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Estudo diz que pecuária, e não a soja, desmata a Amazônia

[Valor Online] SÃO PAULO – É a pecuária, e não a soja, a maior responsável pelo desmatamento na Amazônia. É isso o que diz um estudo divulgado pelo Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon-DF) e que vai ser utilizado como base pelo Ministério da Integração Nacional para definir o planejamento territorial na região.

” A gente fica batendo na tecla errada, esquece o efetivo responsável e acaba adotando políticas públicas erradas ” , afirma Julio Miragaya, autor do estudo e coordenador-geral de Planejamento e Gestão Territorial (CGPT), ligado ao Ministério da Integração Nacional. ” O fantasma da Amazônia não é a soja, é a pecuária ” .

O economista, que escreve sua tese de doutorado sobre o papel da pecuária na ocupação da Amazônia, revela que um projeto de lei será encaminhado até outubro para o Congresso Nacional. A intenção é criar áreas de zoneamento determinando onde será permitido a criação de gado. ” Terá de ser uma política de Estado e não de governo, senão não dará certo ” , diz ele.

Com base nos dados da produção de pecuária municipal do IBGE, o documento afirma que 34,667 milhões de hectares da Amazônia foram ocupados com pecuária entre 1990 e 2005. Outros 5,405 milhões foram ocupados com soja, seguida por milho (930 mil hectares), arroz (508 mil) e algodão (432 mil).

Nesse período, o Brasil registrou um aumento expressivo de 40,8% de gado bovino no seu rebanho. Das 60,05 milhões de cabeças, nada menos que 80,5% se deram nos nove Estados que compõem a Amazônia Legal.

Miragaya salienta que o avanço do plantio de soja em áreas que antes eram ocupadas pela pecuária, sobretudo no Centro-Oeste, forçou o avanço do gado para as áreas amazônicas. Esse efeito indireto, segundo ele, teria sido equivalente a 4,62 milhões de hectares (ou 15% das áreas utilizadas para o agronegócio).

A conjuntura internacional foi determinante para esse movimento. Grandes exportadores de carne bovina estão encurralados, diz o economista, cuja tese de doutorado é sobre o papel da pecuária na ocupação da Amazônia. Ele cita como exemplos Austrália, Argentina e EUA. O denominador comum é a limitação de terras disponíveis para o avanço do gado, no momento em que soja e milho ganham importância nos mercados internacionais.

” Ao contrário dos nossos concorrentes, o Brasil tem terras demais. E para onde o gado está indo? Para a Amazônia, enquanto nas demais regiões do país os rebanhos estão em declínio ” , diz.

É o que se conhece como movimento de ” subida do boi ” . Expulsos por culturas mais rentáveis do sul, sudeste e centro-oeste do país, os rebanhos bovinos encontraram na região amazônica condições ideais para crescer: terras baratas (em muitos casos griladas), solos e clima impróprios para lavouras em algumas localidades. A falta de infra-estrutura, indispensável para as grandes plantações de grãos, é outro fator que explica esse movimento.

Rondônia e Acre registraram em 15 anos o crescimento mais acelerado na criação de boi na Amazônia Legal – 560% e 478%, respectivamente. Mato Grosso e Pará incrementaram suas criações em 200%, cada um. Amazonas, Tocantins e Maranhão foram os únicos que registraram expansão de pecuária abaixo dos 100%, no período de 1990 e 2005.

” Quase todo esse crescimento foi puxado pelas exportações ” , diz Paulo Barreto, especialista em cenários de ocupação do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). Segundo ele, no início dos anos 90 eram exportados apenas 5% de toda a produção nacional de carne bovina. Em 2006, os embarques representavam 25%.

O estudo mostra que o impacto da soja ainda é bastante limitado em relação ao desmatamento provocado por outros setores do agronegócio. ” Não é a pecuária a responsável pela invasão na região amazônica. Falta na região um melhor controle do direito de propriedade. Muitas das propriedades não têm título e é isso que gera a disputa pela terra e fomenta a invasão de áreas ” , afirma Cesário Ramalho, presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB).

Para ele, no entanto, não há necessidade de se criar um zoneamento por culturas da região amazônica. ” O próprio mercado decide se vale a pena plantar ou não ” , diz, citando como referência a moratória da soja assinada pelas indústrias esmagadoras, que se comprometeram a não comprar grão produzido em áreas desmatadas do bioma amazônico.

(Cibelle Bouças e Bettina Barros | Valor Econômico)

(www.ecodebate.com.br) matéria do Valor Online, publicada pelo UOL Notícias – 04/09/2007 – 09h30