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A BR-163 e o Baixo Parnaíba: a luta de cada um, por Mayron Régis

Em se tratando da Sra. Dilma Roussef, Ministra-Chefe da Casa Civil, venhamos e convenhamos que, pelo lado do atual governo, ela surpreende por exercer seu papel sem que sua imagem atraia os holofotes da mídia para onde quer que vá – nenhuma imagem sua parece combinar com o exercício do poder e da administração pública. Isso talvez decorra do seu estilo meio espartano, de não abrir mão dos seus ideais nem pro trem, aspectos que se explicitavam na época em que era Ministra das Minas e Energia e que se explicitam nas poucas vezes que jornalistas a entrevistaram. É bem visível da parte dela uma sobriedade impermeável, como da vez em que perguntaram, logo depois de um blecaute em Nova Iorque, se o Brasil corria o risco de um apagão – artimanhas de jornalistas que fazem colagens de realidades díspares para ouvir mais do que perguntaram, como, por exemplo, uma explanação sobre a falta de investimentos na área de infra-estrutura. Não, não há esse perigo, ela respondeu, prendendo-se apenas à pergunta. Claramente, para a ministra, um desígnio separa a sua função de funcionária pública desse qüiproquó todo, desse disse-que-me-disse, que a mídia faz tão bem, na hora de defender os seus interesses e os da sua classe: o desígnio de um Estado que proveja os cidadãos daqueles bens que garantam bem-estar social e material.

Bem, a sua gestão no Ministério das Minas e Energia se projetou nos cenários nacional e internacional por desmontar o modelo energético anterior, no qual as empresas que se propunham a investir não corriam riscos, por dar corda aos projetos hidrelétricos e por se impacientar com os ambientalistas. Com a saída do deputado federal José Dirceu da Casa Civil, Dilma Roussef aceitou o convite do presidente e assumiu a pasta que coordena várias discussões dentro do governo, principalmente, aquelas com mais repercussão na opinião pública como as dos licenciamentos de empreendimentos hidrelétricos, a da construção da usina nuclear de Angra 3 e a do desmatamento na Amazônia. Nestas três discussões, e em outras tantas, a mão de ferro do ex-ministro José Dirceu, sobre a mesa da Casa Civil, guiava os estudos e as conclusões, sufocando quaisquer divergências políticas e teóricas que saíssem dos seus confrades ministeriais. A esteira da convergência entre ministérios divergentes foi que obras públicas estavam paralisadas por problemas ambientais e econômicos travando o crescimento econômico e social do país – a problemática ambiental como um item esporádico na análise desenvolvimentista sempre foi uma constante. Sob a batuta da Casa Civil, e num esforço em comum, deu-se, então, a largada para que o licenciamento, que competia ao Ibama, fosse retomado e a liberação ocorresse a tempo das obras saírem do papel neste governo.

Digamos de outro jeito. No interesse de tirar do papel todas as obras paralisadas e de agradar a gregos e troianos, o governo adotou o discurso das grandes obras, de quanto mais obras melhor e de que todas estas obras gerariam empregos, respeitariam o meio ambiente e os direitos das populações que serão atingidas. Contudo, a corda sempre quebra do lado mais fraco. Com um olho nas taxas de desmatamento e com o outro no asfaltamento da BR-163 – as benesses propaladas de desenvolvimento econômico e de desenvolvimento sustentável – o governo, pretende criar, em parceria com o governo do estado do Pará, nove unidades de conservação, divididas nas Florestas Nacionais de Trairão, Amaná, do Crepori e do Jamanxim, nos Parques Nacionais do Jamanxim e do Rio Novo e a Área de Proteção Ambiental Tapajós. As Florestas Nacionais são áreas de uso sustentável e os Parques Nacionais são áreas de proteção integral. Para as primeiras serão 7.000.000 de hectares e para as segundas serão 1.000.000. Sobrarão para as atividades agropecuárias, aí entrando tanto grandes pecuaristas como pequenos proprietários, mais de 2.000.000 hectares, dos quais 80% estarão destinados às áreas de reserva legal. Disciplinar o uso da terra com a criação de unidades de conservação é a principal resposta do governo, através da Casa Civil e de outros ministérios, para quem o criticava de omisso e infeliz nas ações de combate ao desmatamento. Outra razão estaria em transformar as relações econômicas e sócias: volta-las para um extrativismo sofisticado e menos predatório em vez do extrativismo e da agricultura tradicionais que devastam a floresta.

Restringindo a atividade agropecuária, nisto inclui a agricultura familiar, em pouco mais de 200.000 hectares o governo aposta na transformação, em curto espaço de tempo, de agricultores e extrativistas que devastam para sobreviver em agricultores e extrativistas que preservam para sobreviver. O que talvez consiga seja a desocupação de lotes por parte de seus donos que se dirigirão para outras áreas que possam atuar economicamente sem limites interpostos por uma lei.
A discussão sobre a Amazônia e o uso dos seus recursos naturais, como de outros biomas, simplificou-se na polêmica da preservação: quem é a favor e quem é contra. O que se deveria discutir são as formas de ocupação e como ordena-las. Isso não vem sendo feito, porque aqueles que têm poder econômico definem como aquela terra será aproveitada. Esse é o caso exemplar pelo qual passam os Cerrados já faz três décadas.

No fim de agosto, a sede do STR de Chapadinha, Baixo Parnaíba maranhense, esteve lotada de trabalhadores rurais que, de suas casas, de suas famílias, de suas comunidades, de seus municípios, com pouco ou muito a dizer, haviam se dirigido para endireitarem, na certeza do dever, aquilo que muito estava errado. Contariam o que viram e o que escutaram na hora da angústia. Eles não seriam a platéia, pois esta viera de longe, do Rio de Janeiro e de Brasília, sob o nome de Plataforma Dhesc, para, ao ouvi-los, responderem que o errado não podia continuar vencedor: mais de um milhão de hectares nas mãos dos sojicultores e mais de cinqüenta mil hectares desmatados – a ocupação dos Cerrados pela soja e outros monocultivos, além de tirar a ocupação de um monte de gente, desocupa as terras de gente, de animais e de plantas.

Os relatores responderam com um relatório sobre as agressões praticadas contra as populações e contra o meio ambiente do Baixo Parnaíba, o qual foi enviado para a Ministra Dilma Roussef, pedindo a criação de uma força tarefa interministerial e interinstitucional contando com a participação de representações do Ministério Público Federal, dos Ministérios Públicos dos Estados do Maranhão e Piauí, dos Governos dos Estados do Maranhão e Piauí, dos Municípios envolvidos, de entidades da sociedade civil e representações das populações afetadas para fazer um inventário detalhado de toda a situação fundiária, ambiental e de violações de Direitos Humanos, analisando todas as denúncias já apresentadas, e que se responsabilize pela elaboração de propostas concretas que promovam a reparação de violações já ocorridas e garantam a implementação e o monitoramento de um projeto de desenvolvimento humano sustentável para a região, balizado no respeito aos direitos humanos da população local.

Mayron Régis, jornalista. Articulação Soja – Brasil/Cebrac

In Portal EcoDebate, www.ecodebate.com.br, 10/10/2005

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