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Editorial

A democratização do acesso à água é possível. Basta querer. Por Henrique Cortez

Aparentemente o governo federal aceitou reabrir o diálogo e as discussões em relação à transposição do rio São Francisco em razão da greve de fome de Dom Luis Cappio.

Mas, pelas seguidas declarações, parece não ser verdade, pelo menos em vista das afirmações dos ministros Jaques Wagner e Ciro Gomes, que, de fato, reafirmam que a obra será iniciada.

Vejam, por exemplo, as matérias publicadas no Globo Online e no Estadão Online, que demonstram a real intenção da pretensa proposta de diálogo.

Até agora, a sociedade civil tentou se expressar e questionar a obra, mas não foi ouvida, seguindo a histórica tradição das audiências públicas, nas quais todos podem falar, mas não há qualquer compromisso real de que sejam ouvidos.

O ministro Ciro Gomes sempre que pode ,reafirma que “Eu preciso desesperadamente que a crítica se qualifique.” . É mais uma das incontáveis manifestações de soberba, porque a crítica é mais do que qualificada, considerando as opiniões, sugestões e críticas de pesquisadores com o quilate de Aziz Ab´Sáber, Aldo Rebouças, João Abner, João Suassuna. Isto sem falar das qualificadas e bem fundamentadas críticas do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, do Fórum Permanente de Defesa do São Francisco, da Comissão Pastoral da Terra, da ASA e mais de 1000 entidades e instituições que atuam no semi-árido brasileiro.

Não é a crítica que precisa se qualificar, mas é a defesa por parte do governo que, de fato, não se sustenta.

Seguindo o permanente tom de equívoco e desinformação, o ministro Jaques Wagner diz que …” – Qual é nossa sensação? De que nosso projeto não está conhecido. Por que na carta, o bispo diz: “o projeto é para beneficiar grandes empreendedores, porque 70% da água dele é para isso, como está escrito no projeto”. Alguém mostrou para o bispo, que é um homem honesto e de boa-fé, um projeto falso…”

O bispo Dom Luis Cappio viu o projeto verdadeiro. De acordo com o projeto, a transposição foi concebida como um projeto de segurança hídrica, isto é, para aumentar a segurança operacional dos níveis dos grandes reservatórios do nordeste setentrional. E 70% da água dos reservatórios de destino é destinada à agricultura irrigada, majoritariamente de grandes empreendimentos. Se a lógica de uso dos reservatórios for (e será) a mesma que atual, o agronegócio irrigado será o grande beneficiado da transposição. Nem mais, nem menos.

Assim, se alguém leu e não entendeu, certamente não foi Dom Luiz Cappio.

O argumento de “levar água a quem tem sede” não é verdadeiro exatamente por causa do uso atual dos reservatórios. A açudagem nordestina possui uma capacidade de acumulação de água superior a 30 bilhões de metros cúbicos e isto nada significou para acabar com a tragédia do acesso à água.

Existe disponibilidade hídrica, mas o acesso à água é um dos mais injustos e excludentes do mundo.

O presidente Lula realmente pode deixar a sua marca na história, transformando o semi-árido brasileiro, fazendo o que o nordeste realmente quer e precisa:
* Gerenciamento integrado (sistêmico) dos “estoques” de água;
* Regularização fundiária e acesso à terra;
* Democratização do acesso à água; e
* A discussão de um modelo de desenvolvimento estruturado na agricultura familiar, de acordo com a convivência com a seca.

A democratização do acesso à água é possível. Basta querer.

Henrique Cortez, henriquecortez@ecodebate.com.br
Coordenador do Portal EcoDebate

Ministro reafirma compromisso do governo com revitalização do São Francisco

O Globo
Globo Online
GloboNews TV
CBN
In http://oglobo.globo.com/online/pais/170166912.asp

BRASÍLIA, RECIFE e SALVADOR – O ministro de Relações Institucionais, Jaques Wagner, afirmou nesta sexta-feira que serão cumpridos todos os compromissos assumidos com o bispo franciscano da cidade baiana de Barra, dom Luiz de Cappio, que ficou 11 dias em greve de fome em protesto contra o projeto de transposição das águas do Rio São Francisco.

– Falei nesta seta-feira com o bispo em razão de ruídos de comunicação e reafirmei, para tranqüilizá-lo, que tudo o que foi escrito nas cartas de entendimento, que já estão com o presidente da República, é um compromisso. O debate vai acontecer.

Wagner disse ainda que o governo vai continuar com o projeto de revitalização do rio, que está em marcha.

– Vamos trabalhar para aprovar a PEC que vai destinar R$ 300 milhões por ano, durante 20 anos, para a revitalização – garantiu.

O ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, disse que alguém mostrou ao bispo uma versão falsa do projeto de transposição.

– Qual é nossa sensação? De que nosso projeto não está conhecido. Por que na carta, o bispo diz: “o projeto é para beneficiar grandes empreendedores, porque 70% da água dele é para isso, como está escrito no projeto”. Alguém mostrou para o bispo, que é um homem honesto e de boa-fé, um projeto falso.

O ministro disse ainda que não vê problemas em alterar o projeto se concluir-se, durante os debates, que isso é conveniente:

– Podemos alterar o projeto, não tem problema nenhum, se numa discussão honesta e qualificada se perceba qualquer erro que tenhamos cometido. Não queremos fazer nada errado. Mas parte do calor do antagonismo que se levanta tem motivação subalterna de razão político-eleitoral.

Dom Cappio ainda não decidiu o dia em que viajará a Brasília para se encontrar com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O bispo, de 59 anos, vai se recuperar da greve de fome na casa de irmãos em São Paulo. Nesta sexta, ele tomou dois litros de soro, bebeu água de coco e se alimentou também com uma sopa de legumes.

Dom Cappio tomou a decisão de interromper a greve na tarde desta quinta-feira, após conversa de mais de três horas com o ministro Jaques Wagner. A carta de Lula para o bispo, levada pelo ministro, incluía quatro propostas para fazer o religioso desistir da greve de fome: o prolongamento do diálogo sobre o São Francisco; o compromisso de prioridade para revitalização e saneamento; o empenho para a PEC da revitalização; e a discussão do assunto numa audiência com o presidente Lula em Brasília.

– Considerando um gesto de grandeza do senhor presidente, dar continuidade ao diálogo na fase anterior ao início da possível execução das obras de transposição de águas do Rio São Francisco, declaro: fica suspenso meu jejum em favor da vida – disse dom Luiz Cáppio, na quinta-feira.

Wagner informou que o presidente Lula aprovou o acordo, mas que uma suspensão definitiva da obra, como queria o bispo, não foi discutida:

– Não houve nem essa palavra, nem a palavra adiamento em nenhuma declaração.

O governo argumenta, a favor da obra, que ela vai beneficiar 12 milhões de pessoas, levando água para áreas de seca em Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Os críticos do projeto alegam que é preciso antes fazer a revitalização do rio, muito atingido pelo assoreamento e correndo o risco, em diversos trechos, de secar.

Debate não adia obras no São Francisco, diz Ciro
In http://www.estadao.com.br/nacional/noticias/2005/out/07/158.htm

Brasília – O ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, disse nesta sexta-feira, em entrevista coletiva, que o governo ainda mantém a perspectiva de iniciar em novembro as obras de transposição do Rio São Francisco e que, até lá, o diálogo com a sociedade sobre o assunto deverá estar maduro.

O ministro atacou alguns dos críticos do projeto, como o governador de Sergipe, João Alves (PFL), a quem chamou de “neoambientalista”. Ciro disse que muitas das críticas ao projeto vêm de pessoas “bastante mesquinhas, que nunca se preocuparam com a vida do Rio São Francisco, com a questão ambiental e com as populações pobres, que sempre foram algozes e oligarcas, e se apresentam hoje em linha com a questão ambiental, com a ordem socio-econômica.”

O ministro da Integração disse que o governo está disposto a negociar alterações no projeto, caso as argumentações de quem as defende sejam consideradas corretas.

Ao mencionar novembro como data provável do início das obras, Ciro comentou que ainda há etapas a serem vencidas, como, por exemplo, derrubar a liminar que impede que o Ibama conceda autorização para o início das obras.

Segundo o ministro, há reações emocionais, de boa-fé, e outras, oportunistas. Ele disse que fica “em pânico” com a falta de preocupação com o fato de que “é necessário levar água para quem não tem.”

O ministro disse que há muita desinformação na sociedade sobre o projeto do São Francisco. E ironizou: “Eu preciso desesperadamente que a crítica se qualifique.”
Gilse Guedes