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Esperando por uma condenação histórica, crônica de Paulo Sanda

[EcoDebate] Um dia numa aula de teologia da missão urbana…

A aula ia bem, o professor desenvolvia o tema sobre os paradigmas da civilização ocidental. Comentou sobre os abusos realizados por grandes reformadores, contudo aplicava a contraposição de idéias (dialética), não que isto seja de alguma forma justificativa, mas o uso do poder e da violência por parte destes, era nada menos do que o resultado da interpretação que eles podiam fazer do mundo com os paradigmas que tinham até então.

Hoje é inaceitável pensar nos horrores que foram realizados em nome de “deus” , as perseguições, cruzadas, inquisições, sim no plural pois elas não foram realizadas apenas pela igreja de Roma como se pensa costumeiramente, os reformadores também perseguiram e queimaram muitas pessoas.

E apesar de terrível, não é tão simples assim condená-los, não podemos olhar a história de forma tão simples. É preciso entender os paradigmas que formavam a cosmovisão daquela época.

Quando um aluno interferiu dizendo que independente de qualquer fator a despeito das informações que dispunham as pessoas da época, o principio moral do valor da vida é único e nunca mudou.

Perdi a paciência, como alguém que se pretende teólogo consegue ter tamanha dificuldade de abstração?

Agora você deve estar pensando; “Este cara está variando! É lógico que o colega dele está certo.” Exatamente neste ponto que eu quero chegar. Mas vamos caminhar mais um pouquinho no tema.

Hoje é impensável pensar em escravidão, ela ainda existe, mas não é aceita pela sociedade. Mas a dois mil anos atrás era corriqueira. Uma pessoa se tornava escrava pelas mais variadas razões. Seu povo perdeu uma guerra, você virava escravo. Não podia pagar uma dívida, virava escravo. Os pais o vendiam, virava escravo. E assim por diante. Era lógico, normal, comum, não havia escândalo algum. Mil anos a frente, as práticas escravagistas mudaram um pouco seu foco. Escravizar pessoas de sua própria “cor” não era certo. Mas negros e índios; sem problema algum. Mais algumas centenas de anos em plena revolução industrial, mão de obra escrava já não era bem vista, mas fazer operários trabalharem de forma desumana, sem nenhum direito trabalhista; operários incluíam homens, mulheres e crianças; tudo bem. A coisa era tão bem aceita, que qualquer manifestação contrária como no protesto organizado pelas operárias de uma tecelagem, seria punida da forma que bem entendessem os donos do poder. Neste caso específico prenderam as mulheres dentro da fábrica e atearam fogo. Qualquer relação com as fogueiras da inquisição deve ser mera coincidência. Mas este caso específico hoje é lembrado e a memória destas pessoas homenageada no dia internacional da mulher.

Da mesma forma a humanidade vem se estruturando de tal forma que não aceita mais tais práticas. Hoje debate-se o preconceito, racial, social, sexual, etc. Na questão sexual, não somente de gênero mas também de opções. Mas nem sempre foi assim.

Isto tudo nos faz pensar que somos donos de uma moral suprema. Que os valores humanos e humanísticos estão plenamente desenvolvidos.

Graças a Deus estamos totalmente enganados!

Se isto fosse verdade então a humanidade estaria fadada ao fracasso.

Um dos milhares de exemplos de situações controversas que hoje vivemos é a seguinte: Você usa energia elétrica? Eu uso e muita, digo muita pois todo mês tenho dificuldade para pagar as contas. Mas deveria dizer muita por outros motivos.

De onde vem esta energia? Com os recentes acontecimentos no Japão a geração nuclear está na berlinda. Ao pensar em termoelétricas, logo associamos a emissão de carbono e ao efeito estufa. Sobram as hidroelétricas! Que maravilha, então o Brasil tem o melhor modelo de geração elétrica, uma vez que apesar de termos usinas nucleares e térmicas, a predominância de nossa matriz é de origem hídrica. Podemos dormir tranqüilos.

Caro amigo, estamos totalmente enganados. As usinas hidroelétricas são tão desumanas quanto as nucleares e térmicas. Geram gás carbônico e metano, por causa do apodrecimento da matéria orgânica no fundo de seus reservatórios. Devastam quilômetros e quilômetros de florestas, tem alto impacto em todo o processo ambiental nas regiões que são instaladas. Deslocam pessoas de suas regiões de origem e degradam suas vidas. Não fosse assim não haveriam movimentos como o das pessoas atingidas por barragens. Levam ao extermínio da cultura e da dignidade de povos indígenas.

Mas que importa? O que vale é que no final das contas podemos tomar nosso banho quentinho em um chuveiro elétrico, nos refrescar no ar condicionado, ler este texto na internet, etc.

Por isto eu espero que em um futuro que, tomara, não seja muito distante nossos descendentes nos olhem e digam: ‘Como eram bárbaras e selvagens as pessoas até o início do século XXI’.

Paulo Sanda é Teólogo, chefe escoteiro, palestrante, idealista, associado da ONG RUAH e tem sido ativo participante das manifestações Belo Monte NÃO, em São Paulo. RUAH – Desenvolvimento Integral do Ser Humano

EcoDebate, 20/04/2011

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3 thoughts on “Esperando por uma condenação histórica, crônica de Paulo Sanda

  • Marcio Araujo de Almeida Braga

    O que são 80 anos perto de 12.000 anos?
    Pouco, mas acredito que dentro de 80 anos, convivendo com frequentes desatres climáticos e com várias áreas urbanas alagadas pelo mar, o aquecimento global será favas contadas.
    Daí, gastar muita energia e comer carne serão vistos como péssimos hábitos.
    Quantos morrerão ainda por conta dos desastres naturais?
    Qaunto tempo ainda diremos que foi “Deus” quem mandou tais desastres?

  • Olá Paulo!
    Leio muitos artigos seus aqui no EcoDebate e os acho muito interessante e importantes.
    Eu queria saber algumas informações sobre como participar em atividades contra Belo Monte aqui em São Paulo e busquei um contato direto do Sr mas não encontrei. Desculpa enviar mensagem por aqui, mas teria alguma forma que eu possa entrar em contato. Pode responder neste email fernando.moura1209{at}gmail.com
    Abraços, obrigado e parabéns pelas palavras sempre inteligentes.

  • Fernando.

    Muito obrigado por acompanhar meus artigos e pelo contato.
    Estarei entrando em contato contigo pelo seu e-mail e inserindo você na lista de discussão sobre Belo Monte em São Paulo.

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