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Reduzir o consumo de energia. Mais do que utopia, uma necessidade e possibilidade

 

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Foto de Marcello Casal JR/ABr

 

Há uma “cultura” em que é mais fácil e vantajoso construir uma nova hidrelétrica do que aprimorar a eficiência daquelas já existentes. Reduzir o consumo de energia é uma palavra de ordem que causa pânico nas distribuidoras de energia. Para o mercado, falar em economia de energia é um tabu em que não se pode tocar. “Nem o governo, nem as autoridades do setor energético, nem os responsáveis pela administração do setor elétrico brasileiro, nem os distribuidores falam uma só palavra sobre economia de energia, racionalização do gasto de energia, eficiência, manutenção, modernização.

Só a obra nova parece interessar e ser capaz de gerar energia no Brasil”, critica Heitor Scalambrini Costa http://www.ecodebate.com.br/?s=Heitor+Scalambrini+Costa , professor da Universidade Federal do Pernambuco (UFPE), em entrevista especial por e-mail, à IHU On-Line.

Entretanto, o tempo presente, de crise ecológica, de que a crise energética é um componente entre outros, requer de nós a capacidade de colocar sobre a mesa temas não muito populares. Embora tenhamos muito claro onde queremos chegar, no caso o “decrescimento”, proposta de sociedade que não deixa de ser revolucionária, como constata o economista francês Serge Latouche, o programa para chegar a ela é necessariamente reformista.

Nesta perspectiva, “alternativas como a repotenciação (modernização) das hidrelétricas já existentes, melhorar a eficiência e conservação de energia, utilizar o aquecimento de água com energia solar para substituição dos chuveiros elétricos, dentre outras medidas, seriam suficientes para ofertar a energia elétrica necessária ao País, sem a necessidade de realizar estas grandes obras”, acredita Heitor Scalambrini Costa. Estas grandes obras “desnecessárias” a que Costa se refere são as usinas hidrelétricas no Rio Madeira e no Xingu, obras contempladas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

“Com a eficiência energética, o crescimento da oferta se dá em um ritmo mais lento. Se é possível reduzir a quantidade de energia que alimenta o desperdício e o parque gerador continua o mesmo, obviamente o restante pode ser disponibilizado para uma nova demanda”, de acordo com Ricardo David, da Associação Brasileira das Empresas de Serviços de Conservação de Energia (Abesco), o processo de eficiência deve reduzir a necessidade de novas fontes e não substituí-las.

Um caminho possível, portanto, diz respeito à busca de formas de aumentar a eficiência e a conservação de energia, e de encontrar, na diversidade das fontes renováveis, as múltiplas saídas para os problemas energéticos do país.

Nesta direção, ganha força a implantação de redes elétricas inteligentes, que já são uma realidade de sucesso em vários países. O que são as redes elétricas inteligentes? Segundo Ricardo Baitelo, coordenador da Campanha de Energias Renováveis do Greenpeace, “Redes inteligentes enviam a eletricidade dos pontos de geração até os consumidores, utilizando um sistema de monitoramento completo do fluxo de energia, a partir de tecnologia digital, que permite o rastreamento tanto da energia que entra no sistema, gerada em diferentes pontos, quanto da energia consumida por residências, edifícios e indústrias”.

“As redes inteligentes permitirão – prossegue Baitelo – o controle não apenas da geração descentralizada, realizada em milhares de pontos, como também o controle do consumo de aparelhos e eletrodomésticos em residências e edifícios. A proposta de pulverizar o sistema elétrico em uma rede de microgeradores e a revolução provocada por isto guardam semelhanças com a grande pulverização de informação provocada pela Internet”.

“Com redes inteligentes, nós basicamente combinamos internet com eletricidade”, comenta, por sua vez, o especialista em energia do escritório internacional do Greenpeace, Sven Teske. “Reforçar as redes inteligentes é uma grande oportunidade de negócios, especialmente para companhias de tecnologia. Na Europa, o investimento anual necessário ficaria em torno de € 5 bilhões, ou seja, menos de € 5 por ano por casa. Para destravar o investimento necessário em uma estrutura que seja amigável com o clima, precisamos urgentemente de políticas que apoiem a transição para uma oferta de eletricidade 100% renovável”, afirma Teske.

Outro setor em que é possível avançar em termos de eficiência energética é o dos edifícios verdes ou edifícios inteligentes, que já são uma realidade em países como a Alemanha.

É fácil constatar como em muitas casas, escritórios, salas, salões no Brasil há uma enorme quantidade de energia desperdiçada pelo fato de não aproveitarem corretamente a luz natural, o que representa um enorme desafio para a arquitetura.

A eficiência energética passa também pela questão dos transportes. Um automóvel, que carrega uma só pessoa, representa um enorme desperdício de energia quando se leva em conta que um carro pequeno pesa cerca de uma tonelada… e transporta cerca de 75 kg.

Seguindo na linha da sobriedade no consumo de energia, é hoje possível diminuir de 40% a 50% o nosso consumo sem comprometer o nosso conforto. Como? Monitorando os desperdícios e as necessidades supérfluas. Estão na mira: “Os outdoors que consomem em média 7.000 kWh por ano, ou seja, o equivalente ao que consomem seis franceses em um ano”, exaspera-se Thierry Salomon, engenheiro e presidente da Associação Négawatt. Ou ainda, a má gestão da iluminação pública. O fato é que “hoje, a sociedade está em estado de embriaguez energética”, como constata Thierry Salomon. É mais difícil sair deste estado de embriaguez do que aplicar ações e políticas de contenção dos desperdícios em energia.

Mais fácil é acreditar que as leis do mercado dão conta de resolver a escassez energética da melhor forma possível e desejável. “Muitos acreditam e manifestam a crença de que o mercado pode ser o responsável pela implantação da filosofia do desenvolvimento sustentável. Acreditam que com o decorrer do tempo, e com o surgimento de novas tecnologias, os problemas ambientais podem ser sanados e superados, resultando uma melhoria no bem-estar social ou mesmo a diminuição das desigualdades sociais”, denuncia Heitor Scalambrini Costa.

Mas, como o fácil ou o difícil não é critério de decisão, “um modelo sustentável só será possível a partir da mudança dos modos de produção e de consumo da sociedade. É a razão capitalista com base no consumismo, no militarismo, e na da lógica de acumulação do capital que está levando o nosso planeta – e os seres vivos que o habitam – a uma situação catastrófica do ponto de vista do meio ambiente, das condições de sobrevivência da vida humana e da vida em geral”, insiste Costa.

E conclui: “O paradigma do crescimento econômico deve e precisa ser profundamente alterado. (…) Para estar à altura dos acontecimentos, uma boa ideia é começar a deixar de lado um conceito de crescimento econômico que nos foi imposto pelo próprio capitalismo”.

Fundamental é ganhar em eficiência na produção da energia; fundamental é ganhar racionalidade no consumo da energia necessária. Mas fundamental mesmo é precisar usar menos energia. Quem nos prepara para isso?

A análise da Conjuntura da Semana é uma (re)leitura das Notícias do Dia publicadas diariamente no sítio do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, parceiro estratégico do IHU, com sede em Curitiba-PR, e por Cesar Sanson, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, parceiro do IHU na elaboração das Notícias do Dia.

(Ecodebate, 16/11/2012) publicado pela IHU On-line, parceira estratégica do EcoDebate na socialização da informação.

[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

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