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Argentina: Bayer planeja retirada do endosulfan do mercado

veneno

A companhia multinacional Bayer dispôs-se a retirar da Argentina, no final do ano, o endosulfan, que já estava proibido em mais de 60 países, incluindo toda a União Europeia. Ele é utilizado de forma massiva nos campos de soja, algodão, girassol, milho e tabaco.

A reportagem é de Darío Aranda e publicada pelo jornal argentino Página/12, 03-08-2009. A tradução é do Cepat.

O endosulfan é um agrotóxico muito questionado há algumas décadas por seus efeitos nocivos na saúde e no meio ambiente. Ele é utilizado de forma massiva na soja, e também no algodão, girassol, milho e tabaco, entre outros cultivos. As empresas do setor sempre defenderam o seu uso, negaram qualquer efeito secundário e, sobretudo, desacreditram as organizações sociais, acusando-as de alarmistas ou menosprezando as suas pesquisas. Surpreendentemente, o maior golpe contra o endosulfan veio do coração dos agronegócios: a multinacional Bayer anunciou que irá retirar o produto do mercado. “Planejamos terminar as vendas de endosulfan para o final de 2010 em todos os países onde ainda se encontram legalmente disponíveis”, explicou o comunicado da Bayer CropScience (área petroquímica da empresa), assinada pela diretora da companhia Judith Nestmann. Também precisou que será substituído por alternativas “com um perfil de risco significativamente menor”.

“A decisão da Bayer se dá após anos de campanhas de denúncias realizadas em todo o mundo contra o inseticida, vinculado a diferentes doenças, como o autismo, a nascimentos com malformações e danos no aparelho reprodutor masculino, assim como a mortes e danos severos a agricultores através do contato direto”, explicou-se na Rede de Ação em Praguicidas da América Latina (Rapal), que também lembrou que o endosulfan já está proibido em mais de 60 países, inclusive na União Europeia.

O agrotóxico é um tipo de inseticida de amplo uso no país. Segundo dados das empresas, em 2008 foram usados 4 milhões de litros, comercializados por cerca de dez empresas, dentre as quais se sobressaem a DuPont Agrosoluciones, a Nidera e a Bayer.

O coordenador de Relações Institucionais da Bayer Argentina, Luciano Viglione, explicou que em 2007 retiraram do mercado o Thioday, agroquímico com endosulfan, mas que ainda comercializam o Decis Dan, outro composto que contém o agrotóxico. “Vamos retirá-lo do mercado antes do final do ano. A ciência avança para formulações mais seguras e nós incorporamos essas mudanças”, justificou Viglione.

Nem a matriz da Bayer nem a filial local reconheceram os prejuízos sanitários e ambientais do agrotóxico, mas destacaram que vão substituí-lo “por outro mais seguro”, mas sem explicar por qual.

Para as organizações sociais, e o mundo científico que o denuncia faz tempo, a medida da empresa é um reconhecimento implícito dos efeitos negativos do inseticida. Também outros fatores foram determinantes. “Por um lado, a pressão dos consumidores na Europa está em alta e, por outro, mais cedo ou mais tarde seria incluído no Convênio de Estocolmo (instrumento internacional que regula o tratamento das substâncias tóxicas, patrocinado pela ONU)”, precisou o coordenador regional da Rapal e engenheiro agrônomo, Javier Souza Casadinho, que investiga o uso de agrotóxicos há mais de uma década.

O endosulfan é identificado como inseticida extremamente tóxico com capacidade de produzir na saúde danos agudos (a curto prazo) e crônicos (doenças que aparecem após anos do contato com o inseticida). “A revisão da literatura científica sobre o impacto do endosulfan revela evidências dos efeitos tóxicos crônicos no sistema nervoso, no sistema imunológico, sua ação disruptiva endócrina e evidências não conclusivas de sua ação mutagênica e genotóxica, assim como a de provocar câncer em animais de laboratório e nas populações humanas expostas. Também está relacionado a efeitos neurológicos de longo prazo, como a epilepsia e o aumento do risco do Mal de Parkinson”, afirma Souza Casadinho.

Quanto aos efeitos agudos, é assinalado como causador de diarreias, enjoos, dor de cabeça, náuseas, chagas, dor de garganta e quadros de asma. Segundo a Rapal, o inseticida se degrada muito lentamente, permanece anos no meio ambiente e se desloca a grandes distâncias arrastado pelas correntes de ar e de água.

Segundo dados da Câmara de Saúde Agropecuária e Fertilizantes (Casafe), em 1999 foram utilizados na Argentina 1,9 milhão de litros de endosulfan. Em 2008, essa quantia foi duplicada: 4,2 milhões de litros. “Esta tendência crescente do uso de endosulfan tem seu correlato com o aumento generalizado de inseticidas derivado do modelo agrícola vigente”, explica Souza Casadinho.

A organização também destacou que “existem alternativas comprovadas cujos usos não apresentam os efeitos colaterais mortais deste inseticida”. Karl Tupper, cientista integrante da Rede de Ação de Praguicidas dos Estados Unidos, explicou que “mesmo com a retirada da Bayer, ainda permanecem no mercado outros fabricantes genéricos que vendem este veneno. Pedimos a estas empresas que priorizem a saúde e o meio ambiente acima dos lucros que obtêm com este tóxico e que restrinjam as suas vendas. É a única coisa responsável a se fazer”.

Alejandro Oliva é médico e coordenador de uma pesquisa que, entre 2004 e 2007, abrangeu seis povoados da Pampa Úmida. Nela confirmou a vinculação direta entre o uso e exposição a contaminantes ambientais com malformações, câncer e problemas reprodutivos. “As descoberta foram contundentes quanto aos efeitos dos pesticidas e solventes”, afirmava Oliva. Havia comprovado a existência de diferentes tipos de câncer muito acima da média nacional. E precisou que a zona de estudo havia sido alvo de cerca de dez agroquímicos, entre eles o endosulfan, os piretróides e o glifosato.

O estudo havia sido realizado por uma equipe do Hospital Italiano de Rosário, coordenado por Oliva, com o respaldo do Centro de Pesquisas em Biodiversidade e Ambiente (Ecosur), da Universidade Nacional de Rosário, da Federação Agrária local e do INTA. A pesquisa havia detalhado que quatro de cada dez homens que fizeram consultas por infertilidade haviam sido expostos a químicos agropecuários, e alertou que o efeito sanitário dos agrotóxicos pode manifestar-se nas gerações futuras.

As organizações camponesas e sociais que denunciam o uso de agrotóxicos apontam outros químicos: carbofuran e o bromuro de metilo (usados na produção hortigranjeiros), a sulfluramida (base de formicidas) e o questionado glifosato, base da monocultura da soja.

(Ecodebate, 08/08/2009) publicado pelo IHU On-line, 07/08/2009 [IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

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2 thoughts on “Argentina: Bayer planeja retirada do endosulfan do mercado

  • Urgentíssimo cuide-se de proibir esses agrotóxicos no brasil

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