquirir terras. “Ao negociar a compra de terras com os latifundiários, o governo acaba pagando um preço bem mais alto do valor de mercado. O ideal é desapropriar, já que a maioria das áreas compradas é improdutiva”, diz Carallo. Segundo Cassel, não é bem assim. “O governo compra por preço de mercado. O problema é que uma desapropriação sempre vai parar na Justiça e leva anos para ser concluída, principalmente quando o dono da terra entra com recurso”, diz. “O maior problema é que o governo não pôs em prática o novo critério para determinar o que é terra produtiva e improdutiva. Se já tivesse feito isso, não estaria gastando dinheiro com obtenção de terras que, erroneamente, são chamadas de produtivas”, diz Carallo.

Há famílias que estão na beira da estrada há mais de 10 anos esperando por um lote. Ao priorizar a qualificação dos assentamentos, o governo acaba virando as costas para essas pessoas que não têm nada – Paulo Carallo, diretor de política agrária da Confederação dos Trabalhadores na Agricultura (Contag)