EcoDebate

Plataforma de informação, artigos e notícias sobre temas socioambientais

Notícia

‘Se não se falar nas tribos isoladas, elas não são protegidas’, diz indigenista brasileiro

 

O indigenista brasileiro José Carlos Meirelles se transformou em defensor dos povos “não contatados”. Não por acaso, coordenou a expedição que obteve as primeiras imagens dessas tribos isoladas e é um dos poucos especialistas que estabeleceram contato visual com elas. Seu empenho é demonstrar que existem, para preservá-las dos predadores econômicos. Entrevista realizada por Inmaculada de La Fuente, em El País.

Meirelles é engenheiro, mas diversos avatares o levaram ao indigenismo. Depois de dirigir a Fundação Nacional do Índio (Funai), assessora o governo do estado do Acre. Há 20 anos foi viver em uma área próxima de uma comunidade isolada. Nesse local, ele e outros pesquisadores realizam um acompanhamento respeitoso da tribo vizinha, sem aproximar-se nem interferir com ela. “Sabem que os observamos e têm mostras de que nossa missão é pacífica. Se eles quiserem, estamos à sua disposição. Se não, não interviremos”, disse. Essas são as regras.

El País: O senhor defende uma causa apaixonante, mas complexa: tornar visíveis povos que querem permanecer na invisibilidade. Não é paradoxal?

José Carlos Meirelles: Sem dúvida, o melhor para esses povos é que não se fale neles e assim preservar seu tipo de vida. Mas o silêncio os colocava à mercê de qualquer agressão. E, em uma sociedade que crê na imagem, valia a pena trazer à luz sua realidade e fazer pressão, levando em conta a situação na Amazônia.

El País: Discutiram a possibilidade de lhes perguntar se querem que se saiba de sua existência?

Meirelles: Não lhes pediram permissão, mas era necessário provar sua existência. Dou-lhe um exemplo: há três anos, o presidente peruano Alan García afirmava que não havia mais povos isolados, que eram teorias de indigenistas loucos. Fez-se uma exposição e ninguém mais nega. O Brasil, por exemplo, admite sua existência de forma oficial. É um avanço.

El País: Até que ponto estão completamente isolados?

Meirelles: Eles nos conhecem desde 1905, quando chegaram as empresas da borracha. Um contato através do conflito: viram que havia gente que queria algo deles e inclusive que os matavam. Sabem portanto que há outros modos de vida. Mas não precisam se incorporar ao chamado progresso tecnológico. Um celular? Não serve para nada. Medicamentos? Tenho certeza de que são saudáveis.

El País: Sua sobrevivência corre perigo?

Meirelles: Suas terras são cobiçadas pela indústria madeireira, as empresas de petróleo ou de mineração de ouro… para encontrar ouro são utilizados produtos como o mercúrio, que contamina os rios e os peixes. Eles são vulneráveis.

El País: Além das tribos americanas, registraram povos isolados em outros continentes?

Meirelles: Fora da América, há na Índia e Papua Nova Guiné. A Funai cuida de contabilizá-los e protegê-los.

El País: O que têm em comum, à margem das diferenças geográficas e culturais?

Meirelles: Alguns grupos são agricultores e cultivam batata, mandioca, amendoim, banana… outros são caçadores e coletores. São sociedades igualitárias, se esforçam para ser iguais ao outro, não melhores.

El País: Que valor ambiental tem para o planeta sua sobrevivência?

Meirelles: Ao protegê-los, preserva-se uma grande superfície da Amazônia ambiental, exatamente porque eles não podem viver em outro ambiente. Mas além disso sua forma de vida faz parte da diversidade humana. Lembram-nos que é possível viver de outra maneira.
Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

Entrevista de El País, no UOL Notícias.

EcoDebate, 22/09/2011

[ O conteúdo do EcoDebate é “Copyleft”, podendo ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, ao Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário do Portal EcoDebate
Caso queira ser incluído(a) na lista de distribuição de nosso boletim diário, basta clicar no LINK e preencher o formulário de inscrição. O seu e-mail será incluído e você receberá uma mensagem solicitando que confirme a inscrição.

O EcoDebate não pratica SPAM e a exigência de confirmação do e-mail de origem visa evitar que seu e-mail seja incluído indevidamente por terceiros.

Alexa