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O transporte público em eterna crise

O transporte público em Curitiba está sofrendo uma grave crise, problema que devido ao perfil histórico da cidade paranaense como metrópole modernizadora adquire uma alta simbologia do nível de abandono que o setor enfrenta em todo o Brasil.

Curitiba foi a primeira cidade brasileira a encontrar soluções criativas para melhorar as condições urbanas, com resultados excelentes no transporte público. Ali foram implantadas idéias como linhas exclusivas para ônibus e terminais onde o passageiro pode seguir para itinerários diferentes sem ter que pagar uma segunda passagem.

Em conjunto com estas facilidades práticas, procurou-se também dar qualidade e beleza a toda aparelhagem do setor, com veículos de qualidade e sempre muito bem cuidados e a construção de terminais e pontos de ônibus de alto nível arquitetônico.

Com suas estações urbanas de vidro de formas arredondadas e outras criações geniais, Curitiba teve a sacada de, junto com as vantagens práticas no transporte de passageiros, manter uma embalagem sofisticada conferindo status social ao ônibus e com isso estimular o cidadão a deixar o carro em casa.

Além do peso local na qualidade de vida, essas realizações feitas na década de 70 trouxeram a todo o país o fortalecimento de conceitos bem inovadores na época, vindo inclusive na contramão do pensamento dominante no país que era o de privilegiar o uso do carro individual.

Pelos dados revelados nestes dias pela prefeitura curitibana, hoje este cenário se encaminha para a falência. De janeiro a setembro o Sistema de Transporte Coletivo de Curitiba teve a queda de mais de 12 milhões de passagens, gerando um déficit de R$ 9,2 milhões. Em número de passageiros, a perda em média é de 1,3 milhão por mês em relação à previsão inicial para este ano.

Há muitas razões para o problema. Autoridades locais alegam até o temor do contágio pela gripe A como causa da fuga de passageiros, o que é buscar uma justificativa exagerada para uma questão que tem como base algo que também não deixa de ser doentio: o estímulo ao carro individual e a total falta de políticas públicas sérias em relação ao transporte público. Este é um setor totalmente abandonado pelos municípios, pelos estados e pelo Governo Federal.

Ao contrário, no plano federal o que existe é o estímulo às montadoras de automóveis — até com a oferta de dinheiro público fácil e direto como foi feito recentemente — e a exaltação da compra do carro individual como fator especial de desenvolvimento econômico e social, um discurso que desmotiva qualquer atenção política ao transporte público.

Esta falta de políticas públicas afeta o bolso e a saúde, já que o setor engloba problemas urbanos variados e sempre de peso negativo nas contas públicas, muitas vezes como causa direta.

Com a precariedade do transporte público prevalece o uso do transporte individual, com o aumento da poluição, dos transtornos de congestionamentos e ocupação dos espaços pelos carros e também no aumento dos terríveis índices de mortos e feridos no trânsito — muitos que depois terão de forma crônica uma vida muito difícil.

Há muito outros danos, o ecológico como um dos mais graves e com impacto direto na saúde humana. Porém, nem o peso imenso dos custos colaterais convence o país sobre necessidade de deixar de centrar no preço individual da passagem uma questão que, no fundo, tem um peso econômico e social bem mais amplo.

Outro problema criado com este descaso foi de colocar o setor nas mãos erradas. Em todo o país o setor do transporte público atende apenas ao interesse de empresários sem nenhum compromisso que não seja o lucro particular. Com eles, a melhoria do meio ambiente urbano e a qualidade de vida do cidadão não é um valor administrativo.

Este bem público de tamanha necessidade muitas vezes é dominado por empresas que seguem métodos de quadrilhas de criminosos. Em vez de trazer benefícios para as nossas cidades, o setor é responsável em grande parte no aumento da corrupção e a ascensão de políticos municipais de péssima qualidade, sempre com a intenção de manter o sistema como um meio de lucro fácil.

Não devemos esquecer que o presidente Lula perdeu um amigo e colega de partido que deveria ser o coordenador de sua primeira campanha vitoriosa em 2002 — o então prefeito de Santo André, Celso Daniel — caso não fosse assassinado em um inexplicado crime que envolve corrupção com empresas de ônibus.

Para minorar o problema financeiro em Curitiba e nas demais cidades brasileiras, o país está à espera que o Congresso Nacional vote um projeto de lei com isenções de impostos federais. Mas o fato é que enquanto a questão do transporte público for vista apenas como um problema de caixa, esta é uma crise que jamais terá fim.

* Colaboração do Movimento Água da Nossa Gente (Os recursos hídricos do planeta tratados como um bem comum) para o EcoDebate, 29/10/2009

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