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Artigo

Ao vencedor as batatas, por Mayron Régis

[EcoDebate] A ironia retoca o clamor da alma que por anos a fio se esvaiu em pretensões de que o seu principal mérito seria despistar da opinião pública sobre a fraqueza dos debates político-sociais que desfilam nas passarelas da mídia ou que assinam em baixo, pela enésima vez, o teor da entrevista de algum programa jornalístico.

A célebre frase de Machado de Assis em Quincas Borba “Ao vencedor as batatas” deveria prescrever os noticiários políticos ou programas de entrevistas, os quais, em sua totalidade, rebentam pertinazes em suas capas de mordacidade, imparcialidade, objetividade e transparência, para em seguida embotarem em textos que despencam por sua flacidez ou que tremem nas bases ao menor sopro vindo de outros textos, pois os formadores de opinião, ao final do noticiário ou da entrevista, ungem vencedores e vencidos como se meros minutos ou meras páginas referendassem ou não uma determinada política setorial.

Nem lendo toda a obra de Machado de Assis, e deveríamos ler, por certo, ficaríamos imunes á sensação que o jornalista e o entrevistado encenam uma peça de texto medíocre ou de texto apodrecido que de tantas veiculações enlanguesce o leitor ou o espectador em sua capacidade de discernimento do que vem a ser o real e o que vem a ser puro marketing.

Deveríamos torcer, então, para que dos pólos midiáticos soprassem notas mais melodiosas e mais harmoniosas com relação à cultura e ao tempo em vez das notas desprovidas de qualquer historicidade que eles se habituaram a soprar? A pergunta antecede a desilusão, por assim dizer, mas após tantas noites de sono perdido para fechar a edição do jornal seria no mínimo frustrante para os seus leitores fiéis que os últimos bastiões de um jornalismo responsável se rendessem em troca de algumas batatas. Aqui como acolá, ou neste texto como no de Machado de Assis, o desembolso pela vitória se reverte em altíssimos custos sociais, políticos e ambientais e assim quem vence hoje pode perder amanhã e arcar com prejuízos muito acima da sua capacidade.

Na ordem do dia, movimenta-se financeiramente de uma conta para outra e manejam-se recursos para cumprir compromissos financeiros com instituições financeiras. Os dados dessa movimentação e desse manejo vão constar em algum documento particular ou governamental como forma de ilustrar onde foi gasto aquele dinheiro, quase uma prestação de contas, entretanto sob a fachada fria dos números se esquentam transferências ilegais para o exterior ou o remanejar de recursos de áreas prioritárias como a saúde, a educação e o meio ambiente para o pagamento de dívidas. Rivalizando por vendas e por publicidade, a mídia só bate a porta de matérias investigativas que problematizem a realidade quando a problematização serve aos seus propósitos e a propósitos de grupos que a financiam.

Os que financiam a mídia cobram fidelidade assim como a reciprocidade é verdadeira. Cobrando-se mutuamente, esses setores impedem a fuga e o choque de informações a fim que a oligopolização da mídia e a subserviência do Estado para com os oligopólios seja amplamente consentida. A oligopolização de setores da economia, como a mídia, fratura qualquer possibilidade de compromisso da parte do Estado para com os anseios da sociedade e obriga a sociedade a queimar etapas no seu processo de amadurecimento.

Num quadro geral de grave crise ambiental e energética, a propalada solução agrocombustíveis e a retomada da solução nuclear, para o Brasil e para o mundo, que se agarraram num frescor de recém-conversão ao ideário sócio-ambientalista, esbarram em suas próprias limitações físicas e tecnológicas, de área e de destinação final dos resíduos, e por mais “ínfimos” que sejam os limites, ao serem transpostos de forma inconseqüente, eles crescem em tamanho e em forma. Seduz a forma de pensar, difundida desde a revolução industrial, na qual tecnologias de produção e de transporte reduziriam as desigualdades humanas e abririam as portas para a felicidade mundial. Eis que um desalmado confere a seguinte questão: da onde vai sair água para produzir tanta energia?

Mayron Régis, jornalista Fórum Carajás, é colaborador e articulista do EcoDebate