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Artigo

O avanço do voto conservador e a difícil capacidade de reação do movimento popular brasileiro (2), por Bruno Lima Rocha

 

opinião

 

[Estratégia & Análise] O centro da política está sendo controlado pela direita neoliberal contra o acórdão político do lulismo, onde a direita oligárquica forma maioria junto da ex-esquerda. Com a defecção de PSB – já apoiando os tucanos em segundo turno – e agora com Marina Silva forçando uma carta-compromisso de Aécio para com medidas alegadamente sociais e ambientais, diminui o espaço do lulismo original e sua descendência recomendada. O PT terá de se esforçar o triplo para garantir esta apertada vitória na urna, se é que esta virá. Já para a política feita na base da pirâmide social, os tempos que se avizinham serão duros, independente de qual coligação vencer.

Quanto menor o espaço político, mais cara é a aliança com os oligarcas de sempre. Tal fato é comprovado com a presença da senadora pelo Tocantins, Kátia Abreu (PSD) representante orgânica do latifúndio e negociadora do agronegócio junto ao governo Dilma. Já Aécio não deixa por menos, escancarando Armínio Fraga como futuro ministro da Fazenda. Quem assistiu o debate deste experiente operador do mercado financeiro internacional com Guido Mantega (5ª, dia 09 de outubro de 2014, na Globo News), ancorado o debate pela impagável Miriam Leitão, já sabe o que está por vir. Em ambas as situações, a corda vai arrebentar do lado debaixo da sociedade brasileira.

Vejamos a seguir alguns pontos mais importantes, para uma crítica por esquerda, neste início de corrida de segundo turno presidencial.

Pragmatismo político e cegueira ideológica na centro-esquerda oficialista

O discurso do voto útil e a desconstrução ideológica dos protestos de maio, junho e julho de 2013 é uma retórica recorrente ao oficialismo que agora, apavorado, não tolera ler ou ver uma crítica por esquerda. A legislatura eleita dia 05 de outubro para o Congresso seria mais conservadora e “evangélica”. Não é, é mais conservador e neopentecostal, sendo boa parte destes pregadores da prosperidade aliados do governo de coalizão oligárquica.

Saímos de junho sem uma nova articulação de forças sociais, onde talvez a única ferramenta permanente seja o Bloco de Luta pelo Transporte Público de Porto Alegre. É difícil assistir um tiroteio eleitoral sem um bom parapeito de base protegendo as balas perdidas.

O que mais me preocupa é a capacidade de reação do povo brasileiro caso a outra direita ganhe e resolva – porque certo que irá fazê-lo – tocar nas políticas sociais, ou realinhá-las ou tirar seu poder de realização. Como o povo vai reagir? Nas eleições de 1989 o debate da resistência ao emparedamento do andar de cima se fez presente quando Mário Amato, ex-presidente da FIESP, previu que caso Lula ganhasse na ocasião, cerca de 800 mil empresários deixariam o país. A caravana Amato não saiu porque Collor (hoje aliado do lulismo) ganhou na urna e na manipulação midiática.

E, caso Luiz Inácio tivesse vencido, a promessa de base social mobilizada estava nos “mais de 5 milhões de trabalhadores sindicalizados na CUT”. Hoje, falar disso é uma perigosa piada de mau gosto. Hoje Aécio é carregado nos braços dos asseclas de Paulinho da Força que quando ainda estava no PDT ganhou para seu grupo político o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Depois o país que sai de junho está à direita ou os governos do PT puseram o Brasil mais à direita?

Eleições de 2014 e a segunda Carta ao Povo Brasileiro

O 2º turno entre Aécio Neves (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) traz nova configuração de alianças, com dois movimentos simultâneos. O primeiro é o menor espaço para a coalizão governista, representada pelo lulismo convivendo com maioria assegurada nas convenções nacionais de partidos de tipo tradicional-oligárquico (como PP, PMDB, PSD, PDT). O segundo movimento é a fratura do aliado histórico do PT, o PSB, perfilando-se com Aécio nesta reta final.

Junto à direção desta legenda está Marina Silva, ex-petista histórica, condicionando seu apoio ao compromisso dos tucanos com demandas sociais e ambientais. PSDB, DEM e sua base política conservadora fariam uma inflexão social assim como Lula aproximou-se dos mercados em 2002. Isto consolidaria, segundo Marina, a transformação de políticas de governo em políticas de Estado. É aguardar para ver. E, desde já este analista antecipa que duvida tanto da realização destas políticas como das intenções do ex-governador de Minas em cumpri-las.

O comportamento do partido de governo à frente da coalizão oligárquica pouco se difere da coalizão neoliberal.

A corrupção envolvida nos governos do PT pode ter um viés de justificativa (injustificável), onde os operadores políticos viam nesta oportunidade uma forma de extrair recursos financeiros e materiais para “boas causas”, como financiar o partido ou campanhas deles e de aliados. Nas suas práticas, compararam-se com os oligarcas que sempre são governo (como PMDB, PP e agora o PSD que deve emplacar a ministra da Agricultura do 2o governo Dilma, caso esta vença) e com a elite neoliberal que, deslumbrada com as maravilhas do consumo suntuoso, tem padrão de vida equivalente aos milionários do eixo Wall Street – City londrina.

Quando um partido que fora de esquerda se equipara aos adversários políticos que sempre foram sua baliza oposta – ou seja, ser do PT nos anos ’80 era ser diferente dos aliados do PT de 2014 – entendemos que houve no mínimo dois fenômenos. Um, que este analista já repetiu milhares de vezes, é o leninismo lavado. O pragmatismo da real politik somado com a derrota ideológica e a lógica de “menos pior” leva a situações como estas. Se a nomenklatura tinha dachas no Mar Negro, a direção petista torna-se vizinha de campo dos outrora inimigos de classe. José Dirceu e Palocci materializam estas deformações de ex-esquerda.

Outro fenômeno é compreender que o Estado brasileiro tem uma natureza patrimonialista e como tal é imutável. Assim, lendo Raymundo Faoro e não tomando como elemento de crítica e sim naturalizando as relações sociais, o PT do lulismo à frente do aparelho de Estado lembra a caracterização do ex-aliado Roberto Jefferson: “o PT dá a cabeça, mas quer o corpo!”. Ao invés de democratizar as relações de trabalho dentro do aparelho de Estado, o lulismo reforçou-se com o pior do Brasil, igualando-se no jogo de trocas de cargos e salários e batizando contratos com os grandes agentes econômicos.

O pior do Brasil encontra-se tanto na base “aliada” de Dilma no 2o turno como no eixo de apoio do tucanato nesta reta final. Para nossa desgraça, a candidata à reeleição é uma ex-guerrilheira assim como o senador paulista que corre como vice do neto de Tancredo Neves. Diante deste horror de vazio com guinada à direita da política, a pergunta que fica é; como aglutinar forças e reagir?!

Bruno Lima Rocha é formado em jornalismo pela UFRJ, mestre e doutor em ciência política pela UFRGS. Concentra seu trabalho nas áreas de movimentos populares, organizações políticas, análise estratégica, estudos dos órgãos de inteligência e economia política da comunicação.

** Nota da Redação ** Para acessar a primeira parte deste artigo clique aqui

Artigo enviado pelo Autor e originalmente publicado no blogue Estratégia & Análise.

Publicado no Portal EcoDebate, 17/10/2014


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2 thoughts on “O avanço do voto conservador e a difícil capacidade de reação do movimento popular brasileiro (2), por Bruno Lima Rocha

  • Muito conveniente esse artigo. Não tenha dúvida que o congresso eleito guinou para a direita e os setores populares ficaram subrepresentados. Esse é o resultado de um modelo político onde o financiamento das campanhas é realizado com uma montanha de $$$ oriundo dos setores abastados da sociedade, grandes empresas, bancos, ruralistas, etc. Será um mandato muito duro, especialmente para ambientalistas.
    Solução: reforma política com eleições somente com financiamento público.

  • Em boa hora Aécio Neves para por fim ao lulopetismo miserável que prometeu e não cumpriu, que deixa uma marca insólita de corrupção e degradação.

    O PT não tem mais nenhuma credibilidade. Mesmo muitos dos seus antigos simpatizantes hoje debandaram para outros lados, pois o anseio de mudança confronta as promessas fracassadas e os erros insuportáveis.

    Tomara mesmo que no próximo domingo viremos essa página. Além do que, toda democracia para ser sadia precisa de alternância do poder. Portando adeus PT. Já deu.

Fechado para comentários.