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Agrotóxicos absorvidos por elefantes-marinhos da Antártica são transmitidos aos seus filhotes

elefante-marinho (Mirounga leonina)
Foto: Wikispecies

Pesticidas e outros compostos químicos afetam biomas muito distantes dos locais onde foram lançados. Um estudo desenvolvido por pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande (Furg) constatou que elefantes-marinhos que vivem na Antártica são contaminados por compostos químicos usados em países do hemisfério Sul e transmitem essas substâncias tóxicas aos seus filhotes.

Apesar de não serem utilizados no continente antártico, os compostos químicos são levados até lá pelas correntes de ar e, ao entrarem em contato com o ar frio dos pólos, se condensam e precipitam no mar, onde os elefantes-marinhos passam a maior parte de suas vidas. Esses mamíferos, que pertencem ao mesmo grupo das focas e morsas, só se reúnem em terra firme uma vez ao ano, para se reproduzir e trocar de pelo.

O estudo, que faz parte do Programa Antártico Brasileiro, analisou elefantes-marinhos (Mirounga leonina) que vivem na ilha Elefante, localizada na península Antártica, região próxima ao extremo sul da América do Sul. Ao longo de três expedições, realizadas entre 1997 e 2000, a equipe, coordenada pelo oceanólogo Adalto Bianchini, da Furg, observou os hábitos desses mamíferos e coletou amostras de gordura e leite dos animais.

A contaminação dos filhotes começou a ser investigada depois que os pesquisadores, com a colaboração da Universidade de Trent, no Canadá, detectaram a presença de compostos tóxicos em animais adultos e jovens da ilha, com níveis mais expressivos nas fêmeas.

A equipe constatou que os compostos são transmitidos aos filhotes por meio da placenta (durante a fase de desenvolvimento uterino) e, depois do parto, pela amamentação. Nos primeiros dias após o nascimento, os animais chegam a adquirir até 50% da concentração de substâncias químicas tóxicas que absorvem durante toda a vida. Os resultados dessa análise foram publicados na edição de abril do periódico Chemosphere.

Mais vulneráveis
Bianchini ressalta que o perigo da contaminação prematura está na vulnerabilidade dos animais, que ainda estão em fase de desenvolvimento. “No hemisfério norte, onde o problema é mais grave, já foram notificados casos de mamíferos marinhos com problemas neurológicos e malformação fetal”, alerta o pesquisador.

O oceanólogo explica que a contaminação do tecido adiposo dos animais permite uma alta assimilação de compostos químicos tóxicos em um curto período. Isso acontece porque, quando estão no mar, os elefantes-marinhos estocam energia sob a forma de gordura, que é consumida durante os meses em que os animais permanecem em terra e ficam em jejum.

Segundo Bianchini, a exposição continuada a produtos químicos tóxicos pode provocar diminuição da capacidade reprodutiva e deficiência imunológica nos elefantes-marinhos, o que levaria à diminuição de sua população. Por enquanto, os animais da ilha Elefante não exibem sinais evidentes de intoxicação, mas já apresentam alterações hormonais. “Esse é um fator que pode gerar estresse nos animais, mas ainda não é suficiente para ocasionar desordens reprodutivas”, avalia.

Emissões antigas e recentes
Análises das massas de ar e correntes marinhas apontam que a contaminação dos elefantes-marinhos da Antártica deve-se a compostos químicos lançados em países do hemisfério Sul. Para os pesquisadores, a situação atual decorre do uso intenso desses produtos entre as décadas de 1960 e 1970. No entanto, eles não eliminam a hipótese de emissões mais recentes.

“Muitos dos componentes encontrados são derivados de pesticidas organoclorados, compostos de uso doméstico e agrícola que já foram banidos em diversos países, inclusive no Brasil, mas que ainda hoje são admitidos em campanhas de saúde pública em caso de emergência sanitária”, diz Bianchini. Também foram detectados compostos usados em tintas industriais e em transformadores elétricos.

A equipe pretende voltar à ilha Elefante para acompanhar o desenvolvimento dos animais analisados e avaliar o nível de contaminação atual. Para os pesquisadores, o estudo do ambiente antártico vai além do interesse científico. “Esperamos ajudar na tomada de consciência em relação ao uso adequado desses compostos químicos tóxicos”, diz Bianchini. E alerta: “Se eles estão aparecendo lá, significa que já se espalharam por todo o planeta.”

Matéria de Barbara Marcolini, do Ciência Hoje On-line, 14/04/2009.

[EcoDebate, 16/04/2009]

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