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Estudo revela que metade das emissões de gases de efeito estufa do Brasil vem da pecuária

pecuária na Amazônia

Estudo elaborado por 10 cientistas brasileiros revela que as emissões de gases estufa da pecuária bovina no período entre 2003 e 2008 para os biomas Amazônia e Cerrado variam entre pelo menos 813 milhões de toneladas de CO2-equivalente em 2008 (menor valor) e pelo menos 1,090 Gigatonelada de CO2e em 2003 (maior valor). A emissão total associada à pecuária da Amazônia varia entre 499 e 775 milhões de toneladas de CO2e, e do Cerrado, entre 229 e 231 milhões de toneladas de CO2e. Nas demais regiões brasileiras, as emissões do setor variam entre 84 e 87 milhões de toneladas de CO2e. Em termos gerais, os números representam praticamente a metade das emissões de gases de efeito estufa no Brasil.

Apresentado na tarde desta quinta-feira (10/12) durante workshop no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), em São José dos Campos (SP), o estudo foi realizado sob a coordenação de Carlos Nobre (INPE), Mercedes Bustamante (UnB) e Roberto Smeraldi (Amigos da Terra – Amazônia Brasileira) e com a participação de Alexandre de Siqueira Pinto (UnB), Ana Paula Dutra de Aguiar (INPE), Jean P.H. Ometto (INPE), Karla Longo (INPE), Laerte Guimarães Ferreira (UFG), Luís Gustavo Barioni (EMBRAPA), Peter May (Amigos da Terra – Amazônia Brasileira).

De acordo com o estudo – que será lançado na Conferência do Clima em Copenhague no próximo dia 12 –, a maior contribuição às emissões da pecuária se deve ao desmatamento para formação de novas pastagens na Amazônia, que atinge em média 3/4 do total do desmatamento neste bioma. Já no Cerrado, os pesquisadores detectaram que 56,5% do desmatamento no período resultaram em implantação de novas pastagens. A contribuição da pecuária ao total de emissões brasileiras pode chegar a cerca de 50%, por exemplo em 2005. Por outro lado, em anos de menor desmatamento, as contribuições relativas da pecuária ao total de emissões diminuem proporcionalmente.

Foram analisadas as três fontes principais de emissão: desmatamento para formação de pastagem e queimadas subsequentes da vegetação derrubada; queimadas de pastagem e fermentação entérica do gado. O estudo, porém, não considera emissões de solos de pastagens degradadas, da produção da ração de grãos usada no confinamento, do transporte do gado e da carne, e das unidades industriais dos frigoríficos, o que torna os valores “conservadores”, dizem os cientistas.

Também não foi considerado o desmatamento para formação de pastagens em outros biomas além de Amazônia e Cerrado. Já nos casos das emissões das queimadas de pastagem e da fermentação foram contabilizados dados para todo país.

As conclusões do estudo também apontam para o potencial de redução de emissões de gases estufa oferecido pela pecuária no Brasil. O fato de quase 50% das emissões totais brasileiras de gases de efeito estufa se concentrarem em um único setor constitui a mais importante oportunidade de mitigação brasileira.

“A agropecuária está no centro das mudanças ambientais globais tanto por sua contribuição para as emissões como pelo fato de que uma das formas mais significativas de como a mudança climática global afetará a economia é através de seus efeitos na agricultura” avalia Mercedes Bustamante (UNB), coordenadora da pesquisa.

Para ela, a redução dos impactos ambientais com melhoria da provisão de serviços (positivos) e bens demandará a coordenação de políticas agrícolas e ambientais e o incentivo à geração de conhecimento e ao uso de tecnologias adequadas.

Governo e sociedade

O estudo oferece uma série de recomendações de políticas de mitigação que podem ser implementadas por gestores públicos e privados. A maioria dessas políticas oferece oportunidades para atingir benefícios sociais, econômicos e ambientais complementares e adicionais aos da mitigação da mudança climática. “O Brasil deve caminhar para uma agricultura integrada ao ambiente tropical, científica e tecnológica, que, ao mesmo tempo em que aumenta sua eficiência, diminui seu impacto ambiental, inclusive quanto às emissões”, sugere o climatologista Carlos Nobre (INPE), que também coordenou a pesquisa.

Segundo ele, as opções de mitigação decorrentes do setor são significativas e “não implicam o corte na produção atual” e ainda podem ser compatíveis com um aumento moderado da produção. As fontes da mitigação incluem a redução do desmatamento, a eliminação do fogo no manejo de pastagens, recuperação de pastagens e solos degradados, a regeneração da floresta secundária, a redução da fermentação entérica, integração lavoura-pecuária, entre outros.

O estudo lembra que um grande desafio para as políticas públicas relaciona-se à redução da expectativa de impunidade nas práticas de ocupação de terras da União, bem como nos crimes e nas infrações ambientais: a falta de implementação nas políticas de comando e controle nestas áreas desfavorece investimentos em recuperação de terras degradadas, reflorestamento associado à intensificação e criação de manejo sustentável de pastagens em longo-prazo nas unidades de produção existentes. Há uma relação clara entre essa impunidade, a especulação fundiária desenfreada e a degradação das florestas, especialmente na Amazônia, destaca a pesquisa.

Em nível internacional, torna-se claro que o estabelecimento de uma abordagem ampla, sustentável e de longo prazo do tipo REDD (Plus) – incluindo todas as formas de carbono florestal, desmatamento evitado, conservação dos estoques florestais e regeneração da vegetação nativa e de pastagens – poderia favorecer expressivamente a transição necessária para um setor pecuário de baixo carbono no Brasil (e em outros países). “Seu papel deve ser visto como aquele de um catalisador em relação às boas práticas e programas nacionais, ao invés de uma solução exclusiva e suficiente”, diz o relatório final da pesquisa.

Cadeia produtiva

Conforme o estudo, a criação de capacidade industrial (grandes frigoríficos) deve ser vinculada a zoneamento adequado, com base em critérios territoriais e biofísicos, uma vez que ela foi o principal motor para a expansão descontrolada e sem precedentes da atividade pecuária, na parte central da década atual. Na opinião dos cientistas, esta é uma função crítica do governo, não apenas porque o zoneamento requer intervenção regulatória, mas também porque a maioria dos financiamentos para este segmento vem de bancos de desenvolvimento estatais.

Medidas para aumentar a organização e a transparência dentro da cadeia de comércio facilitariam a adoção de remuneração seletiva, essencial para estimular e premiar os investimentos por parte dos criadores. Além disso, o papel do varejo é fundamental, pois é o segmento onde a maior parte do valor é agregado: a adoção de políticas consistentes de compra e fornecimento pode ter um impacto significativo.

No entanto, o estudo considera que é importante que as políticas de fornecimento sejam baseadas em critérios transparentes e que contemplem devidamente o objetivo de melhorar o balanço de GEE dos produtos, em vez de meros critérios negativos de exclusão, como simples listas negras. Além disso, políticas de fornecimento deveriam ser apoiadas por efetiva rastreabilidade, assim como por sistemas de verificação ou certificação independente por terceiros.

“Com base no estudo, constatamos que o custo das emissões de carbono por unidade de produto supera o próprio custo do produto no atacado”, avalia Roberto Smeraldi, da ONG Amigos da Terra – Amazônia Brasileira, co-autor do estudo. Segundo ele, a sustentabilidade econômica da indústria da carne requer drástica queda em carbono-intensividade, e as recomendações do estudo mostram que isso seria perfeitamente possível.

Confira aqui o sumário do estudo

Informe do Inpe, publicado pelo EcoDebate, 12/12/2009

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