EcoDebate

Plataforma de informação, artigos e notícias sobre temas socioambientais

Notícia

Estudo mostra que hidrelétricas causam aquecimento climático

(Ciência em Dia) – Contrariando a crença popular, a energia hidroelétrica causa
danos graves ao clima do mundo. Mudanças propostas na maneira como são
calculados as contribuições dos países ao “efeito estufa” da emissão de gases estão
calculando também as barragens hidrelétricas, embora alguns especialistas se
preocupem com as dificuldades desse detalhamento.

A imagem verde da energia das hidrelétricas, usada por países como o Brasil, de
que elas representam uma alternativa benigna aos combustíveis fósseis como o
petróleo, é falsa. Quem afirma isso é Éric Duchemin, um consultor do Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) que reúne os maiores
estudiosos do tema. “Todos acham que a hidroeletricidade é muito limpa, mas esse
não é o caso”.

As barragens hidroelétricas nos rios produzem doses significativas de dióxido de
carbono e metano, e em alguns casos produzem mais gases que agravam o efeito
estufa do que as termoelétricas que usam combustíveis fósseis. As emissões de
carbono variam de barragem para barragem, diz Philip Fearside, pesquisador do
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) em Manaus. “Mas nós sabemos
que são em quantidade suficiente para preocupar”.

Em um estudo que será publicado em “Estratégias de Mitigação e Adaptação para a
Mudança Global”, Fearside estima que em 1990 o efeito estufa de emissões na
barragem de Curuá-Uma, no Pará, era maior que três e meia vezes do que seria
sendo produzido em geração da mesma eletricidade por óleo diesel.

Esse fato acontece porque grandes quantidades de carbono são destruídas nas
árvores retiradas das áreas das represas, enquanto outras plantas são consumidas
com o alagamento das barragens. Depois da primeira fase de perda da absorção de
gases pelas árvores, uma boa quantidade de plantas passa a ser decomposta nos
reservatórios sem oxigênio, resultando na formação de metano dissolvido. Esse
material segue para a tmosfera quando a água passa através das turbinas.

Mudanças sazonais na profundidade da água significam que existe um suprimento
contínuo de material em decomposição. Na estação seca as plantas colonizam os
bancos dos reservatórios somente para serem engolfadas quando o nível da água
subir. No caso de muitas das grandes barragens esse efeito sobe-e-abaixa pode
acontecer por centenas de quilômetros quadrados.

Em outras palavras, os reservatórios convertem dióxido de carbono da atmosfera
capturado pelas plantas em metano. No debate climático isso é bastante
importante, porque o efeito do metano no aquecimento global é 21 vezes maiores
do que o dióxido de carbono.

Outras pesquisas já sugeriram desde 2000 que os projetos hídricos são uma rede
produtora de gases estufa. Mas este novo trabalho mostra que é prioritário colocar
na agenda política esse tema. Na próxima rodada de discussões do IPCC, em 2006,
será proposto o Programa de Inventários Nacionais de Gases Estufa, onde será
calculada a emissão de carbono de cada país incluindo as emissões de áreas
artificialmente alagadas.

Mesmo essas linhas de pesquisa estão analisando apenas os primeiros dez anos de
operação de barragens, incluindo apenas as emissões de superfície dos
reservatórios. A produção de metano será vista ainda de forma secundária porque
os cientistas climáticos ainda não chegaram a um acordo sobre o grau de
significância desses dados – e também sobre como lidar com a variação entre
barragens.
Para Fearnside, encontrar essas respostas será a maneira de incluir essas emissões
no debate.

Com as linhas propostas pelo IPCC, os países tropicais como o Brasil que investem
pesadamente em energia hidroelétrica verão seus inventários nacionais de
emissões de gases estufa aumentarem em torno de 7%. Os países temperados e
frios serão pouco afetados porque seu clima é pouco favorável à produção desses
gases.

Depois de uma década de pesquisas documentando as emissões de carbono nos
reservatórios artificiais criados pelos seres humanos, a energia hidrelétrica está
prestes a perder sua reputação baseada em seu caráter renovável para
transformarem-se em atores do aquecimento global. “Eu creio que é importante
que essas emissões sejam contidas”, afirma o pesquisador.

Nota GTA: As pesquisas realizadas no INPA mostram ainda mais do que o papel
criminoso das grandes barragens hidrelétricas sobre o clima. Seus efeitos
ecológicos e sociais vêm sendo mostrados há muito tempo por pesquisadores, por
pescadores artesanais e por atingidos por barragens. Mas é importante notar como
nos países frios esse efeito é muito menor – e isso está ligado também com a
biodiversidade, que é mais ampla e mais impactada em países tropicais como o
Brasil. O assunto é ainda mais importante para a Amazônia, onde todos os grandes
rios estão sendo alvo de muitos planos de novas barragens hidrelétricas. Ainda não
se sabe se as autoridades, os empresários e os técnicos de governos que
raramente valorizam o conhecimento e os avisos das comunidades tradicionais e
indígenas vão prestar atenção agora que os efeitos estão sendo apresentados por
um dos maiores estudiosos do clima no país (José Arnaldo de Oliveira).

Leia o original em:
www.newscientist.com/channel/earth/dn7046

Link padrão
www.cienciaemdia.zip.net

(EcoDebate) Fonte – GTA – Grupo de Trabalho Amazônico