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Artigo

Sustentabilidade, Certificação e Rotulagem Ambiental, por Márcia Pimenta

[EcoDebate] Recentemente o SEBRAE em parceria com o PNUMA (Comitê Brasileiro da Nações Unidas para o Meio Ambiente) lançou uma publicação dirigida às Pequenas e Médias Empresas (PME´s) brasileiras com o objetivo de alertá-las para a necessidade de melhorias no desempenho ambiental de suas atividades produtivas.

Haroldo Mattos de Lemos e Ricardo Luiz Peixoto de Barros, autores do livro, enfatizam a necessidade de uma produção mais limpa alinhada com o modelo das principais regiões econômicas como União Européia, Nafta e APEC (Asian Pacific Economic Countries) cada vez mais reguladas e exigentes no que diz respeito às certificações ambientais.

Normas Ambientais Internacionais como as da família ISO 14000 propõem uma nova forma de comunicação com o mercado consumidor. Através da rotulagem ambiental o consumidor pode diferenciar os produtos similares e assim optar por aqueles que impactam menos o meio ambiente. Os rótulos tipo III, definidos na recente norma ISO 14025 trazem informações ambientais de produtos baseados na Avaliação do Ciclo de Vida (ACV). O selo sugere um novo olhar do consumidor em relação ao produto. Agora ele poderá levar em consideração o histórico produtivo, desde a aquisição da matéria-prima para a confecção do produto até a disposição final, em forma de resíduos. Além disso, a ACV leva em consideração impactos referentes ao uso e o pós uso do produto (exemplo dos eletrodomésticos que vêm com selo de baixo consumo de energia), e enfatiza a redução e a reciclabilidade. Tudo isto deverá estar previsto na idealização do produto.

O livro também ajuda a compreender os avanços do setor produtivo no que diz respeito às questões ambientais. Vai longe o tempo em que as indústrias achavam que atender às necessidades ambientais era um impedimento à competitividade. Com a entrada em cena do conceito de Desenvolvimento Sustentável no início dos anos 90, a antiga abordagem do crescimento econômico a qualquer preço foi substituída por concepções baseadas na Ecoeficiencia , comprometida com as melhorias no processo de produção, com a garantia dos recursos naturais e a redução de resíduos. Na fase seguinte investiu-se em melhorar o desenvolvimento de produtos. Surge, assim, o Selo Verde e uma nova forma de projetar produtos sob a ótica do ecodesign. A atitude menos reativa por parte do setor produtivo gerou atitudes pró-ativas, com desempenhos acima das exigências ambientais, gerando economia de recursos naturais e energia e consequentemente, lucros!

Essa é a realidade de algumas grandes empresas brasileiras que agem reguladas pelo mercado internacional, cada vez mais seletivo no que diz respeito a parcerias comerciais e fornecedores. Durante a Rio+10 em Johanesburgo, ao analisar 22 relatórios setoriais, o PNUMA detectou que apesar do empenho das indústrias o estado do meio ambiente continuava se deteriorando, pois nem todas perseguiam o desenvolvimento sustentável, principalmente as PME´s. Estas ainda não haviam se rendido à constatação de que Produção Mais Limpa associada ao ecodesign poderia ser a receita perfeita para lucros maiores e melhor desempenho. O número de PME´s no Brasil dão uma pista do porque suas atividades, quando não observadas as questões ambientais em seu processo produtivo, podem ser tão impactantes ao meio ambiente. Segundo o IBGE existem no Brasil 10,7 milhões de PME´s e muitos especialistas são unânimes em afirmar que elas contribuem com grande parte da poluição.

O mercado europeu está na vanguarda das preocupações referentes ao meio ambiente, vide seu envolvimento no que se refere ao aquecimento global, fazendo pressão sobre os fabricantes. O Sistema Comunitário de Eco-Gestão e Auditoria – EMAS (Eco Management and Audit Scheme) é um instrumento voluntário dirigido às empresas que pretendam avaliar e melhorar os seus comportamentos ambientais e informar o público e outras partes interessadas a respeito do seu desempenho e intenções na área ambiental, não se limitando ao cumprimento da legislação nacional e comunitária existente. As PME´s brasileiras que aspiram o mercado globalizado, ou participem de arranjos produtivos com grandes empresas, podem ver-se frente ao desafio de ter que apresentar declarações ambientais certificadas para comercializar seus produtos e serviços entre si e no mercado internacional, notadamente na Europa. O assunto é árido nas PMES´s. Por isso os empresários criticam a exigência das certificações alegando restrições ao comércio, pois para se adaptarem será necessário crédito para financiamento de novas tecnologias. Entretanto, não aderir pode significar o isolamento comercial e redução nas exportaçãoes brasileiras!

Trabalhar na confecção de um banco de dados referente ao ACV é tarefa urgente. A Ásia, nosso maior competidor, vem trabalhando nesse sentido e no Brasil é uma das ações prioritárias do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict). O Instituto, vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, considera o projeto de implantação de um modelo brasileiro vital para o desenvolvimento nacional.

A atual regulação voluntária do mercado no que tange as questões ambientais significa um avanço, sem dúvida. Mas impossível não traçar um paralelo de como se incentiva o consumo hoje e como era há anos atrás.

O consumo hoje mais do que satisfazer necessidades é um símbolo de status e poder. O consumo é a base do capitalismo e o objetivo do sistema é produzir mercadorias que circulem, sempre, mais depressa para que ele próprio possa acelerar a velocidade de sua rotação. Além disso, é urgente que se conscientize a sociedade sobre a irracionalidade da descartabilidade, bem como o modo de produção (e de consumo) que a engendra. É esse consumo que hoje já faz com que se extraiam recursos naturais numa velocidade 25% maior do que a capacidade da natureza em se regenerar, segundo dados do WWF em seu recente relatório “Planeta Vivo 2006”.

Para Ricardo Barros, um dos autores da publicação, o fato de existirem normas obrigando os fabricantes a recolherem seus produtos do mercado após o uso, como é o caso de pilhas, baterias e pneus, fará com que o setor produtivo reflita sobre os custos do recolhimento e pondere sobre a forma como os produtos são descartados hoje.

Será que o desenvolvimento atingido pela humanidade nos trouxe até aqui apenas para descobrirmos que como vivíamos antigamente era mais saudável e mais respeitoso com o meio ambiente. Evoluímos para retroceder? Evoluímos?

Márcia Pimenta, jornalista com especialização em Gestão Ambiental

in www.EcoDebate.com.br – 28/11/2006