EcoDebate

Plataforma de informação, artigos e notícias sobre temas socioambientais

Notícia

TCU: Íntegra do Relatório de Auditoria Operacional do Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional

Identificação: Acórdão 2017/2006 – Plenário
Número Interno do Documento: AC-2017-44/06-P
Grupo/Classe/Colegiado: Grupo I / Classe V / Plenário
Processo: 019.081/2005-4
Natureza: Auditoria Operacional.
Entidade: Entidade: Ministério da Integração Nacional.
Interessados: Interessado: Tribunal de Contas da União.

Sumário

RELATÓRIO DE AUDITORIA OPERACIONAL. PROJETO DE INTEGRAÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO COM BACIAS HIDROGRÁFICAS DO NORDESTE SETENTRIONAL. AVALIAÇÃO DAS PERSPECTIVAS DE CUMPRIMENTO DOS OBJETIVOS DO PROJETO. IDENTIFICAÇÃO DE AMEAÇAS E OPORTUNIDADES DE MELHORIA. RECOMENDAÇÕES AO MINISTÉRIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL, À AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS (ANA) E AO IBAMA. MONITORAMENTO.

Assunto
Relatório de Auditoria.

Ministro Relator
BENJAMIN ZYMLER

Unidade Técnica
SECEX-4 – 4ª Secretaria de Controle Externo

Relatório do Ministro Relator

Transcrevo, em seguida, trechos do Relatório de Auditoria Operacional elaborados pelo Srs. Analistas Mauro Ferreira do Sacramento, Henrique Lopes de Carvalho e Fábio Henrique Granja e Barros:

“(…)

I. INTRODUÇÃO

… a presente fiscalização, fruto do Acórdão n.º 879/2005- Plenário, é uma auditoria de natureza operacional que investigará, primordialmente, duas questões:

I – Em que medida o Projeto de Integração do Rio São Francisco com bacias hidrográficas do Nordeste Setentrional permitirá reduzir os impactos sociais e os gastos públicos decorrentes do flagelo da seca?

II – A gestão da água, ou seja, as medidas estruturais e não-estruturais para controlar os sistemas hídricos nos estados beneficiados, permitirá o atingimento dos objetivos propostos no Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional?

6. A relevância da fiscalização está não apenas na materialidade do Projeto, aproximadamente R$ 4,5 bilhões de reais, mas também no fato de que muitas ações dos governos no semi-árido foram marcadas por insucesso. Nesse sentido, destaca-se que o drama das secas tem uma longa história: o primeiro registro da ocorrência de seca nos documentos portugueses é de 1552 e o problema pouco se modificou. Para se ter idéia do problema ainda existente, segundo o historiador Marco Antônio Villa, somente a seca de 1980 atingiu, econômica e socialmente, uma população de aproximadamente 24 milhões de pessoas.

7. Quanto à oportunidade da auditoria, ressalta-se que a identificação das ameaças e riscos para o PISF permitirão que as medidas sejam tomadas pari passu à construção do empreendimento, contribuindo para que o mesmo ofereça, quando do início da operação, os benefícios ressaltados pelo Governo Federal.

II. VISÃO GERAL DO OBJETO DA AUDITORIA

8. A Unidade responsável pela implementação do Projeto no Ministério da Integração Nacional é a Secretaria de Infra-Estrutura Hídrica. De acordo com o Decreto 4.649, de 27/3/2003, a Secretaria é composta de dois departamentos: Desenvolvimento Hidroagrícola e Obras Hídricas, e têm a competência de, entre outras, orientar e supervisionar a formulação de planos, programas e projetos de aproveitamento de recursos hídricos.

9. O Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional consiste num empreendimento de infra-estrutura hídrica composto por seis trechos de canais que formam dois sistemas independentes, denominados eixos Norte e Leste. O objetivo é integrar reservatórios do Rio São Francisco a rios e açudes do nordeste setentrional para promover a segurança hídrica da população dessa região semi-árida.

10. O Eixo Norte captará água do Reservatório de Sobradinho, no município de Cabrobó, (PE) e está dimensionado para transpor um volume médio de 42,5m3/s e máximo de 99m3/s. Para isso, estão previstos 402 km de canais artificiais divididos em cinco trechos, 4 estações de bombeamento, 22 aquedutos, 6 túneis, 26 reservatórios de pequeno porte, além de duas pequenas centrais hidrelétricas com 40MW e 12MW respectivamente. Para se chegar aos pontos receptores nos Estados de Pernambuco, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte terão de ser superados desníveis de até 165m.

11. O Eixo Leste captará água do Reservatório de Itaparica (PE) e está dimensionado para transpor um volume médio de 18,3m3/s e máximo de 28m3/s. Para isso, estão previstos 220 km de canais artificiais em trecho único, 5 estações de bombeamento, 5 aquedutos, 2 túneis e 9 reservatórios de pequeno porte. Para se chegar aos pontos receptores nos Estados de Pernambuco e Paraíba terão de ser superados desníveis de até 304m.

12. Dessa forma, os canais conduzirão a água aos açudes e rios da região, onde serão percorridos mais 510 km em leito natural. Entretanto, para possibilitar a segurança hídrica da população deverão ser assegurados mecanismos de gestão eficientes que permitam a captação, manutenção e distribuição nos estados receptores.

13. Portanto, a gestão hídrica nos estados receptores é fator determinante para o sucesso do empreendimento. Nesse sentido, na busca da sustentabilidade administrativa e institucional do Projeto será criado o Sistema de Gestão da Integração das Águas do São Francisco com as Bacias do Nordeste Setentrional – SGIB.

14. Esse sistema será integrado pela Operadora Federal (CHESF-Água) e pelas entidades gestoras estaduais com responsabilidades na gestão da infra-estrutura hídrica e conduzido por um Conselho Gestor. O Conselho será o órgão deliberativo máximo e deve ser composto pelo MI, MME, MMA e pelos Estados da Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Ceará.

15. No âmbito do SGIB, existirá um instrumento de ajuste contratual entre as partes, denominado de Plano de Gestão Anual. Esse Plano disporá sobre:

– a repartição das vazões disponibilizadas entre os estados e o rateio dos custos respectivos;

– os instrumentos de gestão a serem disponibilizados;

– as tarifas a serem praticadas;

– os mecanismos de pagamento das tarifas e as garantias de ressarcimento à entidade operadora federal;

– a sistemática de operacionalização do leilão para alocação da vazão não-contratada;

– as metas a serem cumpridas e os respectivos incentivos e penalidades;

– os programas que induzam ao uso eficiente e racional dos recursos hídricos.

III. OBJETIVOS

16. O principal propósito da fiscalização é o de avaliar se os objetivos do Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional serão alcançados, identificando os pontos que podem ser considerados riscos, as ameaças, as oportunidades e as medidas que devem ser tomadas para garantir os benefícios do Projeto.

17. Nesse sentido, identificaram-se algumas medidas necessárias para o alcance dos objetivos previstos, buscando aquelas que possam potencializar os benefícios do Projeto. A importância da fiscalização está no fato de que muitos problemas que foram identificados exigem resolução de conflitos, liderança política e intensa capacidade técnica e gerencial, isto é, têm um prazo longo para serem executadas e passarem a fazer efeito. Exemplo disso, é o Estado do Ceará, que atualmente tem o melhor sistema de gestão hídrica entre os estados beneficiados. Contudo, para chegar ao estágio em que se encontra iniciou sua reestruturação em 1992.

IV. METODOLOGIA E LIMITAÇÕES

18. O presente trabalho utilizou-se da metodologia relativa a auditorias de natureza operacional atualmente adotada pelo Tribunal de Contas da União e aceita em diversos outros países do mundo, inclusive pelas demais Entidades de Fiscalização Superior (EFS) participantes da Intosai e Olacefs.

19. Ainda na fase de levantamento, TC n.º 007.815/2005-0, foram utilizadas as análises denominadas: STAKEHOLDERS(1) , SWOT(2) e Análise de Risco. Esses estudos permitiram a precisa delimitação do tema a ser auditado, bem como o planejamento da etapa de auditoria voltada para a consecução dos objetivos inicialmente propostos.

——————–

(1) Técnica de diagnóstico usado para identificar forças, fraquezas, oportunidades e desafios do objeto analisado.

(2) Técnica de diagnóstico utilizada para identificar os atores, suas influências e seus interesses para com o Projeto.

——————–

20. Durante a etapa de auditoria, foram realizadas viagens aos quatro estados beneficiários do Projeto de Integração do Rio São Francisco, onde foi possível observar, in loco, a infra-estrutura de captação, tratamento e distribuição de água nas regiões a serem beneficiadas. Além disso, estudou-se a organização administrativa das agências de água e secretarias de recursos hídricos em cada uma das capitais estaduais visitadas, bem como as medidas utilizadas para amenizar a convivência da população local com a seca, em diversos municípios participantes do PISF.

21. Aplicou-se, ainda, questionários aos órgãos estaduais responsáveis pela gestão de recursos hídricos, contendo informações sobre a infra-estrutura física, bem como medidas não-estruturais, visando identificar a real capacidade desses entes federativos de gerir as águas provenientes do São Francisco.

22. Ademais, foram enviados questionários aos 391 municípios a serem beneficiados pelo PISF, visando obter uma visão mais próxima das demandas relativas aos recursos hídricos na região. Buscou-se, assim, uma observação não limitada à necessidade de água, mas também, aos desafios da gestão de recursos hídricos, incluindo a necessidade de obras complementares para o maior alcance da população em decorrência do PISF. Houve a resposta de 103 municípios, o que foi considerada uma amostra significativa do universo dos municípios beneficiados, ou seja, 26% do total. Ademais, observou-se a existência de representatividade na amostra haja vista a manutenção da proporcionalidade quanto ao número de respostas provenientes dos municípios em cada estado beneficiário.

23. Durante esse trabalho de auditoria, também foram analisados diversos documentos disponibilizados pela Agência Nacional de Águas, Ministério da Integração Nacional, Defesa Civil, Secretaria de Recursos Hídricos e Ibama, relativos aos processos de concessão de licenciamento ambiental, outorga de uso de recursos hídricos e do Certificado de Avaliação da Sustentabilidade da Obra Hídrica (CERTOH), enfim, todo o processo legal envolvendo as informações técnicas diretamente relacionadas com o Projeto.

24. Assim, tanto a análise de documentos quanto a aplicação de entrevistas e questionários, além das visitas às áreas a serem beneficiadas pelo PISF contribuíram para o alcance dos resultados aqui dispostos, possibilitando uma visão mais ampla e realista sobre a importância, abrangência, necessidade e custos do Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional.

V. ACHADOS DE AUDITORIA

QUESTÃO 1 – Em que medida o Projeto de Integração do Rio São Francisco com bacias hidrográficas do Nordeste Setentrional permitirá reduzir os impactos sociais e os gastos públicos decorrentes do flagelo da seca?

Considerações iniciais

25. Dentre as questões relativas ao Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional talvez aquela que mais desperte interesse por parte da população e dos órgãos governamentais é a relação custo/benefício da obra.

26. Essa relação custo/beneficio está intrinsecamente ligada à justificativa do Projeto, sendo, portanto, objeto pleno de análise por parte desta Corte de Contas. Nesse sentido a Constituição Federal atribui ao Controle Externo, o seguinte dever, nos termos do seu art. 70, in verbis:

“Art. 70.(3) A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.” (grifo nosso)

——————–

(3) Alterado pela Emenda Constitucional no 19/98.

——————–

27. Assim, a análise da economicidade do PISF demanda, por parte do TCU, o entendimento dessa relação custo/benefício, sendo necessário, para tanto, comparar a abrangência do PISF, que poderia ser caracterizada pela população beneficiada, em sua relação com os custos totais da Integração.

28. Como ponto de partida, visando identificar a população beneficiada e os custos do Projeto, devemos considerar os dados disponibilizados pelo Governo Federal, principalmente aqueles divulgados pelo Ministério da Integração Nacional, responsável pela coordenação do PISF.

29. Assim, observou-se que no sítio: www.mi.gov.br/saofrancisco/perguntas/index.asp pertencente ao Ministério da Integração Nacional, existe um espaço denominado: “Perguntas e Respostas sobre a Integração do Rio São Francisco às Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional”. Nesse espaço destinado a esclarecer a população sobre o PISF, o Ministério apresentou as seguintes informações:

30. Quanto à abrangência do Projeto:

“5 – Quantas pessoas serão diretamente beneficiadas pela integração das bacias?

A população residente na área beneficiada pelos dois eixos da transposição é de 12 milhões de habitantes, sendo cerca de 5,5 milhões no Eixo Norte e 3,5 milhões no Eixo Leste. O total representa 30% da população do Polígono das Secas, sendo 50% maior que a população residente na bacia do São Francisco dentro do Polígono. ”

31. Quanto ao custo total da obra:

“13 – Qual é o custo total do Projeto?

A obra tem custo estimado em cerca de R$ 4,5 bilhões. Eqüivale ao custo de algumas hidrelétricas e gasodutos já construídos e/ou previstos no país. ”

32. Portanto, partindo dos dados inicialmente disponibilizados pelo Ministério da Integração Nacional, desenvolveremos uma análise comparativa com outros dados obtidos junto ao próprio Governo Federal, além dos estados e municípios a serem beneficiados com o PISF, para concluirmos qual será a real abrangência do Projeto e os custos envolvidos no intuito de atender à população da região.

Subquestão 1.1 – Onde está distribuída a população que será atendida pelo Projeto.

33. Achado 1 – A população diretamente atendida pelo PISF será menor que aquela divulgada pelo Governo Federal.

34. Inicialmente, destaca-se que o PISF, apesar de ter sido tratado como Projeto capaz de levar água a 12 milhões de habitantes a um custo estimado em cerca de R$ 4,5 bilhões, não considerou, para a obtenção desse número de beneficiários, a existência ou não de redes de captação, tratamento e distribuição de água para a população desses municípios supostamente beneficiados.

36. Destaca-se que, também, não foi considerado, no custo da obras, os valores a serem gastos com essa infra-estrutura complementar. Assim, não obstante o fato de existir um capítulo que tratará especificamente das questões relativas aos custos, no presente ponto, abordaremos apenas a relação investimento/abrangência do PISF.

37. Como se poderá observar, as informações apresentadas de forma incompleta tendem a levar o leitor a concluir que com um custo de 4,5 bilhões de reais será possível alcançar a população de 12 milhões de pessoas, o que não é realidade (Anexo I, fls. 1, mapa 1).

38. Nesse sentido, o próprio Ministério da Integração Nacional, ao responder a 3ª diligência da ANA, durante o processo de concessão da outorga (Oficio 373/2005 – MI, Anexo II, fls. 132 a 144), afirmou que apenas 86 dos 391 municípios a serem beneficiados pelo PISF já detém sistemas de adução para utilização das águas provenientes da integração do Rio São Francisco.

39. Ou seja, se o Projeto estivesse pronto hoje, somente 22% dos municípios a serem beneficiados teriam capacidade de aduzir a água proveniente do PISF (Anexo I, fls. 1, mapa nº 2). Adicionalmente, constatou-se que a capacidade de atendimento da população, bem como a necessidade de investimentos adicionais, nos quase 80% dos municípios que ainda não detém infra-estrutura para captar, tratar e distribuir a água proveniente do Rio São Francisco pode variar bastante.

40. Fortaleza-CE, por exemplo, é um município que já detém um projeto em estágio avançado para a interligação do açude Castanhão à Região Metropolitana por intermédio do canal da Integração. Nessa cidade, certamente, seria possível aproveitar a água proveniente do PISF, por intermédio da estrutura que atualmente está sendo construída.

41. Já no caso dos municípios de Monteiro, Sumé e Congo, localizados no interior da Paraíba, constatou-se, durante a visita realizada à região, que a atual adutora (do Congo), que retira água do açude Cordeiro, deverá sofrer alterações para poder buscar água no Açude Poções e, assim, beneficiar a população da região com a água do Rio São Francisco.

42, Em diversos outros municípios, principalmente em Pernambuco, sequer existe um sistema adutor planejado para atender à demanda decorrente da Integração do Rio São Francisco. Nesses casos, será necessário um aporte de recursos considerável para que os municípios contabilizados como diretamente beneficiados, por parte do Governo Federal, venham a ser capazes de utilizar os recursos hídricos decorrentes do PISF.

43. Portanto, percebe-se que a ausência de infra-estrutura de captação, tratamento e distribuição de água nos municípios beneficiários do Projeto constitui-se em um grande fator limitador para a abrangência do mesmo. Logo, sem o aporte de recursos complementares, não previstos entre os R$ 4,5 bilhões inicialmente orçados, não será possível atingir o total 12 milhões de pessoas, uma vez que esse valor não contempla as obras suplementares necessárias, que podem onerar, em muito, o Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional.

A Visão dos municípios a serem beneficiados pelo PISF

44. Com o objetivo de analisar a questão da abrangência da população beneficiada e dos custos totais da obra, sob a ótica dos municípios a serem beneficiados, conforme apresentado na metodologia, foram realizadas visitas aos estados beneficiários do PISF. Adicionalmente, foram enviados questionários aos 391 municípios que seriam, segundo o Ministério da Integração Nacional, beneficiados pelo Projeto.

45. Nesse sentido, obteve-se mais de 26% de retorno, durante o período estipulado para a análise de respostas, além de diversas outras respostas intempestivas. Destaca-se a representatividade dessas respostas, pois, além de abarcarem mais de 1/4 dos municípios abrangidos pelo PISF, estão bem distribuídas entre os estados participantes.

46. Assim, dentre as respostas, algumas chamam a atenção por revelarem informações importantes e, de certo modo, surpreendentes, se comparadas àquelas disponibilizadas pelo Governo Federal, no que se refere à abrangência do PISF, conforme a seguir destacado.

47. Observou-se que mais de 20 % dos municípios que responderam ao questionário afirmam que não terão nenhum benefício com o Projeto, sendo que, em alguns casos, o representante do município declarou que ele não pertence à área geográfica de abrangência do PISF.

48. A constatação em questão, decorrente das respostas obtidas dos questionários enviados aos municípios, causou uma certa estranheza, pois os municípios em questão estão listados, pelo Ministério da Integração Nacional, como beneficiários dos PISF (Oficio 373/2005 – MI, Anexo II, fls. 132 a 144).

49. Nesse grupo, a título exemplificativo, destacamos algumas respostas recebidas por municípios que afirmam não ter nenhuma parcela da população a ser atendida pelo PISF, tais como: Correntes – PE, São Vicente Ferrer – PE, Machados – PE, Ouricuri – PE, Sairé – PE, Coxixola – PB, Sobrado – PB, Frei Martinho – PB, Nova Palmeira – PB, Poço Dantas – PB, Upanema – RN, Antônio Martins – RN, Assú – RN, Granjeiro – CE, entre outros.

50. Assim, a simples existência de municípios que, ainda que estejam listados entre aqueles a serem diretamente beneficiados pelo Projeto de Integração, não reconhecem essa condição, denota a inexistência de comunicação e concordância entre o Governo Federal e esses municípios supostamente beneficiados.

51. Dentre essas respostas recebidas, podemos destacar a do município de Granjeiro – CE, onde o “chefe da Secretaria de Agricultura” afirma que “o município fica a 86 Km por onde vai passar as águas da transposição” (sic). Portanto, conclui-se que se alguma obra complementar tende a beneficiar esse município, levando a água do Projeto até a sede municipal, certamente os seus representantes não têm conhecimento desse fato.

52. Outra reposta instigadora foi apresentada pelo município de Sairé – PE, tendo o Secretário de Administração da prefeitura afirmado que: “O município de Sairé é rico em água e não será afetado pela transposição (sic)”. Ou seja, pelo que se pode observar, não obstante o fato de estar listado entre os municípios a serem diretamente beneficiados, Sairé – PE aparenta não necessitar da água proveniente do PISF, possivelmente por ter alguma fonte de recursos hídricos disponível em abundância.

53. Finalmente, destacamos que até mesmo municípios que supostamente já deteriam infra-estrutura para captar, tratar e distribuir água, segundo informações do próprio Ministério da Integração Nacional (Oficio 373/2005), ainda consideram-se não beneficiados pelo PISF, como é o caso dos municípios de Ouricuri – PE e Sobrado – PB, listados pelo MI como já detentores dessa infra-estrutura, tendo porém respondido o questionário como não sendo beneficiários do Projeto de Integração do São Francisco.

54. Em conclusão, essa interpretação, por parte dos municípios supostamente beneficiados, causa grande preocupação no que se refere à abrangência do PISF. Quer em função de uma falta de esclarecimento, quer pela declarada desnecessidade de água, em função da abundância de outros recursos hídricos disponíveis na região, restou caracterizada uma dissonância entre as informações disponibilizadas pelo Governo Federal em relação àquela advinda das regiões a serem beneficiadas; supostamente, os maiores interessados no Projeto.

55. Detectou-se, ainda que dentre os municípios que responderam à questão n.º 4 do questionário, relativa à abrangência do PISF, aproximadamente 61% das prefeituras informaram que somente parcela da população inferior a 60% dos habitantes seria beneficiada pelo Projeto. Ademais, apenas 15% das respostas afirmavam que mais de 90% da população municipal seria beneficiada.

56. Como se pode perceber, não obstante o fato de que alguns municípios considerarem-se não abrangidos pelo PISF, conforme identificado no achado anterior, mesmo dentre aquelas prefeituras que entendem que serão beneficiados, muitas afirmam que um parcela pequena da população terá acesso à água proveniente do Projeto.

57. Portanto, ainda que um determinado município entenda que será abrangido pelo PISF, em muitos casos, essa abrangência estará restrita a uma pequena parte de sua população. Assim, para que se entenda o alcance do Projeto é necessário analisar com profundidade sua abrangência dentro de cada município participante, considerando as circunstâncias que poderiam limitar os benefícios do PISF.

58. Dessa forma, não bastaria uma simples somatória da população urbana da região, aplicada à uma projeção de número de habitantes para o ano de 2025, para que se obtenha o número real de habitantes beneficiados. Um estudo que envolva a participação dos municípios beneficiários se faz necessário para delimitar a abrangência real do Projeto.

59. Portanto, um entendimento realista sobre o alcance do PISF, passa, necessariamente, pela compreensão das peculiaridades de cada município beneficiado, sendo condição sine qua non para que se proceda um planejamento estratégico coerente sobre a utilização dos recursos hídricos provenientes do Projeto.

60. Além disso, observou-se que, em resposta à questão n.º 6 do questionário enviado aos municípios, relativa à existência de infra-estrutura para utilização do água do Projeto de Integração do Rio São Francisco, observou-se que aproximadamente 56% dos municípios que responderam à questão informaram que não detêm, ainda, infra-estrutura suficiente para aproveitar a água proveniente do PISF.

61. Essa última constatação demonstra que, ainda que o município considere-se possível beneficiário do Projeto de Integração, não há garantias de que a sua população venha a receber a água proveniente do PISF, tendo em vista a ausência de infra-estrutura apropriada para captar, tratar e distribuir água para o usuário final.

62. Assim, observa-se que a presente constatação é bastante para concluir que somente com a existência de obras complementares seria possível abranger a população que habita os municípios listados entre os supostamente beneficiados pelo PISF.

63. Por outro lado, a mesma conclusão implica dizer que a população a ser beneficiada pelo PISF, com o investimento inicialmente previsto (R$ 4,5 bilhões), será menor que aquela inicialmente indicada pelo Governo Federal (12 milhões de habitantes).

A Visão dos Estados Beneficiários do PISF

64. Da análise dos questionários respondidos pelos governos estaduais beneficiados pelo PISF (Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte), observou-se que esses também afirmam que apenas parte dos municípios listados pelo Ministério da Integração Nacional serão beneficiados pelo Projeto de Integração do Rio São Francisco.

65. Primeiramente, destacamos a resposta à questão n.º 3 do questionário dos estados onde se perguntou: “Qual a parcela da população estimada do Estado que vive no semi-árido e será beneficiada pelo Projeto?”.

66. Em resposta, a Paraíba afirmou que a população estimada a ser beneficiada é de 1.733.655 habitantes (Anexo I, fls. 98), o Ceará respondeu que a população é de 3.171.728 de habitantes (Anexo I, fls. 166), o Rio Grande do Norte afirmou que a população beneficiada pelo PISF será de 1.091.936 habitantes (Anexo II, fls. 02) e, finalmente, Pernambuco informou que a população diretamente beneficiada atingirá 1.034.313,00 habitantes (Anexo I, fls. 56).

67. Logo, segundo as respostas obtidas, a soma de pessoas a serem beneficiadas dentro do semi-árido seria de 7.031.632 habitantes, ou seja, diferente daquela apontada pelo Governo Federal estimada em 9.075.472 habitantes, com projeção de 11.685.147 para 2025 (NT 390/2005/SOC, tabela – 8, fls. Anexo II, fls. 94).

68. Dentre as respostas recebidas, destaca-se, ainda, aquela apresentada pelo Estado de Pernambuco, que afirmou que somente 30 municípios são beneficiados pelo PISF (Anexo II, fls.56). Além desses municípios a serem “diretamente beneficiados” o Estado entende que outros 72 municípios seriam “indiretamente beneficiados” (Anexo II, fls.57/58).

69. Nesse sentido, cabe destacar que o Governo Federal apontou que 113 municípios pernambucanos seriam diretamente beneficiados pelo Projeto de Integração do Rio São Francisco, ou seja, 83 municípios a mais que o respondido pelo Governo do Estado de Pernambuco (Oficio 373/2005 – MI, Anexo II, fls. 132 a 144).

70. Já o Estado do Rio Grande do Norte informou que apenas 91 municípios seriam beneficiados pelo PISF (Anexo II, fls. 07). Um número que também não é igual ao informado pelo Governo Federal durante o processo de outorga, ou seja, 94 municípios (Ofício 373/2005 – MI).

71. No mesmo sentido, o Ceará informou que 26 dos seus municípios serão diretamente beneficiados pelo Projeto de Integração do Rio São Francisco (Anexo I, fls. 166/167) enquanto o Ministério da Integração Nacional afirmou, em resposta a questionamentos dessa equipe de auditoria, que o Estado teria 56 municípios diretamente beneficiados (Ofício 373/2005 – MI).

72. Finalmente, o Estado da Paraíba informou que 141 municípios aproveitarão as águas do Projeto (Anexo I, fls. 107/110), sendo que o Governo Federal informou que somente 127 municípios do Estado seriam beneficiados com o Projeto de Integração do Rio São Francisco. Nesse caso, seriam mais municípios que o número indicado pelo Governo Federal.

73. Outro dado relevante é que os estados consultados, sem exceção, afirmam ser necessário um aporte de recursos complementares para viabilizar o alcance da sua população com as águas advindas do PISF.

74. É o caso do Estado de Pernambuco, que, além de apresentar uma lista de municípios a serem beneficiados bem menor que aquela divulgada pelo Governo Federal, afirma, em resposta à questão n.º 5, que o “Estado de Pernambuco só será efetivamente beneficiado após a conclusão das obras complementares previstas nas negociações entre o Governo do Estado e a União”(Anexo II, fls. 58).

75. Destaca-se que os outros estados beneficiários também afirmam ser necessário a implementação de obras complementares para que as águas da transposição possam atender a população pretendida, sendo que, em muitas dessas obras, é considerada a necessidade de participação federal por intermédio de financiamento público.

76. Portanto, a grande divergência entre as informações apresentadas pelo Ministério da Integração Nacional e aquelas obtidas diretamente com os estados e municípios denota uma falha de comunicação, falta de planejamento conjunto e desconhecimento da necessidade de investimentos complementares, o que pode implicar em uma menor população a ser abrangida pelo PISF.

77. Logo, a conclusão de que 12 milhões de pessoas seriam beneficiadas com os 4,5 bilhões de reais a serem investidos no PISF até o ano de 2025 apresenta-se equivocada, não estando fundamentada em dados passíveis de comprovação, nem mesmo tendo sido considerada a visão compartilhada pelos governos locais.

78. Conclui-se que a abrangência real do PISF é incerta e não alcançará a população de 12 milhões de habitantes, no ano de 2025, a não ser que medidas complementares sejam tomadas, por parte do Governo Federal e dos estados e municípios participantes, visando possibilitar a criação de uma infra-estrutura de captação, tratamento e distribuição de água, capaz de atender as populações na região do semi-árido.

Recomendação

79. Que o Ministério da Integração Nacional providencie uma avaliação, juntamente com estados e municípios, sobre o real alcance populacional do Projeto bem como sobre a previsão do prazo necessário para que se alcance a população inicialmente projetada.

Benefícios Esperados

80. Promover entendimento real do alcance do Projeto e garantir um planejamento estratégico do uso da água. Envolver os estados e municípios beneficiados na discussão do PISF.

Subquestão 1.2 – Qual a redução percentual dos custos com ações emergenciais que será alcançada com o Projeto?

81. Achado 2 – Não há garantias de que a redução de custos do Governo Federal com ações emergenciais de combate à seca no Nordeste será proporcional aos recursos despendidos para a implementação do PISF, conforme consta do Rima.

82. Durante a auditoria constatou-se que as ações emergenciais de combate à seca estão concentradas no auxílio a populações dispersas que, dificilmente, serão beneficiadas com a transposição.

83. É importante destacar que, conforme a NT 390 /2005 – tabela – 8 (Anexo II, fls. 94) do Ministério da Integração Nacional, a população atualmente residente na área a ser beneficiada pelo Projeto de Integração do Rio São Francisco é de aproximadamente 9 milhões de pessoas.

84. Apesar das informações obtidas indicarem que a abrangência do PISF será bem menor que a esperada, se considerarmos o número de 9 milhões de habitantes, este representa apenas 23% da população que atualmente ocupa o “polígono das secas”(4) , ou seja, aquela população que é a maior beneficiada com ações emergenciais de combate à seca.

——————–

(4) Ministério da Integração Nacional, Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, Região Nordeste do Brasil em Números, Recife, Maio de 2003.

——————–

85. Assim, ainda que o PISF tivesse a capacidade de abranger a população inicialmente proposta, verificou-se que quase 80% da população residente no “polígono das secas”, maior beneficiária dos programas governamentais de caráter emergencial de combate à seca, continuaria a necessitar desses benefícios.

86. Outra informação importante, ainda de acordo com a NT 390/2005 – (item 58, Anexo II, fls. 92), é que o objetivo do PISF é abranger a população na área de 10 km em volta dos eixos do Projeto, bem como as populações urbanas com mais de 50 mil hab. até 50 km dos canais. Nesse sentido, destaca-se que, segundo Censo IBGE 2000, apenas 19 dos 391 municípios a serem beneficiados detém população urbana maior que 50 mil habitantes, ou seja, menos de 5% deles.

87. Assim, segundo o preceito de abrangência do PISF, disposto na NT 390/2005, boa parte da população do semi-árido, nos municípios supostamente atendidos pelo Projeto, não seria beneficiada por não estar a menos de 10 km dos eixos, bem como por não compor uma aglomeração urbana com mais de 50 mil habitantes em áreas localizadas até 50 km desses cursos de água.

88. Logo, justamente a população rural ou aquela que compõe pequenas sedes municipais, somente seria abrangida pelo PISF se estivesse localizada até 10 km de distância dos trechos onde a água passaria.

89. Finalmente, destaca-se que nem mesmo a população supostamente beneficiada pelo PISF, segundo o Ministério da Integração Nacional (NT 390/2005), será garantidamente alcançada. Essa percepção pode ser obtida com uma simples análise das respostas de estados e municípios sobre a abrangência do Projeto, o que já foi comentado, bem como pela falta de garantia de recursos para obras complementares na região.

90. Portanto, uma conclusão se faz inevitável: se não existe uma percepção correta da abrangência do PISF, nem mesmo uma garantia de atendimento da população inicialmente proposta, qualquer estipulação de valores a serem economizados em decorrência do Projeto de Integração, relativos a medidas emergenciais de combate à seca, é mera especulação.

91. Assim, a análise da diminuição de custos relativos a medidas emergenciais de combate à seca, só será possível após a identificação precisa de qual população será beneficiada pelo PISF, bem como as medidas emergenciais que deverão ser mantidas, o que, ainda, não ocorreu.

92. Em conclusão, devido à ausência de concordância sobre a real abrangência do Projeto, associada à inexistência de estudos sobre sua relação com a diminuição de custos de medidas emergenciais de combate à seca, não será possível garantir que o montante de redução de custos do Governo Federal com tais medidas será proporcional ao dispêndios decorrentes da implementação do Projeto de Integração do Rio São Francisco, como o MI afirmou no Relatório de Impacto Ambiental (RIMA).

93. Nesse sentido, é preciso que o PISF seja um instrumento potencializador das ações de convivência com a seca no semi-árido, isto é, permita a coordenação de ações de abastecimento para centros urbanos e para pequenas aglomerações de população difusa. Para isso, é necessário, entre outras coisas, integrá-lo com programas de convivência com a seca, como, por exemplo, o Programa de Suprimento de Água para Populações Rurais e Urbanas; e o Programa de Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Semi-Árido – Conviver.

Recomendações

94. Que o Ministério da Integração Nacional realize estudos demonstrando a correlação entre os gastos de programas de ações emergenciais de combate à seca e sua diminuição decorrente da implementação do PISF.

95. Que o Ministério da Integração Nacional elabore um Plano de Atividades que integre as ações do Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional com outros Programas do Governo Federal, como, por exemplo, o Programa de Suprimento de Água para Populações Rurais e Urbanas; e o Programa de Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Semi-Árido – Conviver.

Benefícios Esperados

96. Evidenciar uma correta medida do impacto do PISF sobre as pessoas residentes no Polígono das Secas e que continuamente sofrem as mazelas do flagelo das secas. Melhorar a integração das atividades que atualmente são desenvolvidas no semi-árido e que, em determinada medida, são complementares.

QUESTÃO 2 – A gestão da água, ou seja, as medidas estruturais e não-estruturais para controlar os sistemas hídricos nos estados beneficiados, permitirá o atingimento dos objetivos propostos no Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional?

Considerações iniciais

97. Para entendermos melhor os tópicos a serem investigadas pela Questão 2, utilizaremos o conceito de gestão empregado por Grigg (1996) que deve ser entendida como sendo a aplicação de medidas estruturais e não-estruturais para controlar os sistemas hídricos, naturais e artificiais, em benefício humano e atendendo a objetivos ambientais.

MEDIDAS ESTRUTURAIS

98. As medidas estruturais referem-se às obras que devem ser realizadas para possibilitar a gestão hídrica, ou seja, às estruturas para captação, reserva, tratamento e distribuição da água. A insuficiência de alguma dessas estruturas representa riscos ao sucesso da gestão. No caso do Projeto de Integração, a principal medida estrutural proposta é a construção de canais a fim de integrar a oferta hídrica da bacia do Rio São Francisco às demandas das bacias do nordeste setentrional. Portanto, o objeto consiste numa obra de adução de água com o objetivo de promover a segurança hídrica da população da região receptora.

99. Entretanto, para a consecução desse objetivo são igualmente necessárias estruturas destinadas à manutenção e à distribuição hídrica. Por isso, essa questão de auditoria tratou de verificar se as ações propostas pelo empreendedor são suficientes para alcançar o objetivo do Projeto, qual seja, o de beneficiar uma população projetada de 12 milhões de habitantes para o ano de 2025. Em sendo tais ações insuficientes, a auditoria buscou identificar as medidas necessárias para se alcançar o objetivo proposto.

100. Dessa forma, de modo a delimitar o foco da auditoria, procurou-se avaliar a rede de reserva e distribuição de água existente e planejada na região beneficiada, bem como identificar oportunidades de melhoria e boas práticas que possam concorrer para o atingimento e potencialização dos benefícios advindos do Projeto. Assim, identificou-se qual a situação atual de infra-estrutura hídrica na região a ser beneficiada e qual o investimento complementar que seria necessário para o atendimento da população estimada.

MEDIDAS NÃO-ESTRUTURAIS

101. Por medidas não-estruturais entende-se todas aquelas relativas a planejamento, gerenciamento, definição de usos, participação da sociedade, cobrança, estrutura e funcionamento das instituições, entre outras. É preciso levar em conta que essas medidas são primordiais para o sucesso de qualquer empreendimento de recursos hídricos.

102. A análise realizada pela equipe de auditoria teve um caráter complementar àquela implementada pela Agência Nacional de Águas (ANA), quando da Concessão do Certificado de Avaliação da Sustentabilidade da Obra (CERTOH) e da Outorga de Direito de Uso da Água. Não foi avaliado se as estruturas administrativas e institucionais propostas são adequadas, mas sim a atual situação dessas estruturas e os problemas atuais que precisam ser equacionados antes da entrada em operação do sistema derivado do Projeto. Por isso, nas questões seguintes, aspectos institucionais, administrativos, de distribuição de água e de coleta de esgoto e, por último, de garantia de ressarcimento para a Chesf-Água serão tratados.

103. A seguir, serão listadas as subquestões elaboradas e os respectivos achados, evidências, recomendações e benefícios esperados no que concerne às medidas estruturais e não-estruturais.

Subquestão 2.1 – A infra-estrutura hídrica atual dos estados garante a captação e a distribuição da água que será disponibilizada para os múltiplos usos previstos no Projeto?

104. Achado 3 – A maioria dos municípios na área de influência indireta que responderam ao questionário não possui infra-estrutura suficiente para aproveitar a água a ser disponibilizada(5) .

——————–

(5) A amostra foi de 26% do total de municípios da área de influência indireta (AII). Foram obtidas 103 respostas para 391 questionários enviados.

——————–

105. A análise, realizada por meio dos questionários e do mapa elaborado com ajuda da ANA, permitiu concluir que a infra-estrutura hídrica atual nos estados e municípios receptores não atende adequadamente às intenções do Projeto, haja vista que a rede de captação e distribuição existente não é suficiente para disponibilizar a água à população potencialmente beneficiada. Para garantir o aproveitamento dos múltiplos usos previstos seriam necessários investimentos complementares na região a ser beneficiada.

106. Essa situação foi revelada em consulta às Secretarias Estaduais responsáveis pela gestão dos recursos hídricos nos estados receptores, bem como aos responsáveis nos municípios abrangidos e corroborada por documentos obtidos junto a entidades federais ligadas ao Projeto como a Agência Nacional de Águas (ANA), a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), além do próprio empreendedor, o Ministério de Integração Nacional (MI).

107. A maioria dos municípios beneficiados não detêm infra-estrutura para aproveitar a água a ser disponibilizada. Corroborando essa afirmação, dados do questionário enviado aos municípios ressaltam que 56% dos municípios da área de influência, que responderam ao questionário, não detêm tal infra-estrutura. Segundo dados do questionário enviado aos estados, observou-se que no Ceará 58% dos municípios não detêm infra-estrutura e no Rio Grande do Norte esse índice atingiu 71%.

108. O conjunto de evidências obtido durante a auditoria (questionários, Planos Estaduais de Recursos Hídricos, outros documentos) permite concluir que há diferenças entre os estados quanto ao estágio de preparação para se adequar ao Projeto. Nos Estados do Ceará e do Rio Grande do Norte já se observa alguma convergência das ações estruturais estaduais ao Projeto de Integração, enquanto nos Estados da Paraíba e de Pernambuco ainda se identifica um estágio mais incipiente de planejamento das ações.

109. Entretanto, observou-se que mesmo os estados com gestão hídrica mais avançada apresentaram dados preocupantes do ponto de vista do preparo para aproveitamento dos recursos hídricos provenientes da transposição. A Secretaria dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará (SRH) informou que apenas 11 dos 26 municípios a serem beneficiados apresentam infra-estrutura hídrica capaz de aproveitar a água a ser disponibilizada. Portanto, os dados da SRH revelam que a maioria dos municípios a serem beneficiados no Estado necessita de medidas estruturais para possibilitar o alcance dos objetivos previstos.

110. Na mesma linha, os dados apresentados pela Secretaria de Estado dos Recursos Hídricos (SERHID), do Estado do Rio Grande do Norte, mostrou que apenas 27 dos 91 municípios a serem beneficiados apresentam infra-estrutura suficiente para garantir o aproveitamento da água a ser transposta, ou seja, menos de um terço dos municípios abrangidos pelo Projeto no Estado.

111. Ainda quanto à infra-estrutura existente, em resposta à questão n° 11 do questionário, o Estado do Ceará informou que ela consiste em infra-estrutura básica de abastecimento d’água urbano nas sedes dos municípios, o que revela a existência de localidades não ligadas à rede de distribuição e que continuariam com acesso interditado à água, mesmo a disponibilizada pelo Projeto, na ausência de investimentos complementares de ampliação da rede de distribuição.

112. Entretanto, casos há em que a distância e o pequeno número de pessoas inviabiliza o investimento de ligação à rede de distribuição. Nestes casos, a alternativa são as soluções de convivência com o semi-árido, a exemplo de vários projetos que necessariamente deverão ser associados ao PISF para o alcance de seus objetivos.

Recomendações

113. Que o MI elabore com estados e municípios o levantamento das obras complementares na área de influência indireta antes do início da implantação física do empreendimento, bem como as respectivas formas de financiamento, estimativas de custo e cronograma de execução.

Benefícios Esperados

114. Adequar a infra-estrutura dos estados e municípios para garantir o aproveitamento da água a ser disponibilizada. Possibilitar a interface entre o Projeto e a infra-estrutura de captação e distribuição nos estados e municípios receptores.

Subquestão 2.2 – Os planos de obras hídricas e os PPAs estaduais prevêem adequadamente os empreendimentos e os investimentos necessários para que o Projeto alcance seus objetivos no prazo previsto?

115. Achado 4 – Os planejamentos de obras hídricas dos Estados do Ceará e do Rio Grande do Norte contemplam a questão de forma incipiente, enquanto ainda se encontram em estudo as alternativas para o aproveitamento da água a ser disponibilizada nos Estados de Pernambuco e da Paraíba.

116. Verificou-se que os planejamentos estaduais ainda encontram-se incipientes quanto aos empreendimentos e investimentos necessários à interface com o Projeto de Integração, o que representa um risco para o alcance dos objetivos no prazo previsto. Os planejamentos dos Estados do Ceará e do Rio Grande do Norte já contemplam algumas medidas visando ao aproveitamento da água a ser transposta, o Estado da Paraíba está se mobilizando para também incluir esse aproveitamento em seu planejamento hídrico, e o Estado de Pernambuco ainda está avaliando o assunto.

117. Ademais, a Paraíba informou que iniciou processo licitatório para contratação de consultoria a fim de planejar como o Estado irá se preparar para receber e gerir a água da integração de bacias. Por sua vez, Pernambuco se manifestou no sentido de que somente irá iniciar as ações com vistas à adequação do Estado ao Projeto quando este for confirmado pelo Governo Federal, in verbis: “Os investimentos necessários ao complemento do Projeto [de Integração de bacias] ainda estão na etapa de avaliações pelo Estado(…). No que diz respeito à previsão dos investimentos necessários ao empreendimento, com a confirmação pelo Governo Federal do início da implementação do PISF, o Governo do Estado pretende, tão logo isso ocorra, iniciar as ações no sentido de viabilizá-lo.”

118. Destaca-se que as respostas às questões 9, 10, 13 e 14 do questionário aos estados fundamentam a análise descrita. Quanto à previsão de investimentos nos Planos Estaduais de Recursos Hídricos (PERHs) e Planos Plurianuais de Investimentos (PPAs), o Estado do Ceará informou que o PERH prevê o uso da água da transposição para a década de 2010-2020, e o PPA, no que concerne à implantação da macro-estrutura hídrica do Canal da Integração Castanhão-Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Nesse empreendimento, as obras previstas são: (i) Trecho II (Açude Curral Velho-Serra do Félix); (ii) Trecho III (Serra do Félix-Açude Pacajus) e (iii) primeira etapa do Trecho V (Açude Gavião-Porto do Pecém), todos correspondentes ao Canal da Integração Castanhão-RMF. Estas obras já foram iniciadas e têm prazo de execução previsto para 24 meses. No entanto, cabe ressaltar que o Ceará não apresentou nenhum planejamento quanto às demais regiões que serão beneficiadas no Estado.

119. O Estado do Rio Grande do Norte informou que já tem realizado muitas ações do PERH com a finalidade de ajustar a estrutura hídrica estadual ao Projeto de Integração, como a construção da barragem de Santa Cruz e Umari e os projetos da Barragem de Oiticica e do Eixo de Integração. Além disso, comunicou que a revisão do PERH está prevista para 2007 no âmbito do projeto semi-árido potiguar, em negociação com o Banco Mundial. O Estado também apresentou a previsão das datas de início e término das obras previstas: (i) Eixo de Integração do Seridó (2007-2009), (ii) Barragem de Oiticica (2006-2009), e (iii) Canal Açu-Matogrande (sem previsão).

120. O Estado da Paraíba limitou-se a informar que se encontra em fase de conclusão um Programa Especial no PERH que considera o aproveitamento do Projeto de Integração. Além disso, frisou que o Estado necessita de ajuda do Governo Federal ou de organismos internacionais para adequar o PERH e o PPA ao Projeto.

121. O Estado de Pernambuco comunicou que não há previsão de investimentos no PERH nem no PPA com vistas ao complemento do Projeto de Integração, porque esses investimentos ainda estão na etapa de avaliações e que a adequação está condicionada à confirmação pelo Governo Federal do início da implementação do Projeto. Todavia, listou as obras previstas com prazo de cinco anos para conclusão: Eixo Norte: (i) Projeto do Canal do Sertão Pernambucano encontra-se em Estudo de Viabilidade. Eixo Leste: (ii) projeto de interligação com as adutoras de Jucazinho, Bitury, Camevô, Arcoverde, Pajeú e Afogados da Ingazeira.

122. Corroborando as informações acima, segundo dados do questionário enviado aos municípios, 53% dos que se encontram na área de influência indireta responderam que possuem algum tipo de planejamento, mas em Pernambuco o índice é de apenas 15%.

123. Cumpre relatar que o Governo Federal, por meio de quatro ministérios, firmou Termo de Compromisso com os quatro estados beneficiados, no qual se compromete a reservar recursos do Orçamento Geral da União para financiar as obras complementares necessárias à interligação dos canais principais de integração com as estruturas estaduais de distribuição hídrica. Entretanto, vale destacar a fragilidade do instrumento eleito que não possui, no mundo jurídico, a obrigatoriedade de cumprimento para o Poder Público que tem uma lei, por exemplo. O não cumprimento do referido Termo de Compromisso pode transformá-lo em mera carta de intenções e a falta ou interrupção do repasse de recursos ao empreendimento pode resultar no não atingimento dos objetivos do PISF, com a paralisação das obras.

124. Desse modo, com vistas a assegurar a regularidade desses investimentos e o cumprimento das demais cláusulas previstas no referido Termo de Compromisso, propõe-se a inserção do nome das obras complementares, que receberão apoio do Governo Federal, no Convênio que dará origem ao “Pacto Pela Sustentabilidade do PISF”, presente no Relatório 3 da Proposta de Estruturação Institucional e Administrativa dos Estados para a Gestão das Águas do PISF, Anexo I, fls. 82/92.

Recomendações

125. Que o MI insira no convênio que dará origem ao “Pacto Pela Sustentabilidade do PISF” a listagem das obras complementares que receberão apoio do Governo Federal.

Benefícios Esperados

126. Permitir a convergência entre os prazos de conclusão das obras complementares e do PISF.

127. Formalizar com os estados beneficiados mecanismos de ajuda financeira às obras complementares.

Subquestão 2.3 – Há estimativa total dos custos das obras complementares?

128. Achado 5 – Há estimativas, porém não totais, nos Estados do Ceará e do Rio Grande do Norte. Os Estados da Paraíba e de Pernambuco não têm estimativas para esses custos. E não há estimativas na maioria dos municípios que responderam ao questionário.

129. Em verdade, a resposta a esta subquestão decorre logicamente da resposta da subquestão anterior, pois que estão intimamente ligadas. Portanto, ante a situação acima descrita e as respostas às questões n° 15 e 16 do questionário aos estados e a questão 15 do questionário aos municípios, não há estimativa total dos custos das obras complementares. Segundo dados do questionário aos municípios, em 58% deles não há estimativas do custo das obras complementares, em Pernambuco o índice é de 90%.

130. O Estado do Ceará informou as fontes de recursos e o total estimado para as obras previstas no Estado. São recursos federais, estaduais e externos, no montante de R$ 600.000.000,00 (seiscentos milhões de reais). No entanto, cabe esclarecer que estes investimentos abrangem apenas as obras relacionadas à região metropolitana de Fortaleza.

131. O Estado do Rio Grande do Norte estima que precisará de R$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de reais) para a construção do Eixo de Integração do Seridó e da Barragem de Oiticica e de R$ 60.000.000,00 (sessenta milhões de reais) para o Canal Açu-Matogrande.

132. O Estado da Paraíba informou que ainda não tem estimativa total dos custos das obras complementares. Acrescentou que apenas para a contratação dos estudos dessas obras, o custo estimado é de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), de fonte federal.

133. O Estado de Pernambuco prevê que usará recursos do Orçamento do Estado, do Orçamento Geral da União e de órgãos financiadores internacionais como o Banco Mundial e o Banco Japonês – JBIC, entretanto não estima nenhum valor.

134. Todos os estados comunicaram que necessitarão de apoio financeiro federal para realização dessas obras complementares. E o Estado da Paraíba informou que também precisará de apoio técnico do Governo Federal para implementar essas obras.

135. A infra-estrutura hídrica atual nos estados e municípios a serem beneficiados não é suficiente para atender aos múltiplos usos previstos. Além disso, os planos estaduais não prevêem adequadamente os empreendimentos e investimentos necessários para que o Projeto alcance seus objetivos no prazo previsto. A falta de medidas estruturais e de planejamento representa um risco ao Projeto.

136. A falta de uma rede adequada de distribuição hídrica complementar ao eixo integrador projetado inviabiliza o pleno alcance do objetivo proposto, uma vez que parte da população supostamente beneficiada permaneceria sem acesso à água. Desta forma, cabe concluir que ou os benefícios do Projeto estariam superestimados, se mantidas as ações e investimentos propostos, ou, por outro lado, que esses investimentos estariam subestimados frente às ações necessárias ao atingimento dos benefícios anunciados.

Recomendações

137. Que o Governo Federal considere os custos das obras complementares no cálculo para atingir os objetivos do Projeto.

Benefícios Esperados

138. Dimensionar adequadamente os custos totais de forma a permitir o atingimento dos objetivos do Projeto.

Subquestão 2.4 – Os sistemas estaduais de gerenciamento de recursos hídricos necessitam de aperfeiçoamento para garantir uma gestão adequada da água?

139. Achado 6 – Falhas no funcionamento e na estrutura do arranjo institucional dos estados beneficiados pelo PISF, a exceção do Ceará, geram risco para a efetividade da gestão dos recursos hídricos disponibilizados pelo PISF.

140. A gestão dos recursos hídricos tem como objetivo planejar, regular e controlar o uso, a preservação e a recuperação das águas superficiais e subterrâneas. Para atender tais atribuições, a gestão baseia-se em leis, em instituições e em instrumentos. Entre os instrumentos podemos citar os planos de recursos hídricos, a outorga dos direitos de uso, a cobrança e o sistema de informações.

141. Nesse tópico trataremos exclusivamente sobre um elemento da gestão que é a estruturação e o funcionamento das instituições. Serão apresentados problemas relativos a: falhas na separação das atribuições entre usuários e gestores; duplicidade de funções entre as instituições gestoras; inexistência e deficiências das instituições; e dificuldades na operacionalização das exigências financeiras e comerciais por parte dos órgãos de gerenciamento.

142. Nesse contexto, faz-se primordial apresentar os fundamentos da Política Nacional de Recursos Hídricos, definido pela Lei n.º 9.433/97, pois os mesmos devem reger a gestão de recursos hídricos nos estados, são eles:

I – a água é um bem de domínio público;

II – a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico;

III – em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais;

IV – a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas;

V – a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;

VI – a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades.

143. Com base nesses fundamentos, é preciso ter em conta que é necessário proporcionar o uso múltiplo das águas em qualquer sistema de gestão hídrica, devendo para tanto estruturar as entidades públicas responsáveis pelo gerenciamento e, também, definir quem são e como serão atendidos os usuários.

144 A primeira evidência de falha no sistema de gestão nos estados beneficiados pelo PISF, com exceção do Estado do Ceará, é que não está definido o papel das companhias de saneamento. Isso se torna uma questão importante na medida em que essas companhias, todas estaduais, estão tendo funções do órgão de gerenciamento de recursos hídricos do Estado e ao mesmo tempo são usuários do sistema.

145. Apesar das companhias de saneamento serem usuários, como os irrigantes, o setor industrial, entre outros, elas possuem outras atribuições, em alguns estados beneficiados. A Companhia de Saneamento do Estado de Pernambuco (COMPESA), a Companhia de Água e Esgotos da Paraíba (CAGEPA) e a Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (CAERN) distribuem não só água tratada, mas também a água bruta. Essa atividade de distribuição de água bruta precisa estar bem definida no âmbito dos estados beneficiados, com vistas a evitar dificuldades operacionais e comerciais.

146. Entrevistas e questionário enviado aos estados demonstram que ainda não foi decidido o papel das empresas de saneamento. Segundo resposta do questionário, Anexo, fls.14/15, o Estado de Pernambuco analisa a possibilidade da COMPESA ser a responsável pela distribuição. Além disso, o Estado do Rio Grande do Norte reconhece que com o PISF deverá haver uma maior interação entre o órgão de meio ambiente, a SERHID/IGARN e a companhia de saneamento.

147. Assim, para que não haja confusão entre as atribuições no fornecimento de água bruta e nas obrigações de usuário das águas transpostas, é preciso que os estados beneficiados discutam e definam como se dará essa relação. Para que os arranjos institucionais tenham sustentabilidade econômica, é fundamental que esteja definida a participação das companhias de saneamento, pois os custos de operação e manutenção deverão ser repassados aos demais usuários por meio destas.

148. O Ceará é prova da importância que a disjunção entre órgão de gerenciamento e usuários pode causar na eficiência do funcionamento do sistema. Diferentemente dos demais Estados beneficiados pelo Projeto, o Ceará não depende das companhias de saneamento para a distribuição da água bruta, pois possui a Companhia de Gestão de Recursos Hídricos (COGERH). Essa estrutura institucional possibilita ao Ceará cobrar a água bruta dos usuários, bem como realizar a manutenção necessária nos sistemas adutores. A COGERH possui 8 Gerências, sendo que 88% do seu orçamento é proveniente da cobrança da água pelo uso da água bruta.

149. Outro ponto que ressalta a existência de falhas no arranjo institucional de alguns estados a serem beneficiados pelo PISF é a duplicidade de funções entre as Secretarias Estaduais responsáveis pelos recursos hídricos e os órgãos de gerenciamento. O Instituto de Gestão das Águas do Rio Grande do Norte (IGARN) e a Agência Executiva de Gestão das Águas do Estado da Paraíba (AESA), segundo entrevistas, apresentaram ações que estão sendo realizadas pelas respectivas secretarias estaduais, mas que fazem parte das atribuições dos órgãos de gerenciamento.

150. Com isso, alguns programas de recursos hídricos que deveriam estar nos órgãos de gerenciamento, ainda se encontram sob a responsabilidade das Secretarias. Como exemplo, na visita in loco da equipe de auditoria, pôde-se constatar que algumas atividades legalmente atribuídas ao IGARN, como a execução do PROÁGUA e atividades como o monitoramento dos açudes ainda estavam sendo realizadas pela Secretaria (SERIHD).

151. Outro exemplo de duplicidade ocorre na Paraíba onde a Secretaria de Estado da Ciência e Tecnologia e do Meio Ambiente (SECTMA) possui atribuições de executar as ações governamentais relacionadas com a exploração e utilização de recursos hídricos, inclusive a cobrança pelo uso da água, conforme Relatório da FGV(6) , Anexo I, fls.12, atribuições estas também da antiga AAGISA e agora da AESA.

——————–

(6) Estudo de Sustentabilidade Institucional Administrativa, Financeira e Operacional do Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional

——————–

152. No Estado de Pernambuco essa situação é ainda mais grave, pois ainda não existe o órgão gerenciamento de recursos hídricos. O Relatório da FGV, Anexo I, fls. 41, ressalta que as funções que deveriam ser da entidade de gerenciamento de recursos hídricos no Estado de Pernambuco estão fragmentadas em diversas instituições. Segundo questionário, existe por parte do governo do Estado o interesse em estruturar a Agência de Águas do Estado de Pernambuco, contudo até o término da auditoria ainda não havia sido criada. Segundo questionário enviado aos municípios, 67% deles não possuem Secretarias de Recursos Hídricos, o que demonstra a fragilidade institucional também na esfera municipal.

153. Além disso, conforme questionário, Anexo I, fls.101 e fls. 13 do Anexo II, as Secretarias Estaduais da Paraíba e de Pernambuco não possuem a exclusiva atribuição de gerenciar os recursos hídricos. Em ambos Estados, as secretarias se denominam SECTMA e acumulam atribuições ambientais, de ciência e tecnologia e de gestão de recursos hídricos. Na SECTMA/PE as atribuições relativas a recursos hídricos se concentram apenas em uma diretoria. O ideal seria que as funções de gestão de recursos hídricos estivessem concentradas em uma secretaria, como é no Ceará (SRH) e no Rio Grande do Norte (SERHID).

154. Segundo Relatório da FGV, Anexo I, fls. 42, a multiplicidade de atribuições não é por si só um problema. Contudo, a instituição precisa

cumprir mininamente as funções de gerenciar a água transposta de forma eficiente e sustentável. O problema acontece quando a multiplicidade de funções associadas interferem no cumprimento efetivo do papel de gestora estadual dos recursos hídricos.

155. A última evidência identificada pela equipe de auditoria em relação às falhas no arranjo institucional, refere-se ao fato de que os órgãos de gerenciamento criados na Paraíba e Rio Grande do Norte não têm uma personalidade jurídica que permita a cobrança e o fornecimento de garantias para cobrir os custos operacionais das águas transpostas. O IGARN e a AESA são autarquias e, segundo Relatório 3 da FGV, Anexo I, fls. 36, essas entidades sofrem limitações quanto à possibilidade de realização de operações financeiras e comerciais. Dessa forma, essas entidades não proverão as garantias bancárias que a sustentabilidade do sistema de gestão requer.

156. Ainda conforme o Relatório 3 da FGV, Anexo I, fls. 25/43, nos casos em que os Estados beneficiados não disponham de um órgão de gerenciamento de recursos hídricos com a personalidade jurídica capaz de gerir a água, a sustentabilidade do arranjo institucional do PISF poderá ser alcançada por uma das três formas:

– criação de uma operadora estadual instituída com base na figura de “entidade delegatária” das funções de agência de águas, introduzidas pela Lei n.º 10.881/04;

– operação do sistema estadual também pela CHESF-Água; e

– delegação da operação para uma empresa privada através de parceria público-privada (PPP).

157. Apesar da importância que a questão suscita para a sustentabilidade econômica do PISF, ela ainda não está definida nos Estados da Paraíba, Rio Grande do Norte e Pernambuco. Nesse sentido, o Estado da Paraíba ressaltou na resposta ao questionário, Anexo I, fls. 101/102, que ainda analisará a necessidade ou não de um organismo para gerenciar essas águas. Já o IGARN, Anexo II, fls. 05, realizará as operações financeiras necessárias, o que segundo o relatório da FGV não é viável, pois gerará distorções das atribuições que cabem a uma autarquia. E o Estado de Pernambuco, na questão 22, Anexo II, fls. 68/69, ressalta que ainda está analisando se a entidade responsável pela operação da distribuição da água será a COMPESA ou a Chesf-Água. O Ceará não enfrenta esse problema, pois a COGERH possui personalidade jurídica capaz de realizar as operações financeiras e comerciais necessárias.

158. As falhas e deficiências acima elencadas demonstram a fragilidade do atual arranjo institucional dos Estados de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte. Conclui-se que essas falhas na estrutura e no funcionamento das instituições desses Estados geram riscos para a sustentabilidade econômica do PISF.

159. Apesar das falhas institucionais não apresentarem o mesmo nível nos quatro Estados, todos possuem oportunidades de aperfeiçoamento de suas estruturas. Nesse sentido, a resolução dessas fragilidades demanda firme compromisso das autoridades governamentais, liderança política para gestão de conflitos e intensivo suporte técnico e gerencial.

160. Nesse sentido, existe a oportunidade de que a adequação institucional dos quatro Estados seja fomentada pelo novo PROÁGUA que será implementado pela Agência Nacional de Águas (ANA). É possível que dentro do componente – Gestão de Recursos Hídricos – continue a ser desenvolvido o indispensável trabalho de fortalecimento institucional que ocorreu durante a vigência do PROÁGUA Semi-Árido, sendo este um importante instrumento para garantir a capacitação, o aprimoramento da legislação, a estruturação institucional que serão necessários para a adequação da gestão das águas transpostas.

Recomendações

161. Que o MI implemente uma Unidade de Gerenciamento do Projeto (UGP), nos moldes da que existe no PROÁGUA, com os componentes de Infra-Estrutura Hídrica, Gestão e Revitalização, definindo rubrica orçamentária para cada um dos componentes.

162. Que o MI, dentro do componente Gestão da UGP que vier a ser criada, auxilie e oriente os órgãos estaduais no que tange ao fortalecimento institucional dos sistemas de gestão de recursos hídricos dos estados a serem beneficiados pelo PISF quanto à:

– definição do papel das companhias de saneamento dos estados com relação à sua participação na distribuição da água bruta;

– organização do marco regulatório com distinção entre as atribuições dos órgãos responsáveis pelo gerenciamento dos Recursos Hídricos e as Secretarias Estaduais responsáveis pela gestão hídrica;

– definição de como os estados operacionalizarão as garantias comerciais e financeiras que serão exigidas pela Operadora Federal do Sistema (CHESF-Água);

163. Que a Agência Nacional de Águas estude a possibilidade de incluir um componente de Gestão de Recursos Hídricos no novo PROÁGUA, de forma a complementar as ações da UGP do Projeto, especificamente para:

– estruturar as instituições que fazem parte do sistema que utilizará as águas transpostas pelo PISF.

Benefícios Esperados

164. Aperfeiçoar as medidas não-estruturais, com vistas a garantir a racionalidade das instituições responsáveis pelo sistema, gerando a sustentabilidade econômica, bem como o máximo aproveitamento da estrutura inicialmente orçada em R$ 4,5 bilhões. Garantir ganhos relativos à profissionalização da gestão, melhora na comunicação entre as instituições e eliminação de duplicidades, bem como aumento da sinergia.

165. Achado 7 – Os Sistemas de Gerenciamento de Recursos Hídricos dos Estados da PB, RN e PE necessitam de aperfeiçoamentos na implementação da cobrança pelo uso da água e da participação social.

166. Como vimos acima, é fundamento da Política Nacional de Recursos Hídricos que a água é um bem dotado de valor econômico e que a sua gestão deve ser descentralizada. Nesse sentido, dois elementos são primordiais para aferir a aderência a esses fundamentos, que são a cobrança pelo uso da água e a formação dos comitês de bacia.

167. Os instrumentos de gestão previstos no sistema nacional de gestão de recursos hídricos são os mesmos previstos nos sistemas estaduais, quais sejam: planos de recursos hídricos, outorga, sistema de informações e cobrança pelo uso da água.

168. Segundo informações dos questionários enviados aos estados, o sistema de informações e a outorga estão sendo utilizados por todos os quatro estados beneficiados. Contudo, a cobrança só está sendo empregada pelo Ceará. Neste Estado, realiza-se a cobrança por serviços prestados associados ao fornecimento de água bruta desde 1996. Segundo Relatório 3 da FGV, Anexo I, fls.15, são arrecadados cerca de 20 milhões/ano, sendo os setores de saneamento básico e o industrial os que mais pagam.

169. Por exemplo, no Estado de Pernambuco, segundo questionário, Anexo II, fls.67/68, existe um estudo preliminar para implementação da cobrança na bacia hidrográfica do rio Pirapama. Contudo, com a aprovação da nova Lei Estadual de Recursos Hídricos, Lei n.º 12.984/2005, para que a cobrança seja implementada, é necessária a regulamentação por lei específica. Já o Estado do Rio Grande do Norte ressaltou que foi contratado um estudo de tarifação em 2000, devendo este ser revisado em 2006. Além disso, ressalta que a cobrança também demandará regulamentação do Estado. Segundo o questionário, Anexo II, fls. 04, o Estado da Paraíba já implementou a outorga e a licença para a implantação de obra hídrica, mas a cobrança precisa ser regulamentada.

170. Cabe destacar que o Relatório 3 da FGV, Anexo I, às fls. 43/68, ressalta que o sistema de gerenciamento deverá possuir mecanismos de gestão econômico-financeiros que garantam a operação e a manutenção da infra-estrutura hídrica de forma sustentável e eficiente. Para isso, propõe três espécies de mecanismos:

– tarifação dos serviços de adução de água bruta da Operadora Federal para os estados das bacias receptores;

– garantias de ressarcimento pelos estados receptores à Operadora Federal dos custos de operação, manutenção e administração do Projeto de Integração; e

– cobrança pelo uso da água bruta nos estados receptores.

171. A cobrança pelo uso da água bruta é fundamental, na medida em que garante uma utilização mais racional dos recursos hídricos. Dessa forma, o sistema de preço instituído deverá fazer com que a alocação da água seja eficiente. Assim, para escolher que tipo de cultura utilizar o usuário buscará alternativas que tenham maior produtividade, tecnologia, sistema de distribuição, escala econômica, etc. Nesse sentido, a cobrança é um instrumento que, conjuntamente com a tarifação dos serviços de adução e com o fornecimento de garantias de ressarcimento, dará maior racionalidade ao sistema e evitará desperdícios e subutilização das águas transpostas.

172. Complementando a questão da cobrança pelo uso da água está a necessidade da participação social, isto é, a cobrança só se viabiliza em um contexto onde os usuários apoiam e discutem como ela será empregada. Nesse sentido, a participação social também é fundamental para o funcionamento de qualquer sistema de gestão. Primeiro, porque é princípio básico da Política Nacional de Recursos Hídricos. Segundo, porque a definição de como se utilizará a água só terá legitimidade se partir de uma decisão conjunta, no âmbito dos comitês de bacia ou das associações e dos conselhos de usuários.

173. Nesse sentido, considera-se que a participação social no PISF pode ser evidenciada de duas formas: a primeira, o envolvimento que a comunidade a ser beneficiada está tendo no Projeto e a segunda, a formação de comitês de bacia, associações e conselhos de usuários.

174. Dessa forma, evidenciou-se que existe desconhecimento dos benefícios do PISF por parte dos municípios abrangidos. Conforme apresentado no item 76, existe uma grande diferença entre o que o MI apresenta e como os estados e municípios estão vendo o PISF.

175. Com relação ao desconhecimento dos benefícios do PISF, o cotejamento do questionário enviado aos estados e aos municípios evidencia que a discussão ainda não chegou na ponta. Entre os municípios beneficiados, mais da metade responderam que precisam de novas rodadas de discussão para entender os benefícios do Projeto. Além disso, o questionário enviado aos municípios ressalta que muitos deles que serão beneficiados, segundo o MI, não sabiam que a água chegaria à suas municipalidades, conforme relatado no item 49 deste relatório.

176. O segundo ponto importante na discussão da participação social é a formação dos comitês de bacia, pois segundo a Lei de n.º 9.433/97, a bacia hidrográfica é a unidade territorial para formulação das políticas e para gestão dos recursos hídricos. Os comitês de bacia não são apenas o fórum maior de discussão da gestão hídrica da bacia, mas também refletem o nível de amadurecimento da comunidade frente aos recursos hídricos, bem como são responsáveis pela elaboração dos planos de gerenciamento das bacias. Esses planos são fundamentais para se determinar como a água que vier a ser aduzida do Rio São Francisco será aproveitada pelos usuários, inclusive com a estipulação das obras prioritárias.

177. Nesse sentido, alguns estados ainda não implementaram seus comitês de bacia, impossibilitando um gerenciamento participativo mais amplo. O Estado da Paraíba ainda não possui os comitês de bacia hidrográfica instalados e o Rio Grande do Norte possui apenas um, no Rio Pitimbu. O Relatório 3 da FGV, Anexo I, fls. 14, ressalta que o Estado da Paraíba possui 54 associações de usuários de água criadas ao redor de chafarizes e açudes e o Estado do Rio Grande do Norte possui 126 organizações de usuários. Essa situação é evidenciada também no questionário enviado aos municípios, pois 58% deles responderam que não fazem parte de nenhum comitê de bacia. É evidente a importância desses grupos de usuários, contudo, como a participação deles se dá de forma muito pontual, é fundamental que esses estados implementem seus comitês de bacia.

178. Segundo o Relatório 3 da FGV, Anexo I, fls. 14, já existem 8 comitês de bacia no Estado de Pernambuco. O Ceará também possui 8 comitês de bacia instalados e 2 em formação. Além disso, este Estado, durante a construção do açude Castanhão, implementou um fórum de usuários que permitiu aos envolvidos discutir os assuntos concernentes àquela obra. O fórum foi identificado pela equipe de auditoria como uma boa prática e foi criado pelo Decreto Estadual 23.758/95, no qual recebeu a denominação de Grupo Multi-Participativo do Castanhão.

179. Para que o PISF tenha racionalidade econômica e legitimidade da população é necessário que dois componentes sejam intensamente trabalhados. São eles: a cobrança pelo uso da água e a participação social. Isso é fundamental, pois caso contrário estará se permitindo repetir projetos com características econômicas artificiais onde, finda a intervenção pública, acabam desaparecendo. Nesse sentido, identificou-se que existe risco para a sustentabilidade do PISF, na medida em que as deficiências relativas à cobrança pelo uso da água e à participação social ainda precisam ser equacionadas.

Recomendações:

180. Que o MI, no âmbito da UGP que vier a ser criada para o Projeto, auxilie e oriente os órgãos estaduais no que tange ao aperfeiçoamento dos sistemas de gestão de recursos hídricos dos estados a serem beneficiados pelo PISF quanto à:

– elaboração de planos de gerenciamento das bacias hidrográficas;

– aprimoramento da legislação ambiental no que tange à regulamentação do instrumento de cobrança pelo uso da água nos estados;

181. Que a Agência Nacional de Águas estude a possibilidade de incluir um componente de Gestão de Recursos Hídricos no novo PROÁGUA, de forma a complementar as ações da UGP, especificamente para:

– fortalecer a participação social por meio da estruturação da bacia de integração, independente dos rios serem de domínio dos estados;

182. Que o MI crie um fórum de usuários nos moldes do Grupo Multi-Participativo do Castanhão, criado pelo Decreto Estadual 23.758/95.

Benefícios Esperados

183. Garantir por meio da cobrança que a água será utilizada de forma racional, sem desperdícios e subutilizações. Permitir que seja definido de forma participativa e integrada aonde e de que forma serão alocadas as águas que vierem a ser transpostas.

Indicadores de desempenho

– Percentual de Bacias Hidrográficas beneficiadas pelo PISF com plano de gerenciamento em relação ao número total de Bacias Hidrográficas beneficiadas.

– Percentual de Bacias Hidrográficas beneficiadas pelo PISF que realizam a cobrança pela água bruta /N.º total de Bacias Hidrográficas beneficiadas.

– Percentual de Comitês de Bacia implementados no âmbito do PISF/N.º total de Bacias Hidrográficas beneficiadas no âmbito do PISF.

Subquestão 2.5 – É possível identificar oportunidades de melhoria nas estruturas administrativas das instituições estaduais de gestão de recursos hídricos para fazer frente às novas atribuições decorrentes do PISF?

184. Achado 8 – Os órgãos estaduais responsáveis pelo gerenciamento dos recursos hídricos dos Estados de Pernambuco, Rio Grande do Norte e Paraíba não puderam ser avaliados, pois não existem ou estão muito incipientes, consequentemente, ainda não possuem uma estrutura administrativa que permita gerir adequadamente os recursos hídricos.

185. A avaliação das estruturas administrativas visou complementar a análise realizada anteriormente sobre a adequação do arranjo institucional. Acredita-se que não basta as instituições responsáveis pela gestão possuírem atribuições legais que permitam a gestão, é preciso que exista uma estrutura administrativa capaz de fazer o sistema funcionar de forma eficaz e eficiente. A avaliação realizada teve como foco os órgãos de gerenciamento nos estados.

186. Constatou-se que os Estados da Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte encontram-se com seus órgãos de gerenciamento ou em estágio muito incipiente, ou ainda não o possuem. Segundo questionário, Anexo I, fls. 101, o órgão de gerenciamento hídrico do Estado da Paraíba foi recentemente criado pela Lei n.º 7.778/2005, denominando-se Agência Executiva de Gestão das Águas do Estado da Paraíba (AESA). Assim, por tratar-se de um novo órgão, não dispõe de um quadro efetivo de pessoal. Está previsto concurso público, mas atualmente a agência conta com 37 servidores, entre ocupantes de cargos de direção, técnicos com contratos temporários e pessoal cedido de outros órgãos do governo estadual.

187. Com relação ao Estado de Pernambuco, este ressaltou que está realizando estudos para depois estruturar seu órgão de gerenciamento de recursos hídricos. Atualmente no Estado quem realiza a gestão de recursos hídricos é a SECTMA, sendo que a equipe de recursos hídricos é composta por 14 servidores do quadro efetivo do Estado e 56 com contrato temporário, segundo questionário enviado aos estados, Anexo II, fls. 69.

188. Já o Rio Grande do Norte, segundo o questionário, Anexo I, fls. 04, apesar de ter sido criado o IGARN, ainda falta a realização da regulamentação das atribuições do Instituto. É uma autarquia vinculada à Secretaria de Estado de Recursos Hídricos, cuja missão institucional é a gestão técnica e operacional, constituindo-se como braço executivo do sistema. Conforme visita in loco, o quadro de pessoal é muito reduzido e, segundo relatório da FGV, Anexo I, fls. 13, é composto por 16 servidores de outros órgãos.

189. Diferentemente dos demais estados, a Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Ceará – COGERH conta com uma estrutura administrativa que possibilita realizar suas atribuições legais, com 63 servidores efetivos e 349 terceirizados. A Companhia possui 8 gerências regionais e tem 88% de seu orçamento proveniente da cobrança pelo uso da água bruta. Foi criada em 1993 e é uma entidade de administração pública indireta, vinculada à SRH e dotada de personalidade jurídica própria, organizada sob a forma de S.A.

190. Consequentemente, pode-se observar que a análise aprofundada da questão administrativa ficou prejudicada devido à baixa estruturação dos órgãos de gerenciamento dos Estados da Paraíba, Rio Grande do Norte e Pernambuco. Existindo, portanto, a premente necessidade de estruturação do quadro de pessoal desses órgãos, por meio de concursos públicos, e no caso de Pernambuco a criação do órgão de gerenciamento. A estrutura administrativa a ser montada deve respeitar rigorosamente a necessidade de atender às atribuições elencadas pelo Relatório 3 da FGV, quais sejam:

– Apoiar a Secretaria de Recursos Hídricos nos estudos concernentes à outorga, à elaboração do Plano Estadual, aos Planos de investimento na ampliação da infra-estrutura hídrica;

– Efetuar a cobrança e gerir a aplicação dos recursos arrecadados;

– Implantar programas de incentivo ao uso racional e proteção dos recursos hídricos;

– Fomentar a instalação e apoiar tecnicamente os entes do sistema Estadual de Gestão de Recursos Hídricos (conselho Estadual de Recursos, Comitês, Associações e conselhos de usuários).

191. Conclui-se, portanto, que os Estados da Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte apresentam riscos para o PISF na medida em que não apresentam órgãos de gerenciamento capazes de realizar adequadamente o aproveitamento das águas transpostas. E como ponto chave dessa deficiência está a inexistência de servidores efetivos nessas instituições, pois isso impossibilita que se crie uma massa crítica e uma cultura institucional, haja vista que a mão de obra empregada além de ser pequena, normalmente é de outros órgãos.

Recomendações

192. Que o MI quando da assinatura de convênios, ou instrumentos congêneres, para a construção de obras complementares ao PISF nos estados beneficiados, condicione a liberação dos recursos à exigência de estruturação administrativa dos órgãos responsáveis pela gestão de recursos hídricos.

Benefícios Esperados

193. Permitir que as instituições de gerenciamento de recursos hídricos tenham estrutura administrativa que permita a realização das atividades com eficiência e eficácia. Garantir estrutura administrativa mínima que proporcione a sustentabilidade do PISF e que sirva como indutor das ações e não como obstáculo para elas, bem como a criação de uma cultura institucional que permita aos servidores maior vínculo com a instituição ao qual pertencem. E, também, gerar continuidade administrativa que garanta a evolução da gestão.

Subquestão 2.6 – Qual a situação atual do ciclo operacional nos estados, considerando a captação até a distribuição e a coleta do esgoto?

194. Achado 9 – Não há garantias de que os benefícios do Projeto serão completamente alcançados devido às deficiências na operação e distribuição dos recursos hídricos e na captação do esgoto nos estados a serem beneficiados pelo PISF.

195. O art. 3.º da Política Nacional de Recursos Hídricos define como diretriz que a gestão de recursos hídricos deve realizar-se sem a dissociação dos aspectos de quantidade e qualidade. Por isso, na avaliação a seguir trataremos sobre fatores que reduzem a quantidade de água e fatores que deterioram sua qualidade. São eles a ineficiência do sistema atual de distribuição de água nos estados e a contaminação dos mananciais por conta do despejo de esgoto in natura no leito dos rios.

196. Com relação à ineficiência da distribuição de água, dois conceitos são importantes, o de perdas físicas e o de perdas de faturamento. Eles estão intrinsecamente relacionados, sendo que o primeiro refere-se a perda de água (vazamentos e roubo nos dutos e hidrômetos) e o segundo refere-se ao que deixou de ser contabilizado como receita para a companhia. Cabe destacar que, segundo relatório enviado aos estados, foram evidenciadas elevadas perdas físicas e de faturamento do sistema de abastecimento nos quatro estados analisados.

197. Segundo resposta dos questionários, Anexo II, fls. 70, a COMPESA (PE) apresenta o índice de perdas de faturamento da ordem de 55,7%. Já a Cagern (RN) apresenta índice de perdas físicas de 49% e financeiras de 36% aproximadamente. Por sua vez, a Cagece (CE) tem perda física de 66,6% de água bruta. E, por último, a CAGEPA (PB) tem perdas físicas de aproximadamente 40% .

198. Destaca-se que as elevadas perdas físicas e de faturamento listadas acima têm impacto direto sobre o custo operacional das companhias, reduzindo a capacidade de expansão do serviço e, consequentemente, diminuindo a capacidade de endividamento delas. Com a redução das perdas seria possível reduzir o impacto tarifário gerado pelos custos do reforço hídrico propiciado pelo PISF. Isto é, com relação ao impacto do custo das águas transpostas às tarifas de saneamento, os resultados das simulações apresentadas pelo MI demonstram que causarão impacto médio de 4% em 2010 e 7% em 2025 sobre a tarifa dos usuários finais do setor de saneamento dos estados receptores. Considerando apenas as tarifas de água, o impacto médio aumenta para aproximadamente 8% em 2010 e 14% em 2025.

199. A não-adequação do ciclo operacional de distribuição da água gera risco para a sustentabilidade econômico-financeira do sistema na medida em que se tem a perda de água, o que aumenta ainda mais o custo da água transposta. Segundo resposta do questionário, Anexo I, fls. 102/103, no Estado da Paraíba as águas transpostas passam por regiões de baixo poder aquisitivo. Assim, o preço cobrado pela água, dependendo de seu valor, poderá dificultar a capacidade de pagamento dos habitantes. Corroborando essa idéia, 65% dos municípios ressaltaram que os 0,12 R$/m3, conforme NT 390/ANA/SOC, poderia comprometer a capacidade de pagamento.

200. Ainda nessa linha de raciocínio, como a outorga de direito de uso da água concedida ao PISF é mais restritiva do que aquela inicialmente pleiteada, isto é, os 26,4 m3/s de vazão firme são inferiores ao pedido inicial do Projeto, é fundamental que a água a ser disponibilizada não entre nas estatísticas das perdas físicas, pois isso poderá comprometer diretamente a população a ser beneficiada, seja por meio da redução da água disponível, seja pelo estabelecimento de tarifas majoradas.

201. O segundo ponto a ser considerado, refere-se ao problema da qualidade da água. No Brasil, conforme evidenciado pela Auditoria de Águas, TC 017.318/2001-5, o principal fator de redução da qualidade da água é o despejo de esgoto sem tratamento no leito dos rios. Esse problema se repete também nos quatro estados beneficiados. Segundo informações dos questionários respondidos pelos estados, a rede de esgotamento atinge uma pequena parcela da população.

202. O Estado do Ceará respondeu que apenas 25% dos domicílios têm serviço de coleta de esgoto. No Rio Grande do Norte a taxa é de 19,4%. Na Paraíba essa taxa corresponde a 21,6% e, por último, em Pernambuco, tem-se que apenas 17% da população é beneficiada com coleta de esgoto. Esses números se agravam ainda mais, pois, em sua maior parte, representam apenas que existe a coleta de esgoto e não o tratamento adequado. Dessa forma, o potencial de degradação dos mananciais é muito elevado nos estados beneficiados pelo PISF, pois esse esgoto que é coletado passa a ser, muitas vezes, despejado in natura em corpos hídricos da região.

203. Dessa forma, como muitos rios na região beneficiada pelo PISF servirão de canais naturais para as águas transpostas, se o esgoto for despejado, de forma crescente em seus leitos, os benefícios do Projeto poderão dinimuir. A implementação do Projeto deverá ocasionar desenvolvimento econômico para a região, que por sua vez trará aumento no volume de esgoto gerado. Por isso, faz necessário um planejamento de obras de saneamento que permita que a qualidade da água disponibilizada não fique inviável no médio e longo prazos.

Recomendações

204. Que o MI, em articulação com o Ministério das Cidades, estude a possibilidade de:

– expandir o programa de compensação ambiental, que versa sobre o saneamento, com vistas a aperfeiçoar a coleta e o tratamento de esgoto de todas as localidades que estejam lançando seus esgotos in natura nos corpos hídricos que servirão de canal natural para as águas transpostas pelo PISF;

– apoiar os estados a elaborarem programas de recuperação do sistema de distribuição de água, com vistas à redução das perdas físicas do sistema.

Benefícios Esperados

205. Otimizar o serviço de saneamento para que não se desperdice o recurso hídrico disponibilizado pelo PISF. Permitir que a gestão da água seja realizada de forma a relacionar os aspectos de quantidade e qualidade, como determina a Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos. Baixar o custo operacional na área de abrangência do PISF, com vistas a permitir a ampliação dos benefícios do Projeto.

Indicadores de desempenho

– Percentual de captação e tratamento de esgoto nos domicílios beneficiados pelo PISF.

– Percentual de perdas de faturamento das companhias de abastecimento dos estados beneficiados pelo PISF.

Subquestão 2.7 – A modelagem proposta para a cobrança da água nos estados beneficiados permite alcançar a sustentabilidade financeira do Projeto?

206. Achado 10 – Os estados beneficiados ainda não avaliaram como garantirão para a operadora federal do sistema (Chesf-Água) o pagamento dos custos de operação, manutenção e administração do Projeto.

207. O Governo Federal está realizando as obras do PISF sem solicitar o ressarcimento do custo de investimento, isto é, os estados receptores não terão que pagar para recompor o montante do principal investido. Contudo, estipulou-se que será cobrado o pagamento dos custos de operação e de manutenção do Projeto, com vistas a garantir a sustentabilidade de sua operação.

208. Assim, para identificar formas de pagamento dos custos de operação e manutenção, o Grupo de Trabalho Interministerial (GT), constituído pelo MI, ANA e CHESF, estipulou que os pagamentos provenham de uma fonte sustentável, como por exemplo, a cobrança pelos serviços realizados pela concessionária da União (Chesf-Água).

209. Nesse sentido, o MI propôs um sistema tarifário para o PISF que se estrutura por meio de três tipos de tarifas. Para garantir a vazão firme contratada (de até 26m3/s) haverá a tarifa de demanda. Esta tarifa está relacionada apenas aos custos fixos, garantindo que os estados tenham à disposição aquela infra-estrutura de fornecimento de água bruta. Este componente independe de o estado consumir ou não a água. O segundo componente será a tarifa de consumo, referente à quantidade de água efetivamente consumida. E, por último, para o bombeamento da vazão não-contratada, haverá a tarifa de leilão.

210. Além da adequada estrutura tarifária para o PISF, é imprescindível que haja garantias de ressarcimento dos custos que a CHESF-Água venha a realizar para operar o sistema. Nesse sentido, o Relatório Final do Grupo de Trabalho Interministerial apresentou as garantias que foram relacionadas pela CHESF, quais sejam:

“IV – POSIÇÃO DA CHESF PARA ASSUMIR O PAPEL DE CONCESSIONÁRIA DA UNIÃO

….

Atendendo solicitação do GT, na reunião de 14/06/2004, a CHESF apresentou, por ordem de preferência, alternativas para a garantia desejada:

1.º Caução de numerário, em conta a ser indicada pela CHESF, de valor igual à obrigação a ser garantida; ou

2.º Cessão de direitos creditórios sobre aplicações financeiras, de valor igual à obrigação a ser garantida; ou

3.º Caução, em nome da CHESF, de títulos públicos federais (LFT’s; LTN’s; NTN’s) de valor de mercado igual a 120% da obrigação a ser garantida; ou

4.º Fiança bancária emitida por banco de primeira linha.”

211. Com relação às garantias, o Ministério da Integração Nacional apresentou, por meio do Termo de Compromisso firmado entre a União e os estados beneficiados pelo PISF, a seguinte proposta:

“Os estados deverão acordar garantias financeiras com a entidade Operadora Federal encaminhando proposta de lei ou decreto, conforme o caso, incluindo entre outras a securitização, através da cessão de direitos da parcela da água tratada bruta destacada na conta de água tratada dos usuários finais do sistema de saneamento.”

212. Cabe destacar que a garantia evidenciada pelo Termo de Compromisso somente corresponderá às opções elencadas pela CHESF se a cobrança do montante a ser inserido na conta dos usuários finais anteceder o início da operação do sistema de adução. Isto é, para que exista a caução em nome da CHESF-Água é preciso que o valor da garantia a ser dada já esteja em alguma conta bancária quando do início da operação do sistema. Por isso, é fundamental que as garantias já estejam estipuladas e implementadas antes do início do funcionamento do empreendimento.

213. Nesse sentido, os estados beneficiados têm que realizar estudos e avaliar como implementarão tais garantias, a fim de que possam enviar propostas de lei ou de decretos disciplinando a matéria. Segundo questionário enviado aos estados, todos os quatro responderam que ainda não definiram a garantia que darão à Operadora Federal (CHESF-Água). Nesse sentido, a falta de definição das garantias para a Operadora é um risco, pois demonstra que os estados ainda não avaliaram, concretamente, os impactos e as obrigações que terão que ser seguidos.

214. Nesse sentido, faz-se mister que os estados receptores procedam estudos, envolvendo as companhias de saneamento, e definam, no mais tardar, quando da definição do Sistema de Gestão de Integração de Bacias (SGIB), que deverá estar constituído até o final de 2006, qual a garantia a ser dada e como a companhia de saneamento adequará seu plano de gestão e sua estrutura tarifária à essa nova situação. É fundamental que os estados beneficiados tenham a correta medida de suas atribuições e benefícios com o PISF.

215. Em resumo, a garantia de ressarcimento dos custos de operação e manutenção, que deverá ser dada pelos estados beneficiados à CHESF-Água, é um elemento primordial para a sustentabilidade econômica-financeira do PISF. Essa garantiria induzirá os mesmos a se planejarem e a se estruturarem institucionalmente para dar o melhor aproveitamento à água aduzida. Contudo, os estados ainda não definiram concretamente como as garantias serão dadas e nem avaliaram o impacto financeiro que essas ações terão sobre suas companhias de saneamento. Nesse sentido, o risco para a sustentabilidade econômico-financeira existe, pois o processo para definição e implementação dessas garantias é lento e, também, porque um Projeto dessa magnitude e complexidade não pode iniciar sua operação sem que as garantias estejam devidamente definidas por instrumentos legais.

Recomendações

216. Que o MI elabore, conjuntamente com os estados, as avaliações e os estudos necessários para definirem as propostas de projeto de lei ou de decreto que contenham as garantias a serem dadas à CHESF-Água.

217. Que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) antes da concessão da Licença de Operação (LO) analise se os estados beneficiados pelo Projeto possuem garantias formalizadas de como se dará o ressarcimento dos custos de operação e manutenção para a Operadora Federal do Sistema – CHESF ÁGUA.

Benefícios Esperados

218. Diminuir os riscos de que o governo federal tenha que cobrir os custos operacionais e de manutenção que não forem pagos pelos estados beneficiados. Aumentar o comprometimento dos estados envolvidos em aproveitar eficientemente a água.

VI. CONCLUSÃO

219. Segundo proposta da Segecex, aprovada pelo Relator, Ministro Benjamin Zymler, a atuação do Tribunal no acompanhamento do Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográfica do Nordeste Setentrional (PISF) se dará por meio das diversas unidades técnicas e deverá ser realizado mediante auditorias, inspeções, acompanhamentos, levantamentos, monitoramentos e FOC e contará com a coordenação-geral da 4ª Secex.

220. Nesse sentido, a presente fiscalização é uma auditoria de natureza operacional e tem o propósito de avaliar se os objetivos do Projeto serão alcançados, identificando os pontos que podem ser considerados riscos, ameaças, oportunidades e medidas que devem ser tomadas para garantir os seus benefícios.

221. Conforme informações da Secretaria de Infra-Estrutura Hídrica, unidade responsável pela implementação do Projeto no Ministério da Integração Nacional, o Projeto consiste num empreendimento de infra-estrutura hídrica composto por seis trechos de canais que formam dois sistemas independentes, denominados eixos Norte e Leste. O objetivo é integrar reservatórios do Rio São Francisco a rios e açudes do nordeste setentrional (PE, PB, RN e CE), para promover a segurança hídrica da população dessa região semi-árida.

222. Concomitante à construção dos canais será criado o Sistema de Gestão da Integração das Águas do São Francisco com as Bacias do Nordeste Setentrional – SGIB, com vistas a garantir a sustentabilidade administrativa e institucional do Projeto. Esse sistema será integrado pela Operadora Federal (CHESF-Água) e pelas entidades gestoras estaduais, com responsabilidades na gestão da infra-estrutura hídrica, e conduzido por um Conselho Gestor.

223. O PISF define-se como Projeto de gestão de recursos hídricos, na medida em que objetiva equacionar parte da escassez relativa de água na região. Segundo Grigg (1996), gestão de recursos hídricos deve ser entendida como sendo a aplicação de medidas estruturais e não-estruturais para controlar os sistemas hídricos, naturais e artificiais, em benefício humano e atendendo a objetivos ambientais. Medidas estruturais são aquelas relativas a obras e as não-estruturais aquelas que referem-se à estruturação e funcionamento dos arranjos institucionais e administrativos.

224. Nesse contexto de gestão de recursos hídricos, a presente auditoria, para definir precisamente quais deveriam ser as questões investigadas, desenvolveu na fase de levantamento as técnicas de STAKEHOLDERS, análise SWOT e análise de risco. Elaborou-se duas questões que visam responder ao objetivo da auditoria, quais sejam:

QUESTÃO 1 – Em que medida o Projeto de Integração do Rio São Francisco com bacias hidrográficas do Nordeste Setentrional permitirá reduzir os impactos sociais e os gastos públicos decorrentes do flagelo da seca?

QUESTÃO 2 – A gestão da água, ou seja, as medidas estruturais e não-estruturais para controlar os sistemas hídricos nos estados beneficiados, permitirá o atingimento dos objetivos propostos no Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional?

225. A primeira questão busca identificar a abrangência do Projeto, não apenas com relação ao número de beneficiários, mas também com relação ao impacto sobre o flagelo da seca. A outra questão objetiva avaliar, dentro do atual contexto dos estados beneficiados, quais as falhas de gestão de recursos hídricos (RH) que precisam ser equacionadas até o início da operação do Projeto.

226. Para responder a esses questionamentos, a equipe de auditoria desenvolveu uma minuciosa estrutura de informações que se baseou em inquirir, com questões semelhantes, o Governo Federal (MI e ANA), os estados beneficiados e os seus respectivos municípios. Para isso, foram realizadas entrevistas e enviados questionários a 4 estados e a 391 municípios. Cabe destacar que a colaboração e a expertise de técnicos da ANA, MI e dos entes federados foram fundamentais para a consecução do presente trabalho.

227. Com relação à abrangência do PISF, constatou-se que ainda não existe infra-estrutura nos estados para atingir os 12 milhões de pessoas estimados pelo MI (item 43). Além disso, existe dissonância entre as informações disponibilizadas pelo Governo Federal, estados e municípios. Isso é grave na medida em que um entendimento realista sobre o alcance do PISF, passa, necessariamente, pela compreensão das peculiaridades de cada município beneficiado, sendo condição sine qua non para que se proceda um planejamento estratégico coerente sobre a utilização dos recursos hídricos provenientes do Projeto (item 59 deste relatório).

228. Assim, na medida em que faltam obras complementares que não estão inseridas no valor de R$ 4,5 bilhões, previstos para implementação do Projeto, não se pode dizer que a população a ser beneficiada será de 12 milhões. Isso implica dizer que a população a ser beneficiada pelo PISF, com o investimento inicialmente previsto será menor que aquela inicialmente indicada pelo Governo Federal (item 63 deste relatório).

229. Nesse sentido, a abrangência real é incerta e não alcançará a população indicada pelo MI, no ano de 2025, a não ser que medidas complementares sejam tomadas por parte do Governo Federal e dos estados e municípios participantes, visando possibilitar a criação de infra-estrutura de captação, tratamento e distribuição de água, capaz de atender às populações na região do semi-árido (item 78 deste relatório).

230. Ainda com relação a essa questão, constatou-se que não há garantias de que a redução de custos do Governo Federal com ações emergenciais de combate à seca no Nordeste será proporcional aos recursos despendidos para a implementação do PISF. Durante a auditoria, constatou-se que as ações emergenciais de combate à seca estão concentradas no auxílio a populações dispersas que, dificilmente, serão beneficiadas com a transposição (item 82 deste relatório).

231. Além disso, se considerarmos que o número de pessoas beneficiadas, no início da operação do Projeto, será de 9 milhões e que esse contingente corresponde a apenas 23% da população que ocupa o “polígono das secas”(7) , constata-se que as ações de combate e convivência com a seca perdurarão (item 84 deste relatório).

——————–

(7) Ministério da Integração Nacional, Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, Região Nordeste do Brasil em Números, Recife, Maio de 2003.

——————–

232. Outra informação importante, é que o objetivo do PISF é abranger a população na área de 10 km em volta dos eixos do Projeto, bem como as populações urbanas com mais de 50 mil hab. até 50 km dos canais. Nesse sentido, destaca-se que, segundo o Censo IBGE 2000, apenas 19 dos 391 municípios a serem beneficiados detém população urbana maior que 50 mil habitantes, ou seja, menos de 5% deles. Assim, a população rural ou aquela que compõe pequenas sedes municipais, somente seria abrangida pelo PISF se estivesse localizada até 10 km de distância dos trechos onde a água passaria. Portanto, a abrangência do Projeto não é de toda a população em um raio de 50 km dos canais, mas apenas daquela que se insira em critérios de aglomeração urbana (item 86 deste relatório).

233. Com relação à questão 2 é preciso, primeiramente, distingui-la em dois componentes, um relativo a medidas estruturais e outro a medidas não-estruturais. O primeiro componente buscou identificar riscos para o atingimento dos objetivos do Projeto quanto a obras hídricas dos estados beneficiados. Nesse sentido, a equipe de auditoria constatou que a maioria dos municípios na área de influência indireta que responderam ao questionário não possui infra-estrutura suficiente para aproveitar a água a ser disponibilizada (item 104 deste relatório). Segundo dados do questionário aos estados: no Ceará, 58% dos municípios não detêm infra-estrutura e, no Rio Grande do Norte, esse índice atingiu 71%. Além disso, 56% dos municípios da área de influência que responderam ao questionário não detêm infra-estrutura suficiente para aproveitar a água a ser disponibilizada (item 108 deste relatório).

234. Outro ponto investigado foi a previsão de obras hídricas necessárias ao aproveitamento das águas aduzidas pelo Projeto. Observou-se que os planejamentos de obras hídricas dos Estados do Ceará e do Rio Grande do Norte contemplam a questão de forma incipiente, enquanto ainda se encontram em estudo as alternativas para o aproveitamento da água a ser disponibilizada nos Estados de Pernambuco e da Paraíba. Segundo dados do questionário aos estados: no Ceará há previsão apenas para a região metropolitana de Fortaleza, por meio do Eixo de Integração Castanhão/Fortaleza (item 115 deste relatório). Além disso, em 53% dos municípios da área de influência indireta que responderam ao questionário há algum tipo de planejamento, mas em Pernambuco o índice é de apenas 15% (item 122 deste relatório).

235. Com respeito à existência de estimativas de custo dessas obras complementares, constatou-se que os Estados da Paraíba e de Pernambuco não as possuem. Segundo dados do questionário aos estados: no Ceará há estimativas apenas para o Eixo de Integração Castanhão/Fortaleza no Rio Grande do Norte há estimativas, porém não totais. Conforme dados do questionário aos municípios: em 58% deles não há estimativas, sendo que em Pernambuco o índice é de 90% (item 129 deste relatório).

236. Em suma, em relação às medidas estruturais, considera-se que a infra-estrutura hídrica atual nos estados e municípios a serem beneficiados não é suficiente para atender aos múltiplos usos previstos. Além disso, os planos estaduais não prevêem adequadamente os empreendimentos e investimentos necessários para que o Projeto alcance seus objetivos no prazo previsto. A falta de medidas estruturais e de planejamento representa um risco ao Projeto (item 136 deste relatório).

237. O segundo componente da questão 2 refere-se às medidas não-estruturais, no qual primeiramente avaliou-se a estrutura administrativa e institucional atual dos estados. Em seguida investigou-se alguns aspectos da distribuição de água e da coleta de esgoto que afetam a quantidade e a qualidade dos recursos hídricos nas bacias receptoras. Por último, analisou-se um dos principais aspectos da sustentabilidade financeira do Projeto, que é a garantia de ressarcimento à CHESF-Água (Operadora Federal do Sistema).

238. Nesse sentido, identificou-se que falhas no funcionamento e na estrutura do arranjo institucional dos estados beneficiados pelo PISF, à exceção do Ceará, geram risco para a efetividade da gestão dos recursos hídricos disponibilizados. Ressalta-se nessas falhas que não está definido o papel das companhias de saneamento. Isso se torna uma questão importante na medida em que essas empresas, todas estaduais, estão exercendo funções do órgão de gerenciamento de recursos hídricos do Estado e ao mesmo tempo são usuários do sistema (item 144 deste relatório).

239. Além disso, existe duplicidade de funções entre as secretarias estaduais responsáveis pelos recursos hídricos e o Instituto de Gestão das Águas do Rio Grande do Norte (IGARN) e a Agência Executiva de Gestão das Águas do Estado da Paraíba (AESA) (item 149 deste relatório). Outro problema é que o Estado de Pernambuco ainda não possui órgão de gerenciamento de recursos hídricos e, também, que 67% dos municípios que responderam ao questionário não têm secretarias de recursos hídricos (item 152 deste relatório).

240. Os órgãos de gerenciamento criados na Paraíba e no Rio Grande do Norte não têm competência legal que permita a cobrança e o fornecimento de garantias para cobrir os custos operacionais das águas transpostas. Segundo o Relatório 3 da FGV(8) , o IGARN e a AESA, por serem autarquias, sofrem limitações jurídicas quanto à possibilidade de realização de certas operações financeiras e comerciais (item 155 deste relatório).

——————–

(8) Estudo de Sustentabilidade Institucional Administrativa, Financeira e Operacional do Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional

——————–

241. Outra falha é que os Estados da Paraíba, Rio Grande do Norte e Pernambuco necessitam de aperfeiçoamentos na implementação na cobrança pelo uso da água e na participação social. A cobrança só está sendo empregada pelo Ceará. Neste Estado, realiza-se a cobrança por serviços prestados associados ao fornecimento de água bruta, desde 1996.

242. Com relação à questão da participação social, constatou-se que existe grande desconhecimento dos benefícios do PISF e também que os Estados da Paraíba e do Rio Grande do Norte precisam instaurar seus Comitês de Bacia Hidrográficas para que haja uma alocação participativa da água.

243. A avaliação dos aspectos da estrutura administrativa dos órgãos de gerenciamento dos estados beneficiados ficou prejudicada devido ao fato de os órgãos estarem muito incipientes (PB, RN) e por não existir (PE). Diferentemente dos demais estados, a Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Ceará – COGERH conta com uma estrutura administrativa que possibilita realizar suas atribuições legais, com 63 servidores efetivos e 349 terceirizados. Além da questão administrativa, o Estado do Ceará foi o que apresentou melhor estrutura institucional para gestão dos recursos hídricos.

244. A respeito do atingimento da segurança hídrica, identificou-se que o desperdício atual do sistema de distribuição dos estados e a contaminação dos mananciais por esgoto são fatores que podem reduzir os benefícios do Projeto. Segundo resposta dos questionários enviados aos estados, a COMPESA (PE) apresenta índice de perdas de faturamento da ordem de 55,7%. Já a Cagern (RN) apresenta índice de perdas físicas de 49% e financeiras de 36%, aproximadamente. Por sua vez, a Cagece (CE) tem perda física de 66,6% de água bruta. Por último, a Cagepa (PB) tem perdas físicas de aproximadamente 40% .

245. Com relação ao esgoto, o Estado do Ceará respondeu que apenas 25% dos domicílios têm serviço de coleta de esgoto. No Rio Grande do Norte, a taxa é de 19,4%. Na Paraíba, essa taxa corresponde à 21,6% e em Pernambuco, tem-se que apenas 17% da população é beneficiada com coleta de esgoto. Esses números se agravam ainda mais, pois, em sua maior parte, representam, apenas, que existe a coleta de esgoto e não o tratamento adequado. Dessa forma, o potencial de degradação dos mananciais é muito elevado nos estados beneficiados pelo PISF, pois esse esgoto que é coletado passa a ser, muitas vezes, despejado in natura em corpos hídricos da Região (item 202 deste relatório).

246. Com relação às garantias de ressarcimento, os estados beneficiados ainda não avaliaram como garantirão para a operadora federal do sistema (Chesf-Água) o pagamento dos custos de operação, manutenção e administração do Projeto. Nesse sentido, os estados beneficiados tem que realizar estudos para avaliar como implementarão tais garantias, para que possam enviar propostas de lei ou de decretos disciplinando a matéria. Segundo questionário, todos responderam que ainda não definiram a garantia que darão à Operadora Federal (CHESF-Água). Assim, a falta de definição das garantias para a Operadora Federal é um risco, pois demonstra que os estados ainda não avaliaram, concretamente, os impactos e as obrigações que terão que ser seguidos.

247. Conclui-se, com a análise das duas questões propostas pela auditoria, que não há garantias de que o PISF atingirá seus objetivos que são o de atender a uma população de 9 milhões de pessoas no início da operação e o de garantir segurança hídrica para as bacias receptoras.

248. Os benefícios do Projeto, que foram apresentados pelo Ministério da Integração Nacional no EIA/RIMA, para serem efetivos, necessitam que os estados beneficiados tenham infra-estrutura hídrica e capacidade administrativa e institucional necessárias para gerirem as águas transpostas. Contudo, conforme observou-se na auditoria, os estados beneficiados, em diferentes graus, precisam complementar sua infra-estrutura hídrica e adequar sua gestão.

249. Além disso, os custos orçados pelo MI, aproximadamente 4,5 bilhões, não incluem os gastos necessários às obras complementares. Dessa forma, observa-se um quadro no qual os benefícios incluem um conjunto de ações que o MI não sabe como e quando serão realizadas. Nesse sentido, utilizando-se a estrutura de uma análise custo/benefício, teríamos um resultado enviesado, na medida em que os benefícios estão superestimados e os custos subestimados.

250. As recomendações presentes neste relatório visam adequar alguns aspectos considerados como críticos e que ameaçam o atingimento dos benefícios a serem ofertados pelo PISF. Em que pese o fato de que o Projeto só entrará em operação daqui a alguns anos, é imprescindível que as medidas sugeridas sejam implementadas a curto prazo, pois, tanto as relativas à obra quanto às de gestão, necessitam de um período longo para que sejam efetivamente operacionalizadas. Como exemplo disso, podemos citar o Estado do Ceará, que pratica a melhor gestão de RH entre os estados receptores, e que demorou quase uma década para conseguir estruturar e fazer funcionar sua gestão de recursos hídricos.

VII. COMENTÁRIOS DOS GESTORES

251. Com vistas à implementação da última etapa da metodologia das Auditorias de Natureza Operacional (Anop), encaminhou-se a versão preliminar deste relatório de auditoria à Secretaria de Infra-estrutura Hídrica do Ministério da Integração Nacional, ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis e à Agência Nacional de Águas para que comentassem acerca da Proposta de Encaminhamento.

252. De modo geral, os gestores ressaltaram a pertinência das recomendações propostas pelo TCU, bem como a identificação destas com as medidas já planejadas para o empreendimento (fls. 62/68, Volume Principal). Cabe destacar, entre os comentários recebidos, a observação procedente da Nota Técnica n.°004/2006 – PSF/SIH/MI no sentido de que as recomendações são válidas, oportunas e coincidentes às exigências do Ibama e da ANA, e que já se encontram de certa forma incorporadas à implementação do Projeto.

VIII. PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO

Ante todo o exposto, submetemos os autos à consideração superior, com vistas ao encaminhamento do presente processo ao Ex.mo Senhor Ministro Relator, propondo, com fulcro no art. 43, inciso I, da Lei 8.443/92 e no art. 250, incisos II e III, do Regimento Interno do TCU:

I – Recomendar ao Ministério da Integração Nacional que:

I.1 – providencie uma avaliação, juntamente com estados e municípios, sobre o real alcance populacional do Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF), bem como sobre a previsão de tempo necessário para que se alcance a população inicialmente projetada (item 79);

I.2 – realize estudos demonstrando a correlação entre os gastos de programas de ações emergenciais de combate à seca e sua diminuição decorrente da implementação do PISF (item 94);

I.3 – elabore um Plano de Atividades que integre as ações do PISF com outros Programas do Governo Federal, como, por exemplo, o Programa de Suprimento de Água para Populações Rurais e Urbanas e o Programa de Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Semi-árido – Conviver (item 95);

I.4 – elabore com estados e municípios o levantamento das obras complementares na área de influência indireta antes do início da implantação física do empreendimento, bem como as respectivas formas de financiamento, estimativas de custo e cronograma de execução (item 113);

I.5 – insira no convênio que dará origem ao “Pacto pela Sustentabilidade do PISF” a listagem das obras complementares que receberão apoio do Governo Federal (item 125);

I.6 – considere os custos das obras complementares no cálculo para atingir os objetivos do Projeto (item 137);

I.7 – implemente uma Unidade de Gerenciamento do Projeto (UGP), nos moldes da que existe no Proágua, com os componentes de Infra-estrutura Hídrica, de Gestão e de Revitalização, definindo rubrica orçamentária para cada um dos componentes (item 161);

I.8 auxilie e oriente os órgãos estaduais, dentro do componente Gestão da UGP que vier a ser criada, quanto à:

a) definição do papel das companhias de saneamento dos estados com relação à sua participação na distribuição da água bruta (item 162);

b) organização do marco regulatório com distinção entre as atribuições dos órgãos responsáveis pelo gerenciamento dos Recursos Hídricos e as Secretarias Estaduais responsáveis pela gestão hídrica (item 162);

c) definição de como os estados operacionalizarão as garantias comerciais e financeiras que serão exigidas pela Operadora Federal do Sistema (Chesf-água) (item 162);

d) elaboração de planos de gerenciamento das bacias hidrográficas (item 180);

e) aprimoramento da legislação ambiental no que tange à regulamentação do instrumento de cobrança pelo uso da água nos estados (item 180).

I.9 – crie um fórum de usuários nos moldes do Grupo Multiparticipativo do Castanhão, criado pelo Decreto Estadual 23.758/95 do Ceará (item 182);

I.10 – quando da assinatura de convênios, ou instrumentos congêneres, para a construção de obras complementares ao PISF nos estados beneficiados, condicione a liberação dos recursos à exigência de estruturação administrativa dos órgãos responsáveis pela gestão de recursos hídricos (item 192);

I.11 – estude a possibilidade, em articulação com o Ministério das Cidades, de:

a) expandir o programa de compensação ambiental, que versa sobre o saneamento, com vistas a aperfeiçoar a coleta e o tratamento de esgoto de todas as localidades que estejam lançando seus esgotos in natura nos corpos hídricos que servirão de canal natural para as águas transpostas pelo PISF (item 204);

b) apoiar os estados a elaborarem programas de recuperação do sistema de distribuição de água, com vistas à redução das perdas físicas do sistema (item 204;

I.12 – elabore, conjuntamente com os estados, as avaliações e os estudos necessários para definirem as propostas de projeto de lei ou de decreto que contenham as garantias a serem dadas à Chesf-água (item 216).

II – Recomendar à Agência Nacional de Águas (ANA) que:

II. 1 – estude a possibilidade de incluir um componente de Gestão de Recursos Hídricos no novo Proágua, de forma a complementar as ações da UGP, especificamente para:

a) estruturar as instituições que fazem parte do sistema que utilizará as águas transpostas pelo PISF (item 163);

b) fortalecer a participação social por meio da estruturação dos comitês da Bacia de Integração independente dos rios serem de domínio dos estados (item 181);

III – Recomendar ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) que:

III.1 – antes da concessão da Licença de Operação (LO) analise se os estados beneficiados pelo Projeto possuem garantias formalizadas de como se dará o ressarcimento dos custos de operação e manutenção para a Operadora Federal do Sistema – Chesf-água (item 217);

IV – Juntar o presente processo, após a devida apreciação, ao TC n.º 004.375/2005-7, conforme determinado no Memorando-Circular n.º 12/2005-Segecex.

V – Encaminhar cópia deste relatório e da decisão que vier a ser prolatada, bem como do relatório e do voto que a fundamentarem: ao Ministro de Estado do Ministério da Integração Nacional; ao Ministro de Estado do Meio Ambiente; ao Presidente do Congresso Nacional, ao Presidente da Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal, ao Presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados, ao Presidente do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis e ao Presidente da Agência Nacional de Águas.”

2. O Sr. Chefe do Serviço de Controle da Gestão Ambiental endossou a proposta da equipe de auditoria e acrescentou a sugestão de que se proceda ao monitoramento da deliberação que vier a ser proferida.

3. O Sr Secretário pôs-se de acordo com a proposta de encaminhamento fornecida pelo Sr. Diretor.

É o Relatório.

Voto do Ministro Relator

O Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF) prevê a confecção de seis canais que formarão dois sistemas independentes, denominados eixos Norte e Leste. Tem como objetivo fundamental integrar reservatórios do Rio São Francisco a rios e açudes do Nordeste setentrional e, com isso, promover a “segurança hídrica da população” dessa região. Esse Projeto demandará a aplicação de recursos que superam os R$ 4,5 bilhões.

2. O acompanhamento desse Projeto de Integração tem demandado a realização de auditorias, inspeções, levantamentos e monitoramentos. O TCU, por meio do Acórdão n.º 879/2005 – Plenário, que aprovou o Plano de Auditoria para o 2º semestre de 2005, determinou a realização de auditoria de natureza operacional, com a finalidade de avaliar as perspectivas de alcance dos objetivos do Projeto e também com a finalidade de identificar aspectos de riscos, ameaças, oportunidades e as medidas que devam ser tomadas para garantir a consecução dos benefícios pretendidos.

3. Consoante destacado no Relatório supra, foi desenvolvida metodologia para exame dos itens componentes da obra e também do sistema de gestão a ser implementado para aproveitamento das águas transpostas. Foram avaliadas informações obtidas mediante visitas de campo, questionários dirigidos aos municípios e estados beneficiados, bem como entrevistas com especialistas em recursos hídricos da Agência Nacional de Águas (ANA) e do Ministério da Integração Nacional (MI). A partir dos achados obtidos, buscou-se delimitar a abrangência do Projeto (número de beneficiários, impacto sobre a seca) e apontar falhas no planejamento de obras complementares e na gestão de recursos hídricos.

4. Conforme se depreende do logicamente estruturado Relatório de Auditoria transcrito no Relatório que antecede este Voto, merecem destaque os achados que embasam a conclusão de que a população diretamente atendida pelo Programa, com o montante de recursos previstos para o empreendimento, será menor do que a estimada pelo Governo Federal e que, devido à dispersão da população no semi-árido, os custos de ações emergenciais de combate à seca perdurarão após a conclusão do Projeto.

5. Além disso, a infra-estrutura dos estados e municípios não seria suficiente para atender aos usos múltiplos da água previstos. A programação desses estados também não prevê os investimentos que seriam necessários para que o empreendimento alcance seus objetivos no prazo previsto. Merece destaque, também, a conclusão de que as falhas e indefinições institucionais, administrativas, na distribuição da água e coleta de esgoto e nas garantias que serão dadas à operadora do sistema, caso não sejam equacionadas, colocariam os benefícios do Projeto em risco.

6. Ao final são sugeridas a realização de medidas com o intuito de que se proceda:

I – à avaliação do real alcance populacional do Projeto;

II – à confecção de “Plano de Atividades que integre as ações do Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF) com outros Programas do Governo Federal de convivência com o problema das secas no semi-árido”;

III – ao dimensionamento das obras complementares, situadas na área de influência indireta do Projeto, anteriormente ao início da implantação do empreendimento;

IV – à implementação de Unidade de Gerenciamento do Projeto (UGP), com os componentes de Infra-Estrutura Hídrica, de Gestão e de Revitalização, que deverão ser financiados com recursos consignados em rubricas orçamentárias específicas para cada um desses componentes;

V – “à criação de fórum de usuários para discussão do alcance e dos benefícios do Projeto”.

7. Anoto, em especial, que o conteúdo do Relatório de Auditoria acima transcrito foi previamente submetido, sob a forma de Relatório preliminar, ao Ministério da Integração Nacional, à Agência Nacional de Águas e ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), a fim de obter desses entes comentários que entendessem pertinentes. Em resposta aos respectivos ofícios, pronunciaram-se no sentido de considerar, em linhas gerais, adequadas as conclusões da Unidade Técnica. Em seguida, registro a essência desses pronunciamentos:

I – a ANA asseverou não ter comentários a fazer sobre o Relatório em questão e que estão sendo desenvolvidas ações que vão ao encontro das sugestões contidas no referido Relatório preliminar.

II – o IBAMA, a despeito de considerar que caberia à ANA avaliar se os estados beneficiados pelo Projeto possuem garantias formalizadas de como se dará o ressarcimento dos custos de operação e manutenção para a Operadora Federal do Sistema – CHESF-Água, compromete-se a verificar o cumprimento das recomendações a serem dirigidas à ANA.

III – o Ministério da Integração Nacional, principal destinatário das medidas propostas de recomendações, apesar de afirmar que a população a ser beneficiada no horizonte previsto (2025) corresponderia efetivamente àquela estimada – 12 milhões de habitantes -, que existe um sistema adutor para o agreste de Pernambuco que ampliará o número de beneficiários e de efetuar outras ressalvas, que o Projeto trará inúmeros e importantes benefícios e de efetuar algumas outras ressalvas, não acusa inconsistência nas propostas de recomendações apresentadas. Registra esse órgão, inclusive, que:

“No geral, as recomendações do TCU são válidas e oportunas, embora, em sua maioria, já tenham sido objeto de avaliação e, inclusive, de processo de implementação parcial.”

8. Concordo, em linhas gerais, com a proposta de encaminhamento fornecida pela equipe de auditoria e endossada pelo Sr. Chefe do Serviço de Controle da Gestão Ambiental e pelo Sr. Secretário da 4ª SECEX. Além de haver identificado e avaliado achados relevantes, a equipe extraiu deles conclusão ponderada e consistente. As sugestões contidas na proposta da equipe técnica instigam os órgãos que são delas destinatários, em especial o Ministério da Integração Nacional, a demonstrar a consistência de suas ações, a buscar a efetiva interação entre os entes da federação afetados, a relacionar as referidas obras complementares, a estabelecer requisitos para celebração de convênios entre União e entes beneficiários.

9. Impõe-se, portanto, a implementação dessa proposta, na forma apresentada pela equipe técnica. Efetuo, apenas ligeira ressalva, em relação a uma das sugestões apresentadas, consoante explicitado em seguida. Foi sugerida a realização da seguinte recomendação ao IBAMA:

”III.1 – antes da concessão da Licença de Operação (LO) analise se os estados beneficiados pelo Projeto possuem garantias formalizadas de como se dará o ressarcimento dos custos de operação e manutenção para a Operadora Federal do Sistema – Chesf-água”

.

10. Ocorre que tal avaliação insere-se no conjunto de competências da ANA, conforme anotado pelo IBAMA em ofício dirigido à equipe do TCU. Por isso, impõe-se direcioná-la a essa Agência e a requerer ao IBAMA que verifique o cumprimento das sugestões a ela dirigidas. Observo, inclusive, que o IBAMA já se comprometeu, antecipadamente, a efetuar esse acompanhamento.

Ante o exposto, Voto por que o Tribunal adote o Acórdão que ora submeto ao Plenário.

TCU, Sala das Sessões, em 1º de novembro de 2006.

BENJAMIN ZYMLER

Relator

Acórdão

VISTOS, relatados e discutidos este Relatório de Auditoria Operacional no Projeto de Integração do Rio São Francisco com bacias hidrográficas do Nordeste Setentrional, os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão do Plenário, ACÓRDAM em:

9.1. recomendar ao Ministério da Integração Nacional que:

9.1.1. providencie uma avaliação, juntamente com estados e municípios, sobre o real alcance populacional do Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF), bem como sobre a previsão de tempo necessário para que se alcance a população inicialmente projetada (item 79 da instrução transcrita no Relatório supra);

9.1.2. realize estudos demonstrando a correlação entre os gastos de programas de ações emergenciais de combate à seca e sua diminuição decorrente da implementação do PISF (item 94 da referida instrução);

9.1.3. elabore um Plano de Atividades que integre as ações do PISF com outros Programas do Governo Federal, como, por exemplo, o Programa de Suprimento de Água para Populações Rurais e Urbanas e o Programa de Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Semi-árido – Conviver (item 95);

9.1.4. elabore com estados e municípios o levantamento das obras complementares na área de influência indireta antes do início da implantação física do empreendimento, bem como as respectivas formas de financiamento, estimativas de custo e cronograma de execução (item 113);

9.1.5. insira no convênio que dará origem ao “Pacto pela Sustentabilidade do PISF” a listagem das obras complementares que receberão apoio do Governo Federal (item 125);

9.1.6- considere os custos das obras complementares no cálculo para atingir os objetivos do Projeto (item 137);

9.1.7- implemente uma Unidade de Gerenciamento do Projeto (UGP), nos moldes da que existe no Proágua, com os componentes de Infra-estrutura Hídrica, de Gestão e de Revitalização, definindo rubrica orçamentária para cada um dos componentes (item 161);

9.1.8. auxilie e oriente os órgãos estaduais, dentro do componente Gestão da UGP que vier a ser criada, quanto à:

9.1.8.1. definição do papel das companhias de saneamento dos estados com relação à sua participação na distribuição da água bruta (item 162);

9.1.8.2. organização do marco regulatório com distinção entre as atribuições dos órgãos responsáveis pelo gerenciamento dos Recursos Hídricos e as Secretarias Estaduais responsáveis pela gestão hídrica (item 162);

9.1.8.3. definição de como os estados operacionalizarão as garantias comerciais e financeiras que serão exigidas pela Operadora Federal do Sistema (Chesf-água) (item 162);

9.1.8.4. elaboração de planos de gerenciamento das bacias hidrográficas (item 180);

9.1.8.5. aprimoramento da legislação ambiental no que tange à regulamentação do instrumento de cobrança pelo uso da água nos estados (item 180).

9.1.9. crie um fórum de usuários nos moldes do Grupo Multiparticipativo do Castanhão, criado pelo Decreto Estadual 23.758/95 do Ceará (item 182);

9.1.10. quando da assinatura de convênios, ou instrumentos congêneres, para a construção de obras complementares ao PISF nos estados beneficiados, condicione a liberação dos recursos à exigência de estruturação administrativa dos órgãos responsáveis pela gestão de recursos hídricos (item 192);

9.1.11. estude a possibilidade, em articulação com o Ministério das Cidades, de:

9.1.11.1. expandir o programa de compensação ambiental, que versa sobre o saneamento, com vistas a aperfeiçoar a coleta e o tratamento de esgoto de todas as localidades que estejam lançando seus esgotos in natura nos corpos hídricos que servirão de canal natural para as águas transpostas pelo PISF (item 204);

9.1.11.2. apoiar os estados a elaborarem programas de recuperação do sistema de distribuição de água, com vistas à redução das perdas físicas do sistema (item 204);

9.1.12. elabore, conjuntamente com os estados, as avaliações e os estudos necessários para definirem as propostas de projeto de lei ou de decreto que contenham as garantias a serem dadas à Chesf-água (item 216).

9.2. recomendar à Agência Nacional de Águas (ANA) que:

9.2.1. estude a possibilidade de incluir um componente de Gestão de Recursos Hídricos no novo Proágua, de forma a complementar as ações da UGP, especificamente para:

9.2.1.1. estruturar as instituições que fazem parte do sistema que utilizará as águas transpostas pelo PISF (item 163);

9.2.1.2. fortalecer a participação social por meio da estruturação dos comitês da Bacia de Integração independente dos rios serem de domínio dos estados (item 181);

9.2.1.3. antes da concessão da Licença de Operação (LO) analise se os estados beneficiados pelo Projeto possuem garantias formalizadas de como se dará o ressarcimento dos custos de operação e manutenção para a Operadora Federal do Sistema – Chesf-água (item 217);

9.3. recomendar ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) que acompanhe a implementação pela ANA das providências contidas no subitem 9.2 deste Acórdão;

9.4. apensar o presente processo ao TC n.º 004.375/2005-7, em conformidade com o que prescreve o Memorando-Circular n.º 12/2005-Segecex.

9.5. encaminhar cópia deste Acórdão, assim como do Relatório e do Voto que o fundamentam ao Ministro de Estado do Ministério da Integração Nacional; ao Ministro de Estado do Meio Ambiente; ao Presidente do Congresso Nacional, ao Presidente da Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal, ao Presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados, ao Presidente do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis e ao Presidente da Agência Nacional de Águas.

Quorum

13.1. Ministros presentes: Guilherme Palmeira (Presidente), Valmir Campelo, Walton Alencar Rodrigues, Ubiratan Aguiar e Benjamin Zymler (Relator).

13.2. Auditores convocados: Augusto Sherman Cavalcanti e Marcos Bemquerer Costa.

Publicação

Ata 44/2006 – Plenário
Sessão 01/11/2006
Aprovação 03/11/2006
Dou 06/11/2006 – Página 0

Referências (HTML)
Documento(s):TC-019-081-2005-4.doc

[ https://contas.tcu.gov.br/portaltextual/MostraDocumento?lnk=(2017/2006+e+plenario)[idtd][b001] ]

in www.EcoDebate.com.br – 10/11/2006